Acórdão do Tribunal
Central Administrativo Norte
Processo: 02496/11.6BEPRT
Secção: 1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão: 13-01-2012
Tribunal: TAF do Porto
Relator: Maria do Céu Dias Rosa das Neves
Descritores: PROVIDÊNCIA CAUTELAR,MANIFESTA PROCEDÊNCIA
PERICULUM IN MORA
Sumário: I – A evidência das ilegalidades apontadas a um
acto, com vista ao preenchimento do “fumus boni iuris previsto na al. a), do nº
1 do artº 120º do CPTA deve resultar flagrante e palmar, sem necessidade de
indagações profundas, designadamente, de prova testemunhal.
II – Não existe periculum in mora quando a requerente já se
encontra há mais de 5 anos afastada do serviço, em situação baixa médica e de
licença sem vencimento.*
Sumário elaborado pelo Relator
Data de Entrada: 28-11-2011
Recorrente: L...
Recorrido 1: Hospital de São João, E.P.E.
Votação: Unanimidade
Meio Processual: Procedimento Cautelar Suspensão Eficácia
(CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão: Nega provimento
Parecer Ministério Publico: Não se pronunciou
Decisão Texto Integral: Acordam, em conferência, na Secção de
Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:
1 – RELATÓRIO:
L…, médica, residente na Rua S. …, Porto, interpôs recurso
jurisdicional da sentença proferida no TAF do Porto em 23/09/2011, que
indeferiu a providência cautelar de suspensão de eficácia da deliberação do
Conselho de Administração do Hospital de São João, E.P.E. que lhe aplicou a
pena disciplinar de demissão.
*
Depois dos mais de trezentos artigos de alegações, formula a
recorrente as seguintes CONCLUSÕES que aqui se reproduzem:
A. «O presente recurso jurisdicional vem interposto da
decisão proferida pela 2ª Unidade Orgânica do Tribunal Administrativo e Fiscal
do Porto, no âmbito do processo cautelar designado por Proc. nº 2496/11.6BEPRT,
datada de 23.09.2011, pela qual se decidiu indeferir a providência cautelar de
suspensão de eficácia da Deliberação do Conselho de Administração do Hospital
de S. João, E.P.E., datada de 20.06.2011, notificado à Recorrente por
intermédio de Ofício sob o número mecanográfico 11124, datado de 29.06.2011,
deliberação essa que aprovou a proposta de demissão formulada pelo instrutor do
processo disciplinar, determinando a aplicação da “(…) pena de demissão à
arguida Drª L… (…)”
B. Com efeito, a sentença proferida pelo Tribunal a quo
encontra-se inquinada com múltiplos vícios de decisão (erros de julgamento),
cuja apreciação se impõe na presente sede. No essencial, vislumbram-se cinco
vícios que importa conhecer pela seguinte ordem: i) Do erro de julgamento
decorrente da errónea selecção da matéria de facto; ii) Da nulidade da sentença
decorrente da proibição de prova testemunhal quanto ao requisito de “fumus boni
iuris”; iii) Do vício de violação de lei decorrente da pretensa falta de
verificação do requisito do fumus boni iuris (alínea a), do nº 1, do artigo
120º do CPTA); iv) Do vício de violação de lei decorrente da pretensa falta de
verificação do requisito do periculum in mora (alínea b), do nº 1, do artigo
120º do CPTA); v) Da omissão de análise do requisito referente à ponderação de
interesses, atento o respectivo carácter subsidiário quanto à alínea b) do nº 1
do artigo 120º do CPTA (nº 2, do artigo 120º do CPTA).
C. Seguindo a ordem de arguição de vício supra exposta,
importa começar por referir que enferma a sentença proferida pelo Tribunal a
quo de i) erro de julgamento decorrente de errónea decisão quanto à matéria de
facto considerada assente. Laborou a instância recorrida, em clamoroso erro de
julgamento, quando em claro prejuízo do alegado pela Recorrente, sempre
orientada por uma concepção distorcida, quer das regras de distribuição do ónus
da prova, quer dos pressupostos jurídicos de que depende a demonstração dos
factos que consubstanciam a prova necessária aos requisitos de que depende o
decretamento da providência cautelar, acabou por eivar a sentença proferida de
um ostensivo e manifesto erro de julgamento, aquando da selecção da matéria de
facto assente e aferição da respectiva relevância para a decisão da causa.
D. Pelo que, ao não ter inscrito tal factualidade na matéria
assente, o Tribunal a quo errou na apreciação da matéria de facto, devendo o
presente tribunal proceder à correcção do referido desacerto - ao abrigo do
disposto no artigo 712º nº 1, alínea b) do CPC, aplicável ex vi do disposto no
artigo 1º e 140º do CPTA, já que a factualidade referida nos artigos 6.º, 11.º,
13.º, 14.º, 18.º, 21.º, 26.º, 27.º, 29.º, 31.º, 32.º, 33.º, 59.º, 152.º, 153.º,
154.º, 155.º, 248.º, 254.º, constantes do Requerimento Inicial, supra
transcrita, se afigura dotada de manifesta relevância para a boa decisão da
causa e prova dos requisitos subjacentes ao decretamento da presente
providência cautelar.
E. Prosseguindo a ordem de arguição de vícios seguida
refira-se que ii) o Tribunal a quo laborou em erro de julgamento quando
entendeu que a demonstração quanto à verificação do requisito do fumus boni
iuris não poderia ser conseguida através de prova testemunhal.
F. Não se tendo o Tribunal declarado esclarecido e
dispensando ulterior prova, encontra-se este a vedar a prova quanto à
verificação do próprio critério de fumus boni iuris, o que naturalmente redunda
na proibição de prova quanto aos factos que demonstram a probabilidade da
existência do vício.
G. Semelhante proibição de prova consubstancia-se assim numa
nulidade processual decorrente da negação de faculdades concedidas na lei
(omissão de actos) nos termos dos arts. 201.º, n.º 1, 203.º, n.º 1, 205.º, n.º
1 e 208.º, todos do CPC, aplicados ex vi do art. 1.º CPTA, que determina
concomitantemente a nulidade da sentença proferida.
H. Por todo o exposto, padece a sentença recorrida de
nulidade, a qual desde já se requer a V. Exª. seja decretada, com base nos
fundamentos que antecedem.
I. Mas os erros de julgamento, que inquinam de modo
determinante a sentença proferida pelo Tribunal a quo, não se ficam por aqui.
Tal decisão incorre em iii) vício de violação de lei decorrente da pretensa
falta de verificação do requisito do fumus boni iuris (alínea a), do n.º 1, do
artigo 120.º do CPTA) porquanto em claro proveito da celeridade processual e
abstraindo da responsável ponderação dos argumentos jurídicos e factuais
invocados – que se impunha levar a cabo - demitiu-se o Tribunal a quo de
empreender a análise que se impunha - precipitando-se para uma decisão que -
laborando em erro manifesto e vícios vários (demasiados) – considerou não
preenchido o requisito em causa.
J. Contrariamente ao entendimento sufragado pelo Tribunal a
quo, considera a ora Recorrente que o requisito do fumus boni iuris se dá por
preenchido atento o facto de o acto em causa ser manifestamente inválido por
(i) prescrição do procedimento disciplinar, verificando-se ainda a (ii)
nulidade do procedimento disciplinar, por vícios vários, sendo o mencionado
acto, igualmente, anulável (iii) por vício de violação de lei por erro nos
pressupostos de facto (erro manifesto)/violação do princípio da
proporcionalidade e erro de direito, (iv) por vício de forma por falta de
fundamentação, (v) por vício de violação de lei (decorrente da falta de menção
de circunstâncias atenuantes comuns e especiais no acto de aplicação de pena)
e, por fim, (vi) por violação dos princípios da justiça e da boa-fé, sendo os
alegados vícios manifestamente procedentes.
K. Padece a sentença recorrida, também aqui, de um flagrante
e decisivo erro de julgamento, por errada aplicação do direito ao caso
concreto, quando não considerou a manifesta relevância das ilegalidades
invocadas, termos em que se rejeitam os termos da sentença proferida pelo
Tribunal a quo, desde já se requerendo seja esta substituída por outra que
decrete a providência cautelar requerida com base no preenchimento do requisito
de fumus boni iuris, conforme previsto na alínea a) do artigo 120.º do CPTA.
L. A decisão em crise padece igualmente de erro de julgamento
decorrente iv) Do vício de violação de lei decorrente da pretensa falta de
verificação do requisito do periculum in mora (alínea b), do n.º 1, do artigo
120.º do CPTA), quando não deu como provado o requisito processual da
verificação de um fundado receio de constituição de uma situação de facto
consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, tal como
explicitado, rectius, provado, no Requerimento Inicial de Providência Cautelar.
M. Baseia a sentença o seu entendimento de que não foi
lograda a prova do periculum in mora, com base em duas premissas, ambas
erradas, conforme se passará a demonstrar: i) a errada assunção de que nos
termos do artigo 14.º e 15.º do D.L. n.º 233/2005, de 29 de Dezembro em caso de
uma eventual execução de sentença que determine a invalidade da pena de
demissão aplicada e consequente readmissão, o lugar da Recorrente manter-se-ía;
ii) a errada assunção que a situação de baixa médica prolongada em que se
encontrava retirar-lhe-ía a possibilidade de ter uma reputação profissional a
defender.
N. No tocante à falta de prova do periculum in mora, importa
referir que caso o Tribunal considere que os elementos juntos com o
Requerimento Inicial da Providência Cautelar não eram suficientes para
demonstrar a existência de periculum in mora (o que não se concede), então
sempre teria de lançar mão da prova testemunhal que foi oportunamente indicada
pela Recorrente nesse mesmo Requerimento e que pasme-se foi dispensada.
O. Não é admissível que o Tribunal dispense as testemunhas
oportunamente indicadas pela Recorrente e depois indefira a providência
cautelar, precisamente por falta de prova sobre os factos efectivamente
invocados e relativamente aos quais as testemunhas estavam habilitadas para
testemunhar, atrevendo-se depois a criar a suspeição de que os factos alegados
para prova do periculum in mora eram a final especulativos.
P. Neste contexto, enferma a sentença do Tribunal a quo de
manifesta deficiência instrutória, tendo aplicado erradamente o disposto na
alínea g), do n.º 3, do art. 114.º do CPTA, não fazendo igualmente uso adequado
do disposto no n.º 3, do art. 118.º do CPTA.
Q. Mais se diga que o Tribunal a quo laborou em erro quando
considerou que, nos termos dos artigos 14º e 15º do DL nº 233/2005, de 29 de
Dezembro resultaria a assunção de que em caso de uma eventual execução de
sentença que determine a invalidade da pena de demissão aplicada e consequente
readmissão, o seu lugar manter-se-ía.
R. Não é apenas o DL nº 233/2005, de 29 de Dezembro, omisso
em matéria de reposições de vagas anteriormente extintas, resultando, pelo
contrário, do referido normativo, o carácter residual dos quadros de pessoal das
unidades de saúde estabelece que os lugares destes quadros deverão extinguir-se
quando vagarem, da base para o topo (v. art. 15º, nº 2, última parte do DL).
S. Uma eventual execução de sentença que determine a
invalidade da pena de demissão aplicada e consequente readmissão, pelos
contornos e efeitos que a mesma possui, não irá permitir ou lograr produzir
efeitos reintegratórios da sua esfera jurídica em termos plenos, com reposição
da situação existente antes da lesão e que se materializa com a execução/produção
de efeitos do acto administrativo suspendendo, já que o seu cargo, tudo indica,
será ocupado por outro profissional de saúde.
T. Prosseguindo nos termos da sentença proferida pelo
Tribunal a quo e de que ora se recorre, prossegue o Tribunal alicerçado na
premissa de que a ora Recorrente se “encontrava afastada do serviço de
otorrinolaringologia do requerido e da Faculdade de Medicina há mais de 5
anos”, para daí concluir que alegadamente não possuía por isso pacientes nem
alunos perante quem defender a sua reputação, com o que novamente laborou em
erro de julgamento.
U. Contrariamente ao defendido pelo tribunal a quo, o facto
de um trabalhador se encontrar em situação de doença, não é, por si só
fundamento susceptível de impedir que todos os prejuízos morais decorrentes do
conhecimento público desta sanção, e a perda de credibilidade profissional que
construiu em toda uma carreira; o que está em causa, é o facto de a Recorrente
se encontrar sob pena de poder não voltar a contar com a confiança que até
então merecia dos pacientes e dos seus alunos logo que retome as funções que
ocupava e cesse a situação de baixa em que se encontrava.
V. E não é o facto de não estar presentemente no activo,
virtude da situação de doença que a impede de sofrer no presente ou num futuro
imediato prejuízos no tocante à sua imagem e reputação, que ficarão
inelutavelmente afectados, e logo que retome as suas funções não só
permanecerão, como inclusive se adensarão, caso não ocorra o decretamento da
presente providência cautelar.
W. Nestes termos, conclui-se, sem necessidade de maiores
indagações, que se encontra verificado o requisito do periculum in mora, no
sentido de que os prejuízos para os interesses que a Recorrente visa assegurar
no processo principal, não poderão, seguramente, ser adequadamente compensados,
mesmo que, no final da acção principal, se venha a considerar que tem razão e o
acto suspendendo seja judicialmente anulado ou declarado nulo.
X. Face ao exposto, deverá a respectiva sentença ser revogada
pelo Tribunal ad quem, e substituída por outra que entenda que a factualidade
provada é suficiente para permitir a demonstração do preenchimento do requisito
do periculum in mora (e bem assim, em face da verificação dos demais requisitos
conceder a providência cautelar requerida) ou, caso assim não entenda, o que
não se concede, deverá ser a presente sentença revogada, por errada aplicação
do direito aplicável e por evidentes deficiências instrutórias (e erro
manifesto, por insuficiência, no apuramento da matéria de facto relevante dada
como provada), devendo o Tribunal a quo refazer a matéria de facto provada
(após inquirição das testemunhas) e com base na nova e alargada matéria de
facto voltar a decidir do pedido da Requerente, ora Recorrente.
Y. Por último, mal andou o tribunal a quo, laborando em erro
de julgamento, quando erroneamente, não levou a cabo a v) análise do requisito
constante do nº 2 do artigo 120º do CPTA, com base no alegado argumento de “que
a medida cautelar requerida se encontrava necessariamente votada ao insucesso”.
Z. Impõe-se que seja na presente sede levada a cabo a análise
do requisito de ponderação de interesses previsto nos termos do nº 2 do artigo
do 120º do CPTA, por forma a assegurar a decisão de decretamento de providência
cautelar, fundamento último do presente recurso, com base nos argumentos que se
passam a expender.
AA. A propósito da ponderação dos interesses em presença
verifica-se que os danos que resultam da concessão da providência cautelar
conservatória requerida (no caso, que não se concede, de se vir a considerar
que o acto não é ilegal) são, segundo se pode antever, diminutos ou mesmo
inexistentes, já que a Recorrida poderá, continuar a contar com o exercício da
actividade profissional da Recorrente (desde que a Junta Médica se pronuncie no
sentido da Recorrente já se encontrar em estado de saúde compatível com essas
funções), sem que daí se antecipem quaisquer lesões para os interesses
prosseguidos pela Recorrida.
BB. Bem ao invés, da não suspensão do acto, resultariam um
conjunto significativo de danos, nomeadamente, o elevar do desprestígio
profissional da Recorrente e o denegrir, também acrescido, do seu bom nome
(profissional), sendo que o não decretamento da providência pode mesmo levar,
como se disse, à impossibilidade da Recorrente regressar à vida profissional na
entidade recorrida.
CC. Por todo o exposto, padece a sentença recorrida, também
aqui, de um flagrante e decisivo erro de julgamento, por errada aplicação do
direito ao caso (quando considerou não considerar o requisito em questão),
termos em que se requer a V. Exª. seja em sede de recurso jurisdicional, levada
a cabo a análise do presente requisito, concluindo-se pelo decretamento da
providência cautelar atenta a verificação do requisito consagrado no nº 2, do
artigo 120.º do CPTA, porquanto, no presente caso concreto, numa perspectiva de
confronto dos diversos interesses em causa se apresenta manifestamente
favorável a manutenção do “status quo” existente, devendo nesses termos a
providência cautelar requerida ser decretada».
Termina requerendo a procedência do recurso e em
consequência, seja:
«(i) A decisão do Tribunal a quo, sobre a matéria de facto
dada como assente, alterada nos termos supra expostos.
(ii) A sentença declarada nula por nulidade decorrente da
proibição de prova testemunhal quanto ao requisito de “fumus boni iuris”.
(iii) Subsidiariamente, a sentença recorrida considerada revogada
nos termos e com os fundamentos acima indicados, no segmento respeitante à
alegada falta de verificação do requisito do “fumus boni iuris” (alínea a), do
nº 1, do artigo 120º do CPTA).
(iv) Subsidiariamente, a sentença recorrida considerada
revogada nos termos e com os fundamentos acima indicados, no segmento
respeitante à alegada falta de verificação do requisito do “periculum in mora”
(alínea b), do nº 1, do artigo 120º do CPTA) procedendo à análise do requisito
referente à ponderação de interesses, atento o respectivo carácter subsidiário
quanto à alínea b) do nº 1 do artigo 120º do CPTA (nº 2, do artigo 120º do
CPTA), considerando o respectivo preenchimento.
(v) Subsidiariamente, devem baixar os autos ao Tribunal a quo
para que este Tribunal supra o défice instrutório, procedendo à ampliação da
matéria de facto provada, através da audição das testemunhas oportunamente
indicadas pelo Recorrente, e consequentemente emita nova sentença».
*
O recorrido CENTRO HOSPITALAR DE SÃO JOÃO E.P.E. contra
alegou no sentido da improcedência total do recurso, concluindo da seguinte
forma:
«1ª - Face ao exposto, torna-se claro que não se mostra
evidente a procedência da acção principal - inexistência de fumus boni iuris.
2ª - Não foi evidenciado e provado a existência de qualquer
prejuízo de difícil reparação ou situação de facto consumado - inexistência de
periculum in mora.
3ª - De qualquer maneira, e pelas razões expostas, a
ponderação dos interesses em confronto aponta para a recusa da concessão da
providência requerida».
*
A Digna Magistrada do Ministério Público junto deste Tribunal
notificada nos termos e para os efeitos previstos nos artºs 146º e 147º do CPTA
não emitiu qualquer pronúncia.
*
Com dispensa de vistos, nos termos do disposto no artº 36º,
nºs 1 e 2 do CPTA, os autos foram submetidos à Conferência para julgamento.
2 - FUNDAMENTOS
2 – 1 - MATÉRIA DE FACTO
Da decisão recorrida resultam assentes os seguintes factos:
«1) A requerente iniciou funções enquanto Médica Interna do
Internato Geral em 01/01/1987, tendo concluído com aproveitamento o internato.
2) Em 01/01/1989, a requerente iniciou funções na categoria
de Médica Interna do Internato Complementar de Otorrinolaringologia, nos
serviços do requerido, tendo tornado posse em 26/05/1989, cargo que concluiu em
30/01/1993, com a classificação final de 19,7 valores, obtendo, assim, o grau
de Assistente de Otorrinolaringologia, com grande distinção, passando, a partir
da mesma data, a Assistente Eventual de Otorrinolaringologia.
3) Em 10/02/1994, a requerente tomou posse, após concurso em
que obteve a classificação de 19,2 valores, como Assistente de
Otorrinolaringologia no Serviço de Otorrinolaringologia do requerido, com
efeitos retroactivos a 02/12/1993, em regime de tempo completo.
4) Em 25/06/2002, a requerente obteve aprovação no concurso
de habilitação ao grau de Consultora de Otorrinolaringologia da carreira médica
hospitalar, passando, a partir desse exacto momento, a Assistente Graduada de
Otorrinolaringologia (cfr. publicação no Diário da República, II Série n.º 144,
de 25/06/2002), categoria que, de resto, mantém.
5) A requerente apresentou atestado médico em 02/05/2006,
mantendo-se em baixa médica até 30/06/2006.
6) A requerente esteve em gozo de licença sem vencimento,
autorizada por despacho do Conselho de Administração do requerido em
05/05/2006, desde 01/07/2006 a 29/09/2006.
7) A requerente apresentou atestado médico em 30/09/2006,
mantendo-se em baixa médica até 04/12/2006.
8) A requerente compareceu a junta médica em 05/12/2006,
06/03/2007 e 03/07/2007, tendo sido emitido parecer no sentido da
impossibilidade da requerente regressar ao serviço e designada data para
realização de nova junta médica, nos termos previstos no artº 11º, nº 2, al. b)
do Decreto Regulamentar nº 41/90, de 29 de Novembro.
9) A requerente compareceu a junta médica em 16/10/2007,
tendo sido emitido parecer no sentido de ocorrer eventual incapacidade
permanente para o serviço, com recomendação ao respectivo serviço sugerindo a
apresentação à junta médica da Caixa Geral de Aposentações, nos termos
previstos no art.º 11º, n.º 2, al. g) do Decreto Regulamentar nº 41/90, de 29
de Novembro.
10) Em 27/11/2007, 06/03/2008, 18/06/2008 e 12/09/2008 foi a
requerente notificada, além do mais, para comparecer no prazo de 10 dias úteis
no Hospital de S. João, Serviço de Gestão de Recursos Humanos, Posto de
Atendimento n.º 01, munido(a) do respectivo Bilhete de Identidade, cartão de
Contribuinte, número Identificação Bancária (NIB) e declaração da Segurança
Social (caso tenha efectuado descontos).
11) A requerente apenas compareceu nos serviços do requerido
em 26/09/2008 - data em que preencheu e assinou o requerimento dirigido à Caixa
Geral de Aposentações.
12) Em 27/11/2008, o requerido expediu ofício nº 29749,
acompanhado de aviso de recepção, dirigido à requerente e de cujo teor consta,
além do mais, o seguinte:
“(…)
Levo ao conhecimento de V. Ex.ª, que deverá comparecer no
próximo dia 09 de Dezembro de 2008, pelas 15:15 horas, no Serviço de
Verificação de Incapacidades do Centro Distrital do Porto, (…), a fim de ser
submetido a exame médico, conforme ofício enviado a estes Serviços.
(…)”.
13) Em 09/12/2008, a requerente não compareceu à junta médica
a que se refere o descrito no ponto anterior.
14) Em 23/11/2009, por meio de telecópia, o requerido
solicitou à Caixa Geral de Aposentações a prestação de informação sobre a
situação profissional da requerente, mencionando que a mesma foi submetida a
junta médica de aposentação em 9 de Dezembro de 2008.
15) Em 22/12/2009, a Caixa Geral de Aposentações prestou a
seguinte informação: “(…) a interessada faltou a uma Junta Médica no Serviço de
Verificação de Incapacidades do Centro Distrital do Porto, no dia 09-12-2008,
sem que tenha justificado a falta. (…)”.
16) Em 07/01/2010, o Conselho de Administração do requerido
deliberou o seguinte:
“(…)
O Conselho de Administração tomou conhecimento da informação
do Serviço de Gestão de Recursos Humanos sobre a assiduidade da Sra. Dra. L…
(…). Analisado o histórico da assiduidade e de acordo com a informação recebida
da Caixa Geral de Aposentações em 22 de Dezembro de 2009, verifica-se que [a
requerente] faltou, no dia 9 de Dezembro de 2008, à Junta Médica (…), data a partir
da qual se encontra ausente do Hospital de S. João, sem qualquer justificação.
Face ao exposto, o Conselho de Administração decidiu:
1. Considerar injustificadas, para todos os efeitos, as
faltas dadas [pela requerente] desde o dia 9 de Dezembro de 2008 até 31 de
Dezembro de 2009.
2. Instaurar um Processo Disciplinar à Sra. Dra. L….
3. (…).
(…)”.
17) Em 27/05/2010, o Instrutor do processo disciplinar nº
08-D10 proferiu o despacho que se segue:
“(…)
Por deliberação do Conselho de Administração do Hospital de
S. João EPE, datada de 7 de Janeiro de 2010, foi instaurado um processo
disciplinar à arguida, Dr.ª L…, Assistente Graduada de Otorrinolaringologia.
Pelo presente instrumento e no cumprimento do disposto no n.º
3, do art.º 39º, do anexo à Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, quer o Conselho
de Administração, quer o arguido, quer ainda o participante, tomam conhecimento
da data de início do referido processo disciplinar.
(…)”.
18) Foram enviadas notificações à requerente, acompanhadas do
respectivo aviso de recepção - com o intuito de a notificar do despacho
descrito no ponto anterior e marcação de data para a sua audição - em
27/05/2010 e em 30/06/2010, sucedendo que aquela não atendeu, nem procedeu ao
subsequente levantamento da correspondência na estação dos CTT.
19) Em 23/07/2010, foi publicado no Diário da República, 2ª
série, n.º 142, Aviso n.º 14633/2010, do Hospital de São João, E.P.E., com o
seguinte teor:
“(…)
L…, arguida no processo disciplinar n.º 08/-D10, fica V. Ex.
notificada para nos termos e efeitos estatuídos no n.º 2 do artigo 46º, do
anexo à Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, e no âmbito do processo disciplinar
n.º 08-D10, mandado instaurar pelo Conselho de Administração do Hospital de São
João, E.P.E., em 7 de Janeiro de 2010, prestar declarações na qualidade de
arguida.
Para o efeito, deve comparecer, no Hospital de São João,
E.P.E., dia 3 de Setembro de 2010, às 09.30 h no Gabinete do Instrutor do
processo, sito no piso 2, corredor central de acesso à zona de ambulatório,
porta com a indicação UIG PD- Director.
(…)”.
20) Em 03/09/2010, a requerente não compareceu para prestar
declarações no âmbito do processo disciplinar n.º 08-D10, nem apresentou
qualquer justificação.
21) Em 16/10/2010, foi proferida acusação, cujo teor consta
de fls. 54 a 62 do processo administrativo, e que aqui se considera como
inteiramente reproduzida para todos os efeitos.
22) A requerente foi notificada da acusação descrita no ponto
anterior em 27/10/2010.
23) Em 11/11/2010, a requerente apresentou defesa escrita,
juntando documentos, requerendo a junção de diversos elementos documentais e
indicando testemunhas.
24) Em 31/05/2011, foi proferido o seguinte despacho pelo
instrutor:
“(…)
Considerando que, no âmbito da apresentação da defesa da
arguida L… e das diligências probatórias por si requeridas, é pretendido que a
instrução do presente processo disciplinar inquira uma das testemunhas de
defesa – M… - sobre matéria da acusação, nomeadamente acerca dos artigos 3º a
13° e 19° a 22°, determino:
1. Recusar a produção da referida prova testemunhal sobre a
matéria da acusação, por considerar a diligência manifestamente impertinente e
contrária às regras do ónus da prova, em processo disciplinar, nos termos do no
1, do artigo 53º, do anexo à Lei nº 58/2008, de 9 de Setembro - Estatuto
Disciplinar dos Trabalhadores Que Exercem Funções Públicas.
2. Uma vez que compete, em exclusivo, ao titular da acção
disciplinar o ónus da prova dos factos constitutivos da infracção imputada à
ora arguida, e considerando que a respectiva produção de prova já ocorreu em
momento oportuno, nada mais há a considerar sobre a instrução já concluída nos
termos do artigo 48° do já mencionado diploma legal.
3. Estando assegurado, ab integro, o direito constitucional
da defesa da arguida que, oportunamente, apresentou os factos que contraditam a
argumentação plasmada em sede de acusação, os depoimentos das testemunhas a
serem inquiridas só deverão incidir sobre os factos constantes dos artigos 112°
a 120°, 125° a 134°, 140° a 142° da defesa escrita.
(…)”.
25) Em 31/05/2011, foi também proferido o seguinte despacho
pelo instrutor:
“(…)
Considerando que, no âmbito da apresentação da defesa da
arguida L… e das diligências probatórias por si requeridas, é pretendido que a
instrução do presente processo disciplinar, aceite a prova documental:
a) Os documentos ora juntos pela arguida.
b) Requerer que seja notificado o Departamento de Recursos
Humanos do HSJ para vir aos autos:
c)
I. Cópia do processo individual da arguida
II. Última junta médica da arguida em seu poder
III. Regulamento, ofícios ou normas internas existentes a
respeito da justificação e comunicação de faltas por parte dos trabalhadores.
d) Mais se requer que sejam oficiados os CTT para vir aos
autos informar sobre a data em que foi conseguida a entrega da carta com o
registo RC 114069054 PT.
Determino:
1. Quanto à alínea a), todos os documentos juntos pela
arguida, são aceites e passam a constituir prova.
2. Quanto à alínea b), pontos I e II é documentação que está
disponível e pode ser solicitada a consulta ou a sua confiança pela defesa da
arguida, sempre que entender, não vendo esta instrução nenhuma vantagem em
onerar os autos com tal património documental; o ponto III, porque são do
domínio público, o conjunto de normas existentes no Hospital a respeito da
justificação e comunicação de faltas por parte dos trabalhadores, estando todas
disponíveis, mais legislação no sítio da intranet do Hospital, a instrução não
vê pertinência nem necessidade em juntar aos autos as mesmas.
3. Quando à alínea d), a defesa fez prova documental,
documento n.º 1, que como já se disse foi aceite e é bastante e suficientemente
esclarecedora, pelo que se revelou inútil qualquer pedido de esclarecimento aos
CTT.
26) Foram inquiridas as testemunhas indicadas pela
requerente.
27) Em 20/06/2011, foi elaborado relatório final, cujo teor
consta de fls. 195 a 247 do processo administrativo (e que aqui se considera
como inteiramente reproduzido para todos os efeitos), e que propõe a aplicação
à requerente da pena de demissão, nos termos do preceituado no art.º 18º, n.º
1, al. a) da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro.
28) Em 20/06/2011, o Conselho de Administração do requerido
aprovou a proposta de demissão formulada pelo instrutor do presente processo
disciplinar nos termos e com os fundamentos aduzidos e, na mesma data, o
Presidente do mesmo Conselho de Administração proferiu despacho de aplicação da
referida pena à requerente».
*
2.2 - O DIREITO:
O recurso jurisdicional interposto pela recorrente será
apreciado à luz dos parâmetros estabelecidos nos artºs 660º, nº 2, 664º, 684º,
nº 3 e 4, e 685º-Aº todos do CPC aplicáveis ex-vi artº 140º do CPTA.
*
QUESTÕES A DECIDIR:
1. DA INSUFICIÊNCIA DA MATÉRIA DE FACTO ASSENTE E DA PRODUÇÃO
DE PROVA TESTEMUNHAL QUANTO AO REQUISITO DO “fumus boni iuris”:
E quanto a esta questão, pretende a recorrente que sejam
levados aos factos provados, para preenchimento do requisito previsto na al.
a), do nº 1 do artº 120º do CPTA, factos por si alegados no requerimento
inicial que se prendem com o teor dos certificados do seu processo individual,
designadamente quanto ao seu percurso profissional sem registo de medidas
disciplinares [artºs 44º e 45º desta alegação de recurso], a “sua” justificação
para ter faltado à Junta Médica, o facto do seu marido se ter deslocado à
Segurança Social para informar que a recorrente tinha faltado à Junta Médica e
ter falado com uma funcionária do referido Centro que ficou de lhe dizer como
devia agir, e ainda juízos meramente subjectivos e conclusivos como são os
referidos no artº 39 desta alegação de recurso.
Mas, não lhe assiste qualquer razão, neste segmento de
recurso, tratando-se tão-somente de uma repetição de tudo quanto alegou em sede
de petição inicial e que justificadamente foi desconsiderado na selecção dos
factos provados como se constata da decisão recorrida.
Na verdade, o que a recorrente reitera neste recurso
jurisdicional, é a tentativa de transformar este processo cautelar em processo
principal, pretendendo que sejam dados como provados factos [e consequências
dos mesmos] que necessitam de prova a produzir, prova esta que, pela natureza
deste processo, não poderá aqui ser feita [tratam-se de factos que ou foram
impugnados na sua totalidade ou foram impugnadas as ilações retiradas pela
recorrente, pelo que nunca poderiam ser levados à matéria assente].
Por outro lado, também é irrelevante para a decisão a
proferir, pretender tirar ilações de um parecer jurídico que inicialmente se
pronunciou sobre a prescrição do procedimento disciplinar, designadamente,
quando esta conclusão se mostra afastada e fundamentada pelo presente processo
acusatório que deu origem à deliberação suspendenda e, por isso, expressamente
impugnada pelo recorrido.
Igualmente é irrelevante para os requisitos a apreciar nesta
sede cautelar em que não se exige uma análise exaustiva dos factos alegados que
o marido da recorrente se tenha deslocado ao Centro de Segurança Social e tenha
falado com uma funcionária acerca deste assunto, quando se mostra
documentalmente provado que a recorrente não justificou, como lhe era exigido,
a falta do dia 09/12/2008 à Junta Médica.
Face ao exposto e sem necessidades de quaisquer outras
considerações é manifesta a falta de razão da recorrente no que a este aspecto
concerne.
E o mesmo se passa com a alegada “nulidade da decisão
recorrida” decorrente da “proibição de prova testemunhal” [com vista ao
preenchimento do requisito “fumus boni iuris”], pois também aqui apenas importa
apurar se as ilegalidades imputadas ao acto suspendendo ocorrem ou não, mas sem
necessidade de fazer uma análise exaustiva, como aliás decorre expressamente do
despacho judicial proferido a fls. 314 [cfr. nº 3 do artº 118º do CPTA].
Deste modo, é também nossa opinião que, no caso concreto,
nenhuma necessidade havia de ouvir as testemunhas arroladas pela recorrente,
dado que todos os factos por ela alegados como susceptíveis de integrar o
requisito fumus boni iuris foram tidos em conta na decisão recorrida, através
da análise perfunctória que lhe é exigida.
Aliás, mais uma vez a recorrente olvida que na análise deste
requisito, importa apenas apurar se as ilegalidades imputadas ao acto
suspendendo são flagrantes, ostensivas e evidentes, mas sem necessidade de
fazer uma análise exaustiva, pois nesse caso, este processo deixaria de ter
natureza cautelar, para passar a ter natureza de processo definitivo.
2. DO ERRO DE JULGAMENTO [AL. A) DO Nº 1 DO ARTº 120º DO
CPTA]:
Na análise deste requisito, em que a evidência das
ilegalidades apontadas deve ser palmar e sem necessidade de eloquentes
indagações, abdicaremos de tecer quaisquer considerações jurisprudenciais e
doutrinais, dada a abundância e mesmo excesso constante quer das alegações de
recurso, quer da decisão recorrida, pelo que, nos limitaremos a analisar
singelamente os factos apurados e interpretá-los à luz da norma prevista na al.
a), do nº 1, do artº 120º do CPTA.
E porque a recorrente continua a reiterar tudo quanto vem
referindo desde o requerimento inicial, limitando-se a discordar da análise
feita na decisão recorrida, vejamos o que a este respeito aqui foi decidido:
«No seguimento do que se expendeu, importa averiguar, em
moldes de sumaria cognitio, se é evidente a procedência da pretensão principal,
ou seja, se é patente ou não, nestes autos, a ilegalidade do acto suspendendo.
Na verdade, e desde logo, é convicção deste Tribunal que não
são manifestos ou inequivocamente evidentes, nos termos que se escalpelará de
seguida, os fundamentos nos quais a requerente assenta a sua pretensão.
Vejamos:
A requerente imputa ao acto em apreciação as seguintes
ilegalidades:
a) Prescrição do procedimento disciplinar, nos termos do
disposto no art.º 6º, n.ºs 1 e 2 do ED;
b) Ineptidão da acusação nos termos do art.º 37º, n.º 1 do
ED, em virtude da violação do disposto no art.º 48º, n.º 3 do ED;
c) Omissão de realização de diligências requeridas e
essenciais para a defesa, em violação do preceituado no art.º 37º, n.º 1;
d) Violação dos princípios da proporcionalidade e da culpa;
e) Erro quanto aos pressupostos do acto;
f) Falta de fundamentação;
g) Violação dos princípios da justiça e da boa-fé.
No que concerne à invocada prescrição do procedimento
disciplinar, a requerente defende que a mesma se verifica, atento o preceituado
no art.º 6º da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro (doravante, ED), visto que
entende que na data em que o procedimento disciplinar teve início - no seu
entender, em 07/01/2010 - já tinha decorrido mais de um ano desde a prática do
acto que o requerido reputa como infracção disciplinar (09/12/2008).
Por outro lado, ainda acrescenta que, ainda que o requerido
apenas tenha tido conhecimento da não realização da mencionada junta médica
através do ofício da Caixa Geral de Aposentações, de 22/12/2009, a verdade é
que foram ultrapassados os 30 dias previstos no art.º 6º, n.º 2 do ED, pois que
a requerente apenas teve conhecimento da acusação em 27/10/2010. De resto,
argumenta a requerente que não está em causa uma infracção continuada, uma
situação típica de falta de assiduidade, cujo fundamento seriam as próprias
faltas injustificadas, mas sim um facto temporalmente delimitado e explicativo
das alegadas faltas injustificadas.
Ora, não obstante a requerente clamar pelo decretamento da
providência, quanto à ilegalidade acabada de descrever e que imputa ao acto em
apreço, à luz da al. a) do n.º 1 do art.º 120º do CPTA, a verdade é que tal não
é possível, visto que não subsiste nesta situação a evidência manifesta que é
apanágio do citado normativo legal.
Com efeito, a verificação da ocorrência da prescrição do
procedimento disciplinar, nos termos em que a requerente invoca, depende da
indagação dos exactos factos que estribam a decisão punitiva. O que quer dizer
que a solução diverge consoante a pena de demissão decorra da actuação da
requerente no tocante à junta médica designada para 09/12/2008, ou da ausência
da requerente no serviço a partir dessa mesma data.
Adicionalmente, a solução a encontrar depende ainda da
qualificação da infracção como continuada ou como esgotando-se numa só
actuação, pois que o prazo estipulado no art.º 6º, n.º 1 do ED não dispensa tal
distinção. Acresce que, para efeitos do previsto no art.º 6º, n.º 2 do ED
interessa ainda determinar a data em que a infracção foi conhecida, bem como a
data em que o procedimento disciplinar foi instaurado.
Por conseguinte, e contrariamente à tese sufragada pela requerente,
não vislumbra este Tribunal que ocorra o necessário carácter de evidência
exigido pelo art.º 120º, n.º 1, al. a) do CPTA para decisão da questão da
prescrição do procedimento disciplinar.
Em segundo lugar, esgrime a requerente que a decisão disciplinar
suspendenda padece de nulidade em virtude do preceituado no art.º 37º, n.º 1 do
ED, dado que a acusação não respeita as exigências vertidas no art.º 48º, n.º 3
do mesmo ED. Com efeito, argui a requerente que o requerido não procedeu à
indicação, para cada uma das infracções imputadas, do dever profissional
violado, do normativo legal aplicável e da concreta pena aplicável para essa
infracção, sucedendo que os deveres alegadamente violados pela requerente são
enunciados de modo descontextualizado, sem concretização fáctico-jurídica, isto
é, de modo conclusivo e sem qualquer subsunção nas normas adequadas.
Ora, como é bom de ver, também não é manifesta a ocorrência
da ilegalidade apontada, antes sendo absolutamente indispensável proceder ao
escrutínio da acusação e do relatório final elaborados pelo órgão instrutor do
processo disciplinar, no sentido de avaliar se a acusação se encontra
suficientemente substanciada por forma a permitir o adequado, correcto e justo
direito de defesa por banda da requerente.
Em terceiro lugar, clama a requerente que foi recusada a
produção de prova por si requerida - documental e testemunhal -, prova essa
dotada de interesse para a boa decisão da causa, o que traduz a omissão de
diligências essenciais para a descoberta da verdade material, que é sancionada
com a nulidade, em conformidade com o disposto no art.º 37º, n.º 1 do ED.
No que concerne a este ponto, não pode deixar-se de ponderar
o descrito nos pontos 23, 24, 25 e 26 do probatório coligido, o que significa
que ao Tribunal cumpre, em face do alegado, a indagação quanto à essencialidade
das diligências requeridas pela requerente e que foram rejeitadas pelo
instrutor do processo disciplinar.
Assim sendo, é inevitável concluir, uma vez mais, que a
necessidade de tal tarefa investigatória é demonstrativa, por si só, da falta
de evidência da procedência de tal vício.
A requerente atribuiu, ainda, ao acto agora em crise, a
violação dos princípios da proporcionalidade e da culpa quanto à pena
disciplinar seleccionada, dado que, em virtude do preceituado nos art.ºs 18º e
20º do ED, subsistem razões determinantes da aplicação de uma pena diversa da
que foi aplicada à agora requerente, pois que até a infracção em discussão -
eventual violação do dever de assiduidade - não deve conduzir automaticamente à
demissão do funcionário, sendo ainda que não foram relevadas quaisquer
circunstâncias atenuantes da pena, designadamente, a descrita no art.º 22º, al.
a) do ED, ou mesmo considerado o previsto no art.º 23º do mesmo diploma, atenta
a situação de baixa médica em que a requerente se encontrava, e que certamente
a impediu de proceder ao levantamento da notificação para comparecer na junta
médica a realizar em 09/12/2008 mais celeremente.
Adita também, que a falta de ponderação do disposto nos
mesmos art.ºs 22º e 23º do ED é conducente à violação destes mesmos preceitos.
No entanto, também aqui falece o entendimento espraiado pela
requerente, uma vez que a decisão quanto à violação dos referenciados
princípios e normativos legais implica o exame crítico da factualidade
invocada, sendo certo que, nesta matéria, subsiste divergência entre as partes
no que concerne ao nível de excelência da prestação do serviço pela requerente,
divergência esta que, naturalmente, imporá a produção de prova em sede de
processo principal, ainda a propor.
A requerente reclama que o acto suspendendo padece de erro
nos seus pressupostos, esgrimindo que não ocorrem, sequer, factos susceptíveis
de integrarem o conceito de infracção disciplinar, uma vez que não ocorreu a
prática de faltas injustificadas. Argumenta a título de fundamento que,
contrariamente à indicação fornecida pela Caixa Geral de Aposentações ao
requerido, não faltou à junta médica que se encontrava agendada para a data de
09/12/2008 e, muito menos, que tal falta seja injustificada. E estriba o seu
entendimento, por um lado, na circunstância de apenas ter sido notificada para
comparecer à dita junta no dia seguinte àquele que se encontrava designado; por
outro lado, na circunstância de o seu marido se ter inteirado do procedimento
seguido em tais situações e da informação transmitida de que seria convocada
para nova junta médica.
Contudo, como de resto remanesce cristalinamente dos autos,
não só o requerido impugna a sobredita falta de notificação atempada para
comparecer na junta médica, como impugna também o facto de tal ausência ter
sido devidamente justificada, até porque a informação prestada pela Caixa Geral
de Aposentações se apresenta em sentido totalmente oposto à posição agora
avançada pela requerente.
Quer isto significar, portanto, que a apreciação do vício em
causa se encontra dependente de clarificação factual a que não cabe proceder em
sede cautelar. Por essa razão, também não se verifica aqui o condicionalismo
para o decretamento da providência no âmbito do que se encontra previsto no
artº 120º, nº 1, al. a) do CPTA.
Finalmente, a requerente imputa ao mesmo acto a existência de
falta de fundamentação - argumentando que o Conselho de Administração se limita
a remeter a fundamentação da sua decisão para os fundamentos constantes da
proposta do instrutor do processo disciplinar, sem qualquer indicação das
razões de facto ou de direito que conduzem àquela decisão - e a violação dos
princípios da justiça e da boa-fé, desrespeito este que assenta na constelação
fáctica já apontada, a que acresce a circunstância do requerido ter procedido
ao pagamento das remunerações à requerente durante mais de um ano, sem ter
efectuado qualquer diligência, e, posteriormente, ter instaurado procedimento
disciplinar em que alega a insustentabilidade da manutenção da relação laboral.
Porém, estes vícios consubstanciam ilegalidades que, pela sua
específica natureza, não possuem, em regra, o necessário pendor da “ evidência
“. Antes exigem uma tarefa de peculiar indagação por parte do Julgador.
O que quer dizer que se impõe, no caso versado, a indagação
da ocorrência de circunstâncias que possam justificar a actuação do requerido.
E, assim sendo, não se verifica a “ evidência “ exigida e
pressuposta na al. a) do nº 1 do artº 120º do CPTA.
Por conseguinte, atento o acervo argumentativo de natureza
jurídica que a requerente esgrime, apresenta-se claro que não é evidente a
procedência da pretensão principal, inexistindo, por essa razão, fundamento
para o decretamento da providência requerida a coberto da al. a), do nº 1 do
artº 120º do CPTA».
Ora, esta análise acabada de transcrever não nos merece
qualquer censura, pois, não detectamos nela qualquer erro de julgamento, tendo,
ao invés, procedido a uma interpretação e conclusão perfeitamente compatível
com a lei vigente.
Na verdade, todas as ilegalidades apontadas pela recorrente à
deliberação suspendenda não resultam evidentes, flagrantes e a “olho nu” e, daí
a tentativa inglória de tentar produzir prova testemunhal acerca de algumas
delas; porém, como supra referimos, da análise dos autos, não vislumbramos que
tal produção de prova se imponha.
E, deste modo, nenhuma das ilegalidades invocadas, se
apresenta de molde a permitir o decretamento imediato da providência, na medida
em que não existem sumariamente demonstrados elementos objectivos que permitam
concluir pela ilegalidade ostensiva e grave que evidencie a procedência da
acção principal a interpor.
Assim, considerando a exaustão das considerações efectuadas
no Tribunal a quo, e o acerto das mesmas, somos a concluir que inexiste o
alegado erro de julgamento na apreciação do requisito do fumus boni iuris
previsto na al. a), do nº 1 do artº 120º do CPTA, estando as ilegalidades
apontadas longe de ser manifestas, não sendo por isso evidente a procedência da
pretensão a formular pela recorrente na acção principal.
*
3. DO ERRO DE JULGAMENTO [AL. B) DO Nº 1 DO ARTº 120º DO CPTA
– VERTENTE PERICULUM IN MORA]:
No âmbito desta alínea, permite-se que a providência cautelar
conservatória seja concedida caso “haja fundado receio da constituição de uma
situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação
para os interesses que o requerente visa assegurar no processo principal
(periculum in mora) e não seja manifesta a falta de fundamento da pretensão
formulada ou a formular nesse processo ou a existência de circunstâncias que
obstem ao seu conhecimento de mérito (fumus non malus juris)”.
Nesta análise, o requisito do fumus non malus juris [alínea
b)] não é tão exigente, não impondo um juízo de certeza sobre o bom ou mau
direito, sendo suficiente a formulação de um juízo negativo sobre a aparência
de mau direito.
Por outro lado, através do requisito do periculum in mora,
pretendeu-se impedir que durante a pendência da acção principal a situação de
facto se altere e se consolide de forma a que a sentença nela proferida, sendo
favorável, se esvazie de eficácia prática.
Ou seja, se se verificarem os demais requisitos para a
concessão da providência cautelar, a mesma terá de ser concedida, como refere o
Prof. Aroso de Almeida, in “O Novo Regime do Processo nos Tribunais
Administrativos”, Almedina, 4ª edição, págs. 299 e 300 “desde que os factos
concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio de que, se for
recusada, se tornará depois impossível, no caso de o processo principal vir a
ser julgado procedente, proceder à reintegração, no plano dos factos, da
situação conforme à legalidade - é este o sentido a atribuir à expressão facto
consumado”.
Igualmente deverá ser concedida sempre que, não se preveja
que esta impossibilidade de reintegração devido à demora do processo principal,
quando os factos concretos alegados pelo requerente inspirem o fundado receio
da produção de prejuízos de difícil reparação no caso da providência ser recusada
e isto, quer porque a reintegração no plano dos factos se perspectiva difícil,
seja porque pode haver prejuízos que, em qualquer caso, se produzirão ao longo
do tempo e que a reintegração da legalidade não é capaz de reparar, total ou
parcialmente – cfr. neste sentido a obra supra citada do Prof. Aroso de
Almeida.
Daí que, como refere o Prof. Vieira de Andrade, in Justiça
Administrativa, 8ª edição, pág. 348 “o julgador deverá fazer um juízo de
prognose, colocando-se na situação futura de uma hipotética sentença de
provimento, para concluir se há, ou não, razões para recear que tal sentença
venha a ser inútil, por se ter consumado uma situação de facto incompatível com
ela, ou por entretanto se terem produzido prejuízos de difícil reparação para
quem dele deveria beneficiar, que obstem à reintegração específica da sua
esfera jurídica”.
A prova, ainda que sumária, quer do fundado receio de
constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de
difícil reparação, pertencem ao requerente da providência - cfr. artº 342º, nº
1, do Código Civil.
*
Aqui chegados, revertamos ao caso concreto, analisando então
o periculum in mora, uma vez que o requisito do fumus non malus iuris não se
mostra sindicado neste recurso jurisdicional, porque julgado verificado.
Quanto ao periculum in mora, insiste a recorrente nos
argumentos apresentados ao longo do processo, referindo ainda que existe
contradição na fundamentação e decisão na análise deste requisito.
Mas, mais uma vez, também este segmento do recurso se mostra
votado ao insucesso.
Vejamos, então, o que a este respeito se escreveu na decisão
recorrida e, apenas na vertente supra referida, dispensando-nos mais uma vez de
quaisquer considerações doutrinais e jurisprudências, por abundantes nos autos:
«A requerente, neste domínio, clama que caso não seja
concedida a providência (…), haverá um risco efectivo de constituição de uma
situação de facto consumado ou, pelo menos, a produção de prejuízos de difícil
reparação, visto que é de assumir que irá ser aberta uma vaga para
preenchimento de lugar para o cargo que vinha exercendo de Assistente Graduada
de Otorrinolaringologia (…), revelando-se, a partir daí, de todo em todo
impossível a reintegração específica na esfera jurídica da requerente, nomeadamente,
por referência ao previsto no artº 173º, nº 4 do CPTA.
Acrescenta que apenas com a suspensão dos efeitos do acto
aqui em discussão se logrará impedir que a reputação profissional da requerente
fique irreversivelmente afectada, visto que, um despacho da autoria do Conselho
de Administração da Requerida que determina a sua imediata demissão é lesivo e
atentatório da sua esfera jurídica pessoal, mais concretamente, do seu bom nome
profissional. Estriba a sua tese no entendimento de que, da execução desta decisão
administrativa resultam, inevitavelmente, prejuízos de natureza moral
decorrentes da afectação da imagem e bom nome da requerente, que acarretam sua
humilhação e perda de reputação perante os colegas, pacientes e alunos,
acarretando angústia trazida pelo sentimento de injustiça, bem como nas
circunstâncias de, por um lado, exercer a carreira médica na qual é essencial a
transmissão de uma imagem de estabilidade, seriedade, credibilidade, perante
pacientes, colegas e demais pessoal hospitalar e, por outro lado, de ser
docente da Faculdade de Medicina do Porto - muito embora não exercesse este
cargo por motivo de baixa por doença -, o que impõe a manutenção de uma imagem
de conduta profissional irrepreensível.
Clama a requerente, portanto, que o não decretamento da
presente providência suspensiva conduzirá à formulação de um juízo de censura
vexatório e desprestigiante e com efeito estigmatizante.
Alega, também, a circunstância de não poder prosseguir com o
Doutoramento na área da Medicina, já iniciado mas entretanto interrompido por
motivo de doença.
O requerido, contrariando a postura da requerente, responde
que, atenta a sua natureza jurídica e o disposto nos DL nºs 233/2005, de 29 de
Dezembro e 30/2011, de 2 de Março, deixou de haver quadros de pessoal, antes
existindo uma flexibilidade no número de profissionais em cada serviço em
função das suas necessidades, o que implica que não haverá qualquer impedimento
legal em que a mesma reassuma um lugar da sua categoria no mapa de pessoal do
Serviço de Otorrino, que naturalmente será criado. Contesta, por isso, que
possa ocorrer situação de facto consumado.
No tocante à reputação profissional da requerente, defende o
requerido que a mesma não será afectada, visto que aquela está ausente do
serviço e da Faculdade de Medicina há mais de 5 anos.
Ora, atento todo o acervo argumentativo esgrimido pelas
partes e sopesando todos os elementos legais e jurisprudenciais pertinentes, é
nosso entendimento que a requerente não logra provar a existência de periculum
in mora.
Na verdade e em bom rigor, a requerente não invoca qualquer
prejuízo concreto, para além de um alegado impedimento de execução de uma
futura sentença de eventual procedência.
Com efeito, diga-se já que todos os prejuízos que a
requerente alega e que se prendem com o eventual preenchimento de vaga aberta
em sequência da sua demissão são hipotéticos e não passam de mera especulação,
pois que dependem, em primeiro lugar, de uma sentença que julgue procedente a
acção - o que não é certo - e, em segundo lugar, de não ser possível, em sede
de execução de sentença de procedência do pedido, reconstituir a situação
hipotética em que a requerente se encontraria.
Com efeito, para além da incerteza quanto à favorabilidade,
para a requerente, da sentença que irá ser proferida em acção principal ainda a
ser proposta, nada obsta, a nosso ver, à execução dessa mesma sentença, atento
o teor e os efeitos do acto que ali se encontra em crise, assomando, por isso,
credível a reconstituição da carreira da requerente com os inerentes efeitos a
nível de vencimento.
Acrescente-se que, a tese avançada pela requerente quanto à
impossibilidade de reconstituição da situação de facto no caso de ser recusado
o decretamento da presente providência não se mostra coerente com o preceituado
nos art.ºs 14º e 15º do Decreto-Lei nº 233/2005, de 29 de Dezembro, pois que,
para os funcionários que - como no caso da requerente - pertencem ao quadro de
pessoal, o seu lugar mantém-se, extinguindo-se apenas aquando da respectiva
vacatura. Daí que, se a requerente obtiver a procedência da sua pretensão na
acção principal que vier a propor, naturalmente que a execução de tal sentença
imporá a reposição da vaga entretanto indevidamente extinta.
No que tange à invocação de que apenas com a suspensão dos
efeitos do acto aqui em discussão se logrará impedir que a reputação
profissional da requerente fique irreversivelmente afectada - visto que, um
despacho da autoria do Conselho de Administração da Requerida que determina a
sua imediata demissão é lesivo e atentatório da sua esfera jurídica pessoal,
mais concretamente, do seu bom nome profissional -, bem como ao entendimento de
que, da execução desta decisão administrativa resultam, inevitavelmente,
prejuízos de natureza moral decorrentes da afectação da imagem e bom nome da
requerente, que acarretam sua humilhação e perda de reputação perante os
colegas, pacientes e alunos, acarretando angústia trazida pelo sentimento de
injustiça, impõe-se referir que a requerente encontra-se afastada do serviço de
otorrinolaringologia do requerido e da Faculdade de Medicina há mais de 5 anos.
O que quer dizer que, não só não possui pacientes perante quem deva defender a
sua reputação, como igualmente não contacta com alunos de Medicina. Com efeito,
dimana claramente do probatório que a requerente não exerce prática clínica ou
docência há mais de 5 anos - destaca-se que dos autos não consta qualquer
alegação ou demonstração de que a requerente continue a exercer a actividade
médica ou a docência noutros estabelecimentos -, o que indicia um alheamento
quer da requerente quanto a eventuais pacientes e alunos, quer destes para com
a requerente.
Sendo assim, não se vislumbra como pode ser afectada a
reputação da requerente, ou de que modo é que a imagem de estabilidade,
seriedade, credibilidade, perante pacientes, colegas e demais pessoal
hospitalar é posta em causa. E o mesmo se pode afirmar no que respeita à
reclamada formulação de um juízo de censura vexatório e desprestigiante e com
efeito estigmatizante, bem como à circunstância de não poder prosseguir com o
Doutoramento na área da Medicina, dado que, nesta parte, não cuida de
demonstrar a impossibilidade de prossecução do mesmo.
Desta feita, não se verifica, pelas razões enunciadas,
qualquer prejuízo de difícil reparação ou situação de facto consumado, pelo
que, não se verifica o requisito enunciado no art.º 120º, n.º 1, al. b) do
CPTA, relativo ao periculum in mora».
Esta análise, fundamentação e decisão não comportam em si,
qualquer contradição, mostrando-se, ao invés, bem alicerçada, rebatendo cada um
dos argumentos apresentados pela recorrente [e que agora são repetidos nesta
sede de recurso].
É que a recorrente continua a confundir factos, com
conjecturas que ela própria elabora e, talvez, só por isso, encontre
contradição no decidido e supra transcrito, esclarecendo-se, desde já, que nada
é alegado de concreto que permita concluir, num juízo de prognose que se
verifique fundado receio de facto consumado ou prejuízos de difícil reparação,
salientando-se apenas que a interpretação feita dos artºs 14º e 15º do DL nº
233/2005 de 29/12 se mostra correcta, uma vez que, fazendo a recorrente parte
do quadro residual, não poderá ver a sua vaga ocupada por outrem [extingue-se
apenas pela vacatura, o que significa que nada impede que a recorrente venha a
ser reposicionada se assim se decidir na acção principal].
E, se por um lado, os demais factos alegados não se mostram
suficientes para integrar estes requisitos, designadamente, os prejuízos de
difícil reparação, por outro lado, também não se pode produzir prova
testemunhal em relação a factos abstractos e meramente hipotéticos que nunca
justificariam o preenchimento dos mesmos, como alegadamente, parece pretender a
recorrente.
Atento o exposto e porque não se justificam quaisquer outras
considerações, mantém-se, na íntegra, o decidido a este respeito na decisão
recorrida.
Finalmente, quanto à violação do disposto no nº 2 do artº
120º do CPTA, mais uma vez, é patente a falta de razão da recorrente, uma vez
que, a ponderação de interesses ali prevista, pressupõe o preenchimento, neste
caso concreto, do disposto na al. b) do mesmo normativo, o que, como vimos, não
sucedeu.
Daí que, também neste segmento nada há a apontar à decisão
recorrida, inexistindo, portanto, a alegada omissão do conhecimento deste
requisito.
*
3 - DECISÃO:
Nestes termos, acordam, em conferência, os juízes deste
Tribunal em negar provimento ao recurso.
Custas a cargo da recorrente.
Notifique.
DN.
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido
revisto e rubricado pela relatora (cfr. artº 138º, nº 5 do CPC “ex vi” artº 1º,
do CPTA).
Porto, 13 de Janeiro de 2012
Ass. Maria do Céu Neves
Ass. Carlos Carvalho
Ass. José Veloso
Rita Mourato Villaverde
nº17523
Sub-turma2