Europeização do Contencioso
Administrativo
Em Portugal, o tema do Direito Administrativo europeu remonta ao prof. Dr. Marcelo Caetano embora não fosse referido com essa expressão. Inicialmente houve uma “europeização” dos direitos fundamentais fomentada pela criação das Comunidades Europeias e pela crescente harmonização que incidia especialmente sobre matérias económicas. Com o tratado de Maastricht e com a criação da União Europeia propriamente dita houve um aumento da pressão que o Direito da União exercia sobre o direito interno dos estados para que estes se adaptassem àquele e passou a falar-se de europeização ao invés de comunitarização. Esta questão, não meramente terminológica, justifica-se uma vez que a União Europeia possuía mais dois pilares para além do comunitário: o da política externa e de segurança comum e cooperação de justiça e assuntos internos. O alargamento das Comunidades Europeias a matérias não económicas fez com que a europeização dos direitos estaduais passasse a significar, para além de que os direitos nacionais tinham de se adaptar ao direito da União, que o Direito Europeu penetrava nos sistemas jurídicos estaduais.
Em Portugal, o tema do Direito Administrativo europeu remonta ao prof. Dr. Marcelo Caetano embora não fosse referido com essa expressão. Inicialmente houve uma “europeização” dos direitos fundamentais fomentada pela criação das Comunidades Europeias e pela crescente harmonização que incidia especialmente sobre matérias económicas. Com o tratado de Maastricht e com a criação da União Europeia propriamente dita houve um aumento da pressão que o Direito da União exercia sobre o direito interno dos estados para que estes se adaptassem àquele e passou a falar-se de europeização ao invés de comunitarização. Esta questão, não meramente terminológica, justifica-se uma vez que a União Europeia possuía mais dois pilares para além do comunitário: o da política externa e de segurança comum e cooperação de justiça e assuntos internos. O alargamento das Comunidades Europeias a matérias não económicas fez com que a europeização dos direitos estaduais passasse a significar, para além de que os direitos nacionais tinham de se adaptar ao direito da União, que o Direito Europeu penetrava nos sistemas jurídicos estaduais.
Após a europeização dos Direitos Constitucionais dos Estados surgiu a europeização nomeadamente do Direito Administrativo
já que havia o dever de os estados aplicarem o Direito da União como sua fonte
interna e com as inerentes características. A repercussão deste acontecimento
no Contencioso Administrativo manifesta-se em questões como a função do
Contencioso Administrativo e o seu âmbito, os poderes de cognição do juiz
administrativo, o controlo judicial do poder discricionário, de entre outros.
Com o surgimento de fontes europeias relevantes em matéria de Contencioso Administrativo
tem vindo nos últimos tempos a intensificar-se a europeização.
No entendimento do prof. Dr. Vasco
Pereira da Silva, o fenómeno da europeização
tem uma dupla vertente: a criação de um Direito Administrativo ao nível europeu
e a convergência dos sistemas de Direito Administrativo dos estados-membros da
União Europeia. Salienta ainda o ilustre professor que há uma “dependência
administrativa do Direito Europeu” e uma “dependência europeia do Direito Administrativo”
na medida em que o Direito Europeu só é passível de concretização através do
Direito Administrativo e a “introspecção” ou penetração do Direito Europeu nos
ordenamentos nacionais tem conduzido a uma aproximação dos Direitos Administrativos
vigentes na Europa. Concluímos então que os Direitos Administrativos Europeus
não estão sujeitos apenas a influências internas mas também a influências por
parte da União Europeia que se manifesta nomeadamente na circunstância de os
tribunais administrativos serem, várias vezes, chamados a resolver litígios que
envolvem questões de Direito Europeu.
Um dos instrumentos que mais tem
contribuído para a europeização é a
concessão de providências cautelares pelos tribunais estaduais para assegurar a
tutela efectiva dos direitos subjectivos baseados no direito comunitário,
figura que deve a sua criação à jurisprudência do Tribunal de Justiça[1].
Em Portugal, só após a reforma de
2004 surgiu um Processo Administrativo destinado à protecção plena e efectiva
dos direitos dos particulares e que se pode dizer integrado na lógica de europeização que já se vinha vivendo em
outros estados-membros tal como a Alemanha, a França ou a Itália.
A europeização pode suscitar problemas relevantes que convém
analisar:
·
Quando há invocação perante um tribunal
nacional da invalidade de uma norma ou de um acto de Direito Europeu como devem
os tribunais nacionais decidir? O juiz nacional não tem competência para
declarar a nulidade ou anular esse acto dado o princípio da separação entre a
jurisdição nacional e a europeia mas se pelo menos tiver dúvidas sobre ela e
entender que a resposta é condição da boa resolução do litígio está obrigado, mesmo
que da sentença do tribunal em causa caiba recurso jurisdicional no âmbito do
direito interno, a suscitar perante o TJ a questão prejudicial de apreciação de
invalidade do acto de Direito Europeu – caso Foto-Frost[2] – apesar de não estar expressamente
previsto no Tratado os estados membros seguem-no pacificamente. A justificação
avançada para esta solução é a da aspiração a uma uniformidade de aplicação do
Direito Europeu e também por razões de segurança jurídica.
·
Pode ainda suscitar-se a questão da possível
violação do princípio da igualdade: para assegurar a efectividade do Direito
Europeu, este tem de moldar os direitos nacionais. Não podem os particulares
ficar sujeitos a condições mais desfavoráveis no âmbito da aplicação do direito
interno do que resultaria da aplicação do Direito Europeu. Como exemplo podemos
indicar o caso da responsabilidade extracontratual do estado por incumprimento
do Direito Europeu. É sabido que o TJ admite a responsabilidade extracontratual
dos estados gerada por actos não normativos nomeadamente os administrativos e
os jurisdicionais. O critério para a efectivação da reparação é a reposição da
situação hipotética actual e deve também ser esse o critério adoptado quando a
violação se dá apenas no plano interno. Está previsto no 4º/2 a), 2ª parte CPTA
e na lei também não pode ser (nem é!) outro o critério adoptado (art. 3º nº1 da
lei 67/2007). Caso as soluções divergissem poderia gerar-se uma situação de
discriminação negativa quando se aplicasse o direito de fonte interna e poderia,
no limite, levar à discriminação de nacionais perante não nacionais.
É ainda importante ressalvar que
o fenómeno da europeização do
Direito Administrativo não pode ser interpretado como destruindo as
especificidades que os direitos nacionais apresentam. Esta solução é imposta
pelo princípio da subsidiariedade (previsto no Tratado da União Europeia, na
versão resultante do Tratado de Lisboa assim como nas anteriores). Os estados-membros
devem ser capazes de criar um Direito Administrativo nacional que dê plena
eficácia ao Direito Europeu na respectiva ordem interna e no tocante ao Contencioso
Administrativo, nomeadamente através de uma justiça célere, de qualidade e
eficaz. Se não o conseguirem fazer o Direito Europeu terá de se substituir aos Direitos
Administrativos nacionais.
Começa a discutir-se o nascimento
de um Direito Administrativo global que já vai em estado adiantado no que diz
respeito à OMC mas que ainda não pode ser generalizado.
[1] Tomando
como exemplo o acórdão Antonissen de
20 de Fevereiro de 2007. – Processo C-344/95.
[2]
Acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Outubro
de 1987. – FOTO-FROST contra HAUPTZOLLAMT LUEBECK- OST. – pedido de decisão
prejudicial apreciado pelo Finanzgericht Hamburg. – Incompetência dos tribunais
nacionais para declararem a invalidade dos actos comunitários – Processo
314/85.
Bibliografia
· SILVA, Vasco Pereira da, O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise, 2ª edição, Almedina, 2009, págs.106 a 150.
· Quadros, Fausto, A europeização do Contencioso Administrativo in Estudos em Homenagem ao prof. Dr. Marcello Caetano no centenário do seu nascimento, 2006.
Leonor Catarina Costa Nunes, 17394
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