quarta-feira, 21 de março de 2012


Responsabilidade extractontual do Estado. Omissão Legislativa. Tribunal Competente
 
Responsabilidade extracontratual do Estado
Omissão Legislativa
Tribunal Competente
____________ 
Processo n.º 699/07-5
Secção: 5ª

 
CONTRA-ALEGAÇÕES
DO
ESTADO PORTUGUÊS
                                                                              EX.MOS SENHORES
                                                                              JUÍZES CONSELHEIROS
Recorre a autora Maria do acórdão de fls. 182/192, proferido em 2007.11.26, no qual se julgou improcedente a sua Apelação e se confirmou a decisão da 1ª instância, na qual se absolveu o réu Estado Português do pedido contra ele formulado [fls.116/121].
Inconformado interpôs, agora, recurso de revista [fls. 196, 198 e 201/214].
 
///
           
            Neste recurso levanta-se a seguinte questão:
 
-          O Estado Português não cumpriu a Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, por, à data do acidente, a não ter transposto devida, correcta e adequadamente para o direito interno [conclusões 1ª/15ª de fls. 212/213].
 
///
 
            QUESTÃO PRÉVIA:
 
            Incompetência do Tribunal Cível em razão da matéria:
 
            Neste sentido decidiu o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.05.24, proferido no processo n.º 581/07-1, no qual foi Relator o Ex.mo Conselheiro Paulo Sá [não publicado, segundo cremos].
            E foi proferido em processo que trata da mesma questão, ou seja, não cumprimento pelo Estrado Português da Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983 por a não ter transposto, para o direito interno, de forma adequada e correcta.
            Por tal motivo iremos segui-lo de perto.
            Ora, a questão da competência material foi apenas apreciada nestes autos, em termos tabelares, no despacho saneador, como decorre de fls. 116 ["o tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia"] - nosso sublinhado.
            Como se refere no citado acórdão "tal declaração genérica não faz caso julgado formal, como resulta do disposto no artigo 510º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e já resultava do entendimento sufragado no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 27.11.1991, publicado no Diário da República, Iª Série, de 11.1.92, que interpretou a norma do artigo 104. °, n.º 2, do referido código, norma hoje revogada (pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12.12), mas cujo comando foi acolhido no artigo 510. °, n.º 3, citado.
Neste sentido veja-se, por todos, o acórdão do Tribunal de Conflitos de 2.11.2006, processo n.º 06/06, in www.dqsi.pt.
É, pois, questão que este tribunal pode e deve conhecer oficiosamente, porquanto não se está perante regras de "competência que apenas respeitem aos tribunais judiciais" nem existe "sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa" (artigo 102º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)".
Ora, a presente acção foi instaurada em 2006.01.02 - carimbo aposto a fls. 2 - e foi distribuída à 4ª Vara Cível, 2ª Secção, do Porto.
Acresce que, como já se disse, o que aqui está em causa é a responsabilidade extracontratual do Estado por omissão legislativa (não transposição adequada de Directiva Comunitária).
Como é sabido, são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional [artigo 66.º do Código de Processo Civil]".
Acresce que à data da instauração da presente acção - 2006.01.02 - vigorava já a Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro [rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 14/2002, de 20 de Março, e alterada pelas Leis nºs 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, e 107-D/2003, de 31 de Dezembro], que aprovou o novo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o qual entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2004 - artigo 9º, da Lei n.º 13/2002.
De acordo com o artigo 2º, n.º 1, da mesma Lei não se aplicava ele aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor.
Como o presente processo foi instaurado em 2006, o referido Estatuto é-lhe aplicável e dele resulta que é da competência dos tribunais administrativos e fiscais a apreciação das "questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa" [alínea g), do n.º1, do artigo 4. °, do ETAF].
No citado acórdão refere-se que "MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, "O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos", 4ª edição, revista e actualizada, Almedina, Coimbra, págs. 99, salienta que: "a) Compete à jurisdição administrativa apreciar toda e qualquer questão de responsabilidade civil extracontratual emergente da actuação de órgãos da Administração Pública. É o que claramente decorre do artigo 4º, nº 1, alínea g) do ETAF, que confere aos tribunais administrativos uma competência genérica para apreciar as questões de responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público".
E, mais adiante reafirma: "Todos os litígios emergentes de actuações da Administração Pública que constituam pessoas colectivas de direito público em responsabilidade civil extracontratual pertencem, portanto, à competência dos tribunais administrativos", invocando no mesmo sentido, em nota de rodapé (65) JOÃO CAUPERS, "Introdução ao Direito Administrativo", 7ª edição, Lisboa, 2003, pág. 265.
 Também SANTOS SERRA, Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, numa intervenção subordinada ao tema "A Nova Justiça Administrativa e Fiscal Portuguesa", proferida no âmbito da IV Assembleia da Associação Ibero-americana dos Tribunais de Justiça Fiscal e Administrativa, Cidade do México, 28 de Agosto de 2006 (inserta em "Intervenções" [2003-2006], STA, Lisboa, 2006, p. 205 e ss.), refere, depois de descrever a evolução do nosso contencioso administrativo e tendo em mente o actual ETAF que "existindo agora uma cláusula positiva de demarcação da competência da jurisdição administrativa, a fronteira entre justiça administrativa e a dita justiça comum sai clarificada, e os tribunais administrativos, esses, ganham um espaço privativo de actuação - um conjunto nuclear de tarefas que os torna, finalmente, verdadeiros e próprios tribunais, compondo uma jurisdição administrativa e fiscal autónoma, em tudo equivalente à chamada jurisdição comum, inclusive no nível de garantias prestadas a quem se lhe dirige em busca de protecção.
Assim, e para dar apenas um exemplo, no plano da responsabilidade civil extracontratual, esse espaço de actuação inclui hoje: 1) todas as questões de responsabilidade civil extracontratual da Administração, independentemente dessa responsabilidade emergir de uma actuação de gestão pública ou de gestão privada; 2) as questões em que haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa".
De igual modo, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA "Código do Processo nos Tribunais Administrativos e Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais Anotados", Almedina, Coimbra, vol. I, p. 59) sustentam que "segundo a actual redacção desta alínea g) - posta pela Lei n.º 107-D/2003 (de 31.XII) com o propósito de esclarecer pela positiva as dúvidas que a redacção inicial do preceito suscitava em relação à inclusão no âmbito da jurisdição administrativa das acções de responsabilidade por actos de gestão privada das pessoas colectivas de direito público -, pertencem à jurisdição administrativa, em primeiro lugar, as "questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual" dessas pessoas."
E mais adiante: "(...) diremos então (respeitando a intenção da lei atrás referida e a vontade expressa na "Exposição de Motivos" da Proposta de Lei que veio dar origem ao ETAF) que, sempre que essas pessoas devam responder extracontratualmente por prejuízos causados a outrem, o julgamento da respectiva causa pertencerá à jurisdição administrativa, independentemente da qualificação do acto lesivo como acto de gestão pública ou de gestão privada".
Finalmente, Sérvulo Correia, "Direito do Contenciosa Administrativo I, pág. 714", afirma que "no tocante à responsabilidade civil extracontratual, o ETAF adoptou critérios distintos para determinar o âmbito da jurisdição administrativa. Em relação às pessoas colectivas públicas e aos respectivos titulares de órgãos, funcionários, agentes e demais servidores públicos, privilegiou um factor de incidência subjectiva. Independentemente da natureza jurídica pública ou privada da situação de responsabilidade, esta cabe no âmbito da jurisdição exercida pelos tribunais administrativos só porque é pública a personalidade da entidade alegadamente responsável ou da entidade em que se integram os titulares de órgãos ou servidores públicos".
Com a consagração deste critério no domínio da responsabilidade civil extracontratual (que não também da contratual) o legislador pretendeu acabar com a morosidade processual resultante da determinação do tribunal competente, pois a distinção entre actos de gestão pública e actos de gestão privada nem sempre foi fácil de fazer pelos tribunais administrativos e tribunais cíveis, originando inúmeros recursos para o Tribunal de Conflitos.
Inserindo-se a questão suscitada na responsabilidade civil extracontratual do Estado resultante da função legislativa (omissão do dever de legislar), estamos perante um caso nítido de competência material dos tribunais administrativos.
Neste sentido já decidiram o acórdão do Tribunal dos Conflitos de 26 de Outubro de 2006, Processo n.º 018/06 e o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12 de Fevereiro de 2007, processo n.º 0656180, ambos em www.dgsi.pt: embora não incidindo sobre a responsabilidade resultante da função legislativa, veja-se, também, o recente acórdão deste Tribunal de 8 de Maio de 2007, processo n.º 07A1004, igualmente disponível na base de dados supra referida[1].
O que implica que se decrete a absolvição do Réu da instância, nos termos do artigo 105º, n.º 1, do Código de Processo Civil" - nosso realce e sublinhado.
No mencionado acórdão julgou-se materialmente incompetentes os Tribunais Cíveis para conhecer do pedido, ali em causa, e competentes os tribunais administrativos, determinando-se, em consequência, a absolvição do Estado da instância.
Invoca-se, aqui e agora, a incompetência dos Tribunais Cíveis, em razão da matéria, para conhecer da presente acção.
Consequentemente, deve o réu "Estado Português" ser absolvido da instância, nos termos dos artigos 4º, n.º 1, alínea g), do ETAF, 510º, n.º 3, 102º, nºs 1 e 2, 66º, 105º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, e 2º, n.º 1, e 9º, estes da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro.
///
Termos em que julgando-se materialmente incompetentes os Tribunais Cíveis para conhecer do presente pedido e competentes os Tribunais Administrativos e, consequentemente, absolvendo-se o réu "Estado Português" da instância, se fará
 
                                                                                                            JUSTIÇA
 

O PROCURADOR-GERAL ADJUNTO

(João Fernando Ferreira Pinto)
(05.03.2008)
Responsabilidade extractontual do Estado. Omissão Legislativa. Tribunal Competente
 
Responsabilidade extracontratual do Estado
Omissão Legislativa
Tribunal Competente
____________ 
Processo n.º 699/07-5
Secção: 5ª

 
CONTRA-ALEGAÇÕES
DO
ESTADO PORTUGUÊS
                                                                              EX.MOS SENHORES
                                                                              JUÍZES CONSELHEIROS
Recorre a autora Maria do acórdão de fls. 182/192, proferido em 2007.11.26, no qual se julgou improcedente a sua Apelação e se confirmou a decisão da 1ª instância, na qual se absolveu o réu Estado Português do pedido contra ele formulado [fls.116/121].
Inconformado interpôs, agora, recurso de revista [fls. 196, 198 e 201/214].
 
///
           
            Neste recurso levanta-se a seguinte questão:
 
-          O Estado Português não cumpriu a Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, por, à data do acidente, a não ter transposto devida, correcta e adequadamente para o direito interno [conclusões 1ª/15ª de fls. 212/213].
 
///
 
            QUESTÃO PRÉVIA:
 
            Incompetência do Tribunal Cível em razão da matéria:
 
            Neste sentido decidiu o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.05.24, proferido no processo n.º 581/07-1, no qual foi Relator o Ex.mo Conselheiro Paulo Sá [não publicado, segundo cremos].
            E foi proferido em processo que trata da mesma questão, ou seja, não cumprimento pelo Estrado Português da Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983 por a não ter transposto, para o direito interno, de forma adequada e correcta.
            Por tal motivo iremos segui-lo de perto.
            Ora, a questão da competência material foi apenas apreciada nestes autos, em termos tabelares, no despacho saneador, como decorre de fls. 116 ["o tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia"] - nosso sublinhado.
            Como se refere no citado acórdão "tal declaração genérica não faz caso julgado formal, como resulta do disposto no artigo 510º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e já resultava do entendimento sufragado no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 27.11.1991, publicado no Diário da República, Iª Série, de 11.1.92, que interpretou a norma do artigo 104. °, n.º 2, do referido código, norma hoje revogada (pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12.12), mas cujo comando foi acolhido no artigo 510. °, n.º 3, citado.
Neste sentido veja-se, por todos, o acórdão do Tribunal de Conflitos de 2.11.2006, processo n.º 06/06, in www.dqsi.pt.
É, pois, questão que este tribunal pode e deve conhecer oficiosamente, porquanto não se está perante regras de "competência que apenas respeitem aos tribunais judiciais" nem existe "sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa" (artigo 102º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)".
Ora, a presente acção foi instaurada em 2006.01.02 - carimbo aposto a fls. 2 - e foi distribuída à 4ª Vara Cível, 2ª Secção, do Porto.
Acresce que, como já se disse, o que aqui está em causa é a responsabilidade extracontratual do Estado por omissão legislativa (não transposição adequada de Directiva Comunitária).
Como é sabido, são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional [artigo 66.º do Código de Processo Civil]".
Acresce que à data da instauração da presente acção - 2006.01.02 - vigorava já a Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro [rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 14/2002, de 20 de Março, e alterada pelas Leis nºs 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, e 107-D/2003, de 31 de Dezembro], que aprovou o novo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o qual entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2004 - artigo 9º, da Lei n.º 13/2002.
De acordo com o artigo 2º, n.º 1, da mesma Lei não se aplicava ele aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor.
Como o presente processo foi instaurado em 2006, o referido Estatuto é-lhe aplicável e dele resulta que é da competência dos tribunais administrativos e fiscais a apreciação das "questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa" [alínea g), do n.º1, do artigo 4. °, do ETAF].
No citado acórdão refere-se que "MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, "O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos", 4ª edição, revista e actualizada, Almedina, Coimbra, págs. 99, salienta que: "a) Compete à jurisdição administrativa apreciar toda e qualquer questão de responsabilidade civil extracontratual emergente da actuação de órgãos da Administração Pública. É o que claramente decorre do artigo 4º, nº 1, alínea g) do ETAF, que confere aos tribunais administrativos uma competência genérica para apreciar as questões de responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público".
E, mais adiante reafirma: "Todos os litígios emergentes de actuações da Administração Pública que constituam pessoas colectivas de direito público em responsabilidade civil extracontratual pertencem, portanto, à competência dos tribunais administrativos", invocando no mesmo sentido, em nota de rodapé (65) JOÃO CAUPERS, "Introdução ao Direito Administrativo", 7ª edição, Lisboa, 2003, pág. 265.
 Também SANTOS SERRA, Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, numa intervenção subordinada ao tema "A Nova Justiça Administrativa e Fiscal Portuguesa", proferida no âmbito da IV Assembleia da Associação Ibero-americana dos Tribunais de Justiça Fiscal e Administrativa, Cidade do México, 28 de Agosto de 2006 (inserta em "Intervenções" [2003-2006], STA, Lisboa, 2006, p. 205 e ss.), refere, depois de descrever a evolução do nosso contencioso administrativo e tendo em mente o actual ETAF que "existindo agora uma cláusula positiva de demarcação da competência da jurisdição administrativa, a fronteira entre justiça administrativa e a dita justiça comum sai clarificada, e os tribunais administrativos, esses, ganham um espaço privativo de actuação - um conjunto nuclear de tarefas que os torna, finalmente, verdadeiros e próprios tribunais, compondo uma jurisdição administrativa e fiscal autónoma, em tudo equivalente à chamada jurisdição comum, inclusive no nível de garantias prestadas a quem se lhe dirige em busca de protecção.
Assim, e para dar apenas um exemplo, no plano da responsabilidade civil extracontratual, esse espaço de actuação inclui hoje: 1) todas as questões de responsabilidade civil extracontratual da Administração, independentemente dessa responsabilidade emergir de uma actuação de gestão pública ou de gestão privada; 2) as questões em que haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa".
De igual modo, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA "Código do Processo nos Tribunais Administrativos e Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais Anotados", Almedina, Coimbra, vol. I, p. 59) sustentam que "segundo a actual redacção desta alínea g) - posta pela Lei n.º 107-D/2003 (de 31.XII) com o propósito de esclarecer pela positiva as dúvidas que a redacção inicial do preceito suscitava em relação à inclusão no âmbito da jurisdição administrativa das acções de responsabilidade por actos de gestão privada das pessoas colectivas de direito público -, pertencem à jurisdição administrativa, em primeiro lugar, as "questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual" dessas pessoas."
E mais adiante: "(...) diremos então (respeitando a intenção da lei atrás referida e a vontade expressa na "Exposição de Motivos" da Proposta de Lei que veio dar origem ao ETAF) que, sempre que essas pessoas devam responder extracontratualmente por prejuízos causados a outrem, o julgamento da respectiva causa pertencerá à jurisdição administrativa, independentemente da qualificação do acto lesivo como acto de gestão pública ou de gestão privada".
Finalmente, Sérvulo Correia, "Direito do Contenciosa Administrativo I, pág. 714", afirma que "no tocante à responsabilidade civil extracontratual, o ETAF adoptou critérios distintos para determinar o âmbito da jurisdição administrativa. Em relação às pessoas colectivas públicas e aos respectivos titulares de órgãos, funcionários, agentes e demais servidores públicos, privilegiou um factor de incidência subjectiva. Independentemente da natureza jurídica pública ou privada da situação de responsabilidade, esta cabe no âmbito da jurisdição exercida pelos tribunais administrativos só porque é pública a personalidade da entidade alegadamente responsável ou da entidade em que se integram os titulares de órgãos ou servidores públicos".
Com a consagração deste critério no domínio da responsabilidade civil extracontratual (que não também da contratual) o legislador pretendeu acabar com a morosidade processual resultante da determinação do tribunal competente, pois a distinção entre actos de gestão pública e actos de gestão privada nem sempre foi fácil de fazer pelos tribunais administrativos e tribunais cíveis, originando inúmeros recursos para o Tribunal de Conflitos.
Inserindo-se a questão suscitada na responsabilidade civil extracontratual do Estado resultante da função legislativa (omissão do dever de legislar), estamos perante um caso nítido de competência material dos tribunais administrativos.
Neste sentido já decidiram o acórdão do Tribunal dos Conflitos de 26 de Outubro de 2006, Processo n.º 018/06 e o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12 de Fevereiro de 2007, processo n.º 0656180, ambos em www.dgsi.pt: embora não incidindo sobre a responsabilidade resultante da função legislativa, veja-se, também, o recente acórdão deste Tribunal de 8 de Maio de 2007, processo n.º 07A1004, igualmente disponível na base de dados supra referida[1].
O que implica que se decrete a absolvição do Réu da instância, nos termos do artigo 105º, n.º 1, do Código de Processo Civil" - nosso realce e sublinhado.
No mencionado acórdão julgou-se materialmente incompetentes os Tribunais Cíveis para conhecer do pedido, ali em causa, e competentes os tribunais administrativos, determinando-se, em consequência, a absolvição do Estado da instância.
Invoca-se, aqui e agora, a incompetência dos Tribunais Cíveis, em razão da matéria, para conhecer da presente acção.
Consequentemente, deve o réu "Estado Português" ser absolvido da instância, nos termos dos artigos 4º, n.º 1, alínea g), do ETAF, 510º, n.º 3, 102º, nºs 1 e 2, 66º, 105º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, e 2º, n.º 1, e 9º, estes da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro.
///
Termos em que julgando-se materialmente incompetentes os Tribunais Cíveis para conhecer do presente pedido e competentes os Tribunais Administrativos e, consequentemente, absolvendo-se o réu "Estado Português" da instância, se fará
 
                                                                                                            JUSTIÇA
 

O PROCURADOR-GERAL ADJUNTO

(João Fernando Ferreira Pinto)
(05.03.2008)
Responsabilidade extractontual do Estado. Omissão Legislativa. Tribunal Competente



 
Responsabilidade extracontratual do Estado
Omissão Legislativa
Tribunal Competente
____________ 
Processo n.º 699/07-5
Secção: 5ª
 
CONTRA-ALEGAÇÕES
DO
ESTADO PORTUGUÊS
                                                                              EX.MOS SENHORES
                                                                              JUÍZES CONSELHEIROS
Recorre a autora Maria do acórdão de fls. 182/192, proferido em 2007.11.26, no qual se julgou improcedente a sua Apelação e se confirmou a decisão da 1ª instância, na qual se absolveu o réu Estado Português do pedido contra ele formulado [fls.116/121].
Inconformado interpôs, agora, recurso de revista [fls. 196, 198 e 201/214].
 
///
           
            Neste recurso levanta-se a seguinte questão:
 
-          O Estado Português não cumpriu a Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983, por, à data do acidente, a não ter transposto devida, correcta e adequadamente para o direito interno [conclusões 1ª/15ª de fls. 212/213].
 
///
 
            QUESTÃO PRÉVIA:
 
            Incompetência do Tribunal Cível em razão da matéria:
 
            Neste sentido decidiu o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2007.05.24, proferido no processo n.º 581/07-1, no qual foi Relator o Ex.mo Conselheiro Paulo Sá [não publicado, segundo cremos].
            E foi proferido em processo que trata da mesma questão, ou seja, não cumprimento pelo Estrado Português da Segunda Directiva 84/5/CEE do Conselho, de 30 de Dezembro de 1983 por a não ter transposto, para o direito interno, de forma adequada e correcta.
            Por tal motivo iremos segui-lo de perto.
            Ora, a questão da competência material foi apenas apreciada nestes autos, em termos tabelares, no despacho saneador, como decorre de fls. 116 ["o tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia"] - nosso sublinhado.
            Como se refere no citado acórdão "tal declaração genérica não faz caso julgado formal, como resulta do disposto no artigo 510º, n.º 3, do Código de Processo Civil, e já resultava do entendimento sufragado no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência de 27.11.1991, publicado no Diário da República, Iª Série, de 11.1.92, que interpretou a norma do artigo 104. °, n.º 2, do referido código, norma hoje revogada (pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95 de 12.12), mas cujo comando foi acolhido no artigo 510. °, n.º 3, citado.
Neste sentido veja-se, por todos, o acórdão do Tribunal de Conflitos de 2.11.2006, processo n.º 06/06, in www.dqsi.pt.
É, pois, questão que este tribunal pode e deve conhecer oficiosamente, porquanto não se está perante regras de "competência que apenas respeitem aos tribunais judiciais" nem existe "sentença com trânsito em julgado proferida sobre o fundo da causa" (artigo 102º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil)".
Ora, a presente acção foi instaurada em 2006.01.02 - carimbo aposto a fls. 2 - e foi distribuída à 4ª Vara Cível, 2ª Secção, do Porto.
Acresce que, como já se disse, o que aqui está em causa é a responsabilidade extracontratual do Estado por omissão legislativa (não transposição adequada de Directiva Comunitária).
Como é sabido, são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional [artigo 66.º do Código de Processo Civil]".
Acresce que à data da instauração da presente acção - 2006.01.02 - vigorava já a Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro [rectificada pela Declaração de Rectificação n.º 14/2002, de 20 de Março, e alterada pelas Leis nºs 4-A/2003, de 19 de Fevereiro, e 107-D/2003, de 31 de Dezembro], que aprovou o novo Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, o qual entrou em vigor em 1 de Janeiro de 2004 - artigo 9º, da Lei n.º 13/2002.
De acordo com o artigo 2º, n.º 1, da mesma Lei não se aplicava ele aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor.
Como o presente processo foi instaurado em 2006, o referido Estatuto é-lhe aplicável e dele resulta que é da competência dos tribunais administrativos e fiscais a apreciação das "questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa" [alínea g), do n.º1, do artigo 4. °, do ETAF].
No citado acórdão refere-se que "MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, "O Novo Regime do Processo nos Tribunais Administrativos", 4ª edição, revista e actualizada, Almedina, Coimbra, págs. 99, salienta que: "a) Compete à jurisdição administrativa apreciar toda e qualquer questão de responsabilidade civil extracontratual emergente da actuação de órgãos da Administração Pública. É o que claramente decorre do artigo 4º, nº 1, alínea g) do ETAF, que confere aos tribunais administrativos uma competência genérica para apreciar as questões de responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público".
E, mais adiante reafirma: "Todos os litígios emergentes de actuações da Administração Pública que constituam pessoas colectivas de direito público em responsabilidade civil extracontratual pertencem, portanto, à competência dos tribunais administrativos", invocando no mesmo sentido, em nota de rodapé (65) JOÃO CAUPERS, "Introdução ao Direito Administrativo", 7ª edição, Lisboa, 2003, pág. 265.
 Também SANTOS SERRA, Juiz Conselheiro Presidente do Supremo Tribunal Administrativo, numa intervenção subordinada ao tema "A Nova Justiça Administrativa e Fiscal Portuguesa", proferida no âmbito da IV Assembleia da Associação Ibero-americana dos Tribunais de Justiça Fiscal e Administrativa, Cidade do México, 28 de Agosto de 2006 (inserta em "Intervenções" [2003-2006], STA, Lisboa, 2006, p. 205 e ss.), refere, depois de descrever a evolução do nosso contencioso administrativo e tendo em mente o actual ETAF que "existindo agora uma cláusula positiva de demarcação da competência da jurisdição administrativa, a fronteira entre justiça administrativa e a dita justiça comum sai clarificada, e os tribunais administrativos, esses, ganham um espaço privativo de actuação - um conjunto nuclear de tarefas que os torna, finalmente, verdadeiros e próprios tribunais, compondo uma jurisdição administrativa e fiscal autónoma, em tudo equivalente à chamada jurisdição comum, inclusive no nível de garantias prestadas a quem se lhe dirige em busca de protecção.
Assim, e para dar apenas um exemplo, no plano da responsabilidade civil extracontratual, esse espaço de actuação inclui hoje: 1) todas as questões de responsabilidade civil extracontratual da Administração, independentemente dessa responsabilidade emergir de uma actuação de gestão pública ou de gestão privada; 2) as questões em que haja lugar a responsabilidade civil extracontratual das pessoas colectivas de direito público, incluindo a resultante do exercício da função jurisdicional e da função legislativa".
De igual modo, MÁRIO ESTEVES DE OLIVEIRA e RODRIGO ESTEVES DE OLIVEIRA "Código do Processo nos Tribunais Administrativos e Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais Anotados", Almedina, Coimbra, vol. I, p. 59) sustentam que "segundo a actual redacção desta alínea g) - posta pela Lei n.º 107-D/2003 (de 31.XII) com o propósito de esclarecer pela positiva as dúvidas que a redacção inicial do preceito suscitava em relação à inclusão no âmbito da jurisdição administrativa das acções de responsabilidade por actos de gestão privada das pessoas colectivas de direito público -, pertencem à jurisdição administrativa, em primeiro lugar, as "questões em que, nos termos da lei, haja lugar a responsabilidade civil extracontratual" dessas pessoas."
E mais adiante: "(...) diremos então (respeitando a intenção da lei atrás referida e a vontade expressa na "Exposição de Motivos" da Proposta de Lei que veio dar origem ao ETAF) que, sempre que essas pessoas devam responder extracontratualmente por prejuízos causados a outrem, o julgamento da respectiva causa pertencerá à jurisdição administrativa, independentemente da qualificação do acto lesivo como acto de gestão pública ou de gestão privada".
Finalmente, Sérvulo Correia, "Direito do Contenciosa Administrativo I, pág. 714", afirma que "no tocante à responsabilidade civil extracontratual, o ETAF adoptou critérios distintos para determinar o âmbito da jurisdição administrativa. Em relação às pessoas colectivas públicas e aos respectivos titulares de órgãos, funcionários, agentes e demais servidores públicos, privilegiou um factor de incidência subjectiva. Independentemente da natureza jurídica pública ou privada da situação de responsabilidade, esta cabe no âmbito da jurisdição exercida pelos tribunais administrativos só porque é pública a personalidade da entidade alegadamente responsável ou da entidade em que se integram os titulares de órgãos ou servidores públicos".
Com a consagração deste critério no domínio da responsabilidade civil extracontratual (que não também da contratual) o legislador pretendeu acabar com a morosidade processual resultante da determinação do tribunal competente, pois a distinção entre actos de gestão pública e actos de gestão privada nem sempre foi fácil de fazer pelos tribunais administrativos e tribunais cíveis, originando inúmeros recursos para o Tribunal de Conflitos.
Inserindo-se a questão suscitada na responsabilidade civil extracontratual do Estado resultante da função legislativa (omissão do dever de legislar), estamos perante um caso nítido de competência material dos tribunais administrativos.
Neste sentido já decidiram o acórdão do Tribunal dos Conflitos de 26 de Outubro de 2006, Processo n.º 018/06 e o acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 12 de Fevereiro de 2007, processo n.º 0656180, ambos em www.dgsi.pt: embora não incidindo sobre a responsabilidade resultante da função legislativa, veja-se, também, o recente acórdão deste Tribunal de 8 de Maio de 2007, processo n.º 07A1004, igualmente disponível na base de dados supra referida[1].
O que implica que se decrete a absolvição do Réu da instância, nos termos do artigo 105º, n.º 1, do Código de Processo Civil" - nosso realce e sublinhado.
No mencionado acórdão julgou-se materialmente incompetentes os Tribunais Cíveis para conhecer do pedido, ali em causa, e competentes os tribunais administrativos, determinando-se, em consequência, a absolvição do Estado da instância.
Invoca-se, aqui e agora, a incompetência dos Tribunais Cíveis, em razão da matéria, para conhecer da presente acção.
Consequentemente, deve o réu "Estado Português" ser absolvido da instância, nos termos dos artigos 4º, n.º 1, alínea g), do ETAF, 510º, n.º 3, 102º, nºs 1 e 2, 66º, 105º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, e 2º, n.º 1, e 9º, estes da Lei n.º 13/2002, de 19 de Fevereiro.
///
Termos em que julgando-se materialmente incompetentes os Tribunais Cíveis para conhecer do presente pedido e competentes os Tribunais Administrativos e, consequentemente, absolvendo-se o réu "Estado Português" da instância, se fará
 
                                                                                                            JUSTIÇA
 
O PROCURADOR-GERAL ADJUNTO
(João Fernando Ferreira Pinto)
(05.03.2008)


Nuno Carvalho
Aluno nº 17913

Sem comentários:

Enviar um comentário