quinta-feira, 24 de maio de 2012


Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte

Processo: 00967/09.3BEBRG
Secção: 1ª Secção - Contencioso Administrativo
Data do Acordão: 11-02-2011
Tribunal: TAF de Braga
Relator: Carlos Luís Medeiros de Carvalho

Descritores: LEGITIMIDADE PROCESSUAL PASSIVA,RESPONSABILIDADE CIVIL,DONO OBRA

EMPREITEIRO
Sumário: I. Inexiste qualquer vínculo de subordinação entre empreiteiro e dono da obra, pelo que aquele, em princípio, responde pelos danos causados a terceiro com a execução das obras.

II. O regime jurídico empreitadas de obras públicas (à data vertido no DL n.º 59/99) não contém qualquer princípio geral de responsabilização do dono da obra pela indemnização dos prejuízos provocados pelo empreiteiro ou subempreiteiro no âmbito da execução do contrato, visto o que existe é, em primeira linha, a responsabilização geral do empreiteiro ou do subempreiteiro, cingindo-se a responsabilidade do dono da obra aos prejuízos provocados por aqueles nas situações em que os vícios da obra resultaram de ordens ou instruções transmitidas pelo fiscal nomeado pelo dono da obra, ou que hajam obtido a sua concordância expressa, ou daquelas outras situações em que tenha havido erros de concepção do projecto imputáveis ao dono da obra e também daquelas situações em que sobre o dono da obra impendam outros deveres legais autónomos em matéria de fiscalização, de sinalização da obra e vias.

III. De igual modo entre o dono da obra e o empreiteiro ou entre este e o subempreiteiro não existe uma qualquer relação de “comissão” no âmbito da qual viesse a ser chamado à colação o regime decorrente do art. 500.º do CC.

IV. Estando-se no âmbito duma acção administrativa comum condenatória para efectivação de responsabilidade civil extracontratual a legitimidade do R. afere-se por na relação substantiva ser o sujeito ou agente responsável sobre o qual incide um alegado direito indemnizatório invocado pelo A., direito este incerto e que se pretende definir ou tornar certo.

V. Nesta situação a legitimidade das partes não está dependente da verificação de pressupostos que se autonomizam do objecto da acção, do seu mérito, pelo que terá a mesma de ser aferida em face da posição relativa das partes face à relação material controvertida tal como a configuraram os AA. na petição inicial.

VI. Encontrando-se a conduta em causa especialmente regulada no referido regime atinente às empreitadas de obras públicas mostra-se errado perspectivar a questão à luz de qualquer outro regime jurídico, nomeadamente do que dimana do art. 1348.º do CC, normativo que tem o seu campo primacial de aplicação no domínio das relações jurídico-privadas e que apenas abrange os danos provocados por desmoronamentos ou deslocações de terras resultado de falta de apoio gerada pela feitura de minas, poços ou escavações o que não acontece no caso vertente.*

* Sumário elaborado pelo Relator 
Data de Entrada: 16-12-2010
Recorrente: B... e M...
Recorrido 1: Município de Caminha
Votação: Unanimidade
Meio Processual: Acção Administrativa Comum - Forma Ordinária (CPTA) - Recurso Jurisdicional
Decisão: Negado provimento ao recurso
Aditamento: 
Parecer Ministério Publico: Não emitiu parecer

1 

Decisão Texto Integral: Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO

B… e M…, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Braga, datada de 28.10.2009, que no âmbito da acção administrativa comum pelos mesmos instaurada contra o MUNICÍPIO DE CAMINHA [na qual peticionavam a condenação deste no pagamento de indemnização a liquidar ulteriormente por alegados danos sofridos na sequência de obra adjudicada pelo R. à empresa empreiteira “C… & C.ª, Ld.ª” consistente na remodelação do edifício conhecido por “Hospital da Santa Casa da Misericórdia” para aí instalar a sede dos seus serviços administrativos] julgou procedente excepção dilatória de ilegitimidade passiva do ente demandado, absolvendo-o da instância.

Formulam os AA., aqui recorrentes jurisdicionais, nas respectivas alegações (cfr. fls. 297 e segs. - paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem:

“...

1.ª O n.º 1, do art. 36.º, do RJEOP, não exclui o dever de o dono da obra responder pelos prejuízos causados a terceiros pelo empreiteiro;

2.ª A garantia a que fica adstrito o empreiteiro por virtude da referida regra, destina-se tão só a assegurar os interesses e direitos do dono da obra na relação contratual inter partes, que não a determinar a exclusão da responsabilidade deste último para com terceiros afectados pela execução da obra;

3.ª O art. 1348.º do Cód. Civil, aliás, já citado na petição, faz impender, precisamente, sobre o proprietário (leia-se dono da obra) a obrigação de indemnizar os proprietários dos prédios vizinhos, pelos prejuízos a estes causados por escavações realizadas por aquele no seu imóvel. O proprietário e não outrem, designadamente, o empreiteiro;

4.ª Não se entendendo que a regra do n.º 1, do art. 36.º do RJEOP determina a exclusão da responsabilidade do ente público perante terceiro, antes garantindo a responsabilidade do empreiteiro perante aquele e, consagrando a última das normas citadas - art. 1348.º do Cód. Civil - a responsabilidade do proprietário que efectue escavações no seu prédio, pela indemnização dos prejuízos que cause em prédio vizinho, concluímos que é ao réu Município que incumbe o dever de indemnizar os autores, na procedência da acção, sendo, como tal, parte legítima;

5.ª O Mmo. Juiz «a quo» faz uma errada interpretação do disposto no n.º 1, do art. 36.º do RJEOP, violando, para além disso, o disposto no art. 1348.º, do Cód. Civil …”.

O R., aqui recorrido, veio produzir contra-alegações (cfr. fls. 306 e segs.) nas quais termina pugnando pela manutenção do julgado, concluindo nos seguintes termos:

“…

A - Não existe qualquer princípio geral de responsabilização do «dono da obra»,

B - Competindo ao «empreiteiro» a responsabilidade pelos erros e danos de que terceiros sejam vítimas;

C - Não há uma qualquer relação de comitente-comitido no contrato de empreitada de obras públicas,

D - Pelo que ocorre ilegitimidade da Câmara Municipal …”.

O Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA não emitiu qualquer pronúncia (cfr. fls. 339 e segs.).

Dispensados os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

2. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR

Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes sendo que as mesmas se resumem em determinar se a decisão judicial recorrida que julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva, absolvendo o R. da instância, enferma de erro de julgamento traduzido na incorrecta e ilegal aplicação do disposto nos arts. 36.º do RJEOP (à data dos factos decorrente do DL n.º 59/99, de 02.03) e 1348.º do CC [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas]

3. FUNDAMENTOS

3.1. DE FACTO

Para a apreciação do objecto de recurso tem-se como assente a seguinte factualidade:

I) Os AA., aqui recorrentes, interpuseram no TJ de Caminha acção declarativa com processo comum, forma ordinária, contra o R. Município de Caminha peticionando a condenação deste a “… pagar aos autores: A) Uma indemnização a liquidar em execução de sentença, equivalente ao montante necessário à realização das obras destinadas à reparação das avarias sofridas no seu prédio … que tenham sido provocadas pelos trabalhos levados a efeito pela demandada a que se referem os arts. 14.º e seguintes, avarias essas melhor descriminadas nos arts. 23.º e seguintes; B) Uma indemnização a liquidar em execução de sentença destinada a compensar os autores pelos prejuízos – lucros cessantes – a que se reportam os arts. 49.º a 54.º …”, tudo nos termos e pelos fundamentos vertidos no articulado inicial inserto a fls. 02 a 06 v. dos autos e cujo teor aqui se dá por reproduzido;

II) Na contestação apresentada pelo R. “Município de Caminha” foi deduzida, nomeadamente, defesa por excepção (incompetência material daquele TJ e ilegitimidade passiva) (cfr. fls. 18 e segs. dos autos cujo teor aqui se dá por reproduzido);

III) Os AA. apresentaram réplica onde concluíram no sentido improcedência das alegadas excepções (cfr. fls. 143/143 v.);

IV) O TJ de Caminha proferiu, em 05.12.2008, decisão a julgar procedente a excepção dilatória de incompetência em razão da matéria, absolvendo o R. da instância (cfr. fls. 216/222 dos autos cujo teor aqui se dá por reproduzido), decisão essa que, tendo sido aceite, motivou requerimento peticionando a remessa dos autos ao TAF de Braga nos termos do n.º 2 do art. 105.º do CPC o que foi deferido por despacho (cfr. fls. 254, 256 e 260 dos autos);

V) Conclusos os autos no TAF de Braga veio nos mesmos a ser proferida a decisão judicial ora objecto de recurso que parcialmente se reproduz:

“…

Cumpre agora apreciar a excepção de ilegitimidade aduzida pelo Município.

Ora bem:

Da leitura da p.i. apresentada, resulta claro que os AA. assacam os danos advindos das obras de que foram alvo os prédios contíguos ao seu da actuação do empreiteiro que actuou ao serviço do R. Á má execução, no plano técnico, chamemos-lhe assim, da obra a que este procedeu, em nome do dono da obra. A responsabilização que pretendem estender ao R. Município tem apenas por base o facto de este ser o dono da obra.

Mas tal não basta, estamos em crer (…).

Os AA., na p.i., alegam que os factos tiveram início com as obras, que remontam ao ano de 2002, tendo, os AA. intentado a presente acção em 2007. Antes, portanto, em data anterior ao Regime de Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, resultante da Lei 67/2007, de 31.12.

No anterior regime era necessária a existência de norma expressa que estendesse aos entes privados o regime de responsabilidade previsto no Decreto 48051. Em casos como este de que ora nos ocupamos, apenas existia o art. 36.º, n.º 1, do RJEOP (DL 59/99, de 02 de Março), que consagrava a responsabilidade do empreiteiro. A do dono da obra dependia do preenchimento do disposto no art. 37.º e 38.º do mesmo diploma.

No entanto, neste caso, da simples leitura da petição apresentada, vemos que os AA. apenas invocam factos idóneos para responsabilizar civilmente quem executou (no seu entender mal) as obras em questão ou seja, o empreiteiro. Nada é referido em relação ao dono da obra, ao incumprimento concreto de dever de fiscalização ou de outra obrigação que sobre ele impendesse, nos termos dos artigos 37.º e 38.º do RJEOP, acima referidos.

Isto posto, teremos por claro que para o aqui R. não poderá advir qualquer prejuízo ao não contestar a acção, critério do qual se poderá aferir a sua falta de interesse em contradizer (art. 26.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, ex vi do art. 1.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos).

(…) Assim sendo, carecerá o R. Município de legitimidade passiva para a presente acção e cumprirá, portanto, considerar procedente a excepção de ilegitimidade invocada, absolvendo o MUNICÍPIO DE CAMINHA da presente instância.

Decisão:
Pelo exposto, considero que o R. MUNICÍPIO DE CAMINHA é parte ilegítima, na presente acção e, como tal, absolvo-o da instância …”
3.2. DE DIREITO

Considerada a factualidade supra fixada importa, agora, entrar na análise dos fundamentos do recurso jurisdicional “sub judice”.
3.2.1. DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA

O TAF de Braga em apreciação da pretensão formulada pelos aqui recorrentes entendeu que no caso ocorria excepção dilatória de ilegitimidade passiva do R., pelo que o absolveu da instância com tal fundamento.

3.2.2. DA TESE DOS RECORRENTES

Contra tal julgamento se insurgem os AA. sustentando que, no caso, o tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento traduzido na ilegal interpretação e aplicação do disposto nos arts. 36.º do RJEOP e 1348.º do CC.

3.2.3. DO MÉRITO DO RECURSO

Passemos, então, à sua análise para o que importa trazer o quadro legal tido por necessário.

I. Decorre do art. 10.º do CPTA, sob a epígrafe “legitimidade passiva”, que cada “… acção deve ser proposta contra a outra parte na relação material controvertida e, quando for caso disso, contra as pessoas ou entidades titulares de interesses contrapostos aos do autor …” (n.º 1) sendo que quando “… a acção tenha por objecto a acção ou omissão de uma entidade pública, parte demandada é a pessoa colectiva de direito público …” (n.º 2).

E do art. 26.º do CPC deriva que o “… réu é parte legítima quando tem interesse directo em contradizer …” (n.º 1), sendo que o interesse em contradizer se exprime “… pelo prejuízo que dessa procedência advenha …” (n.º 2) e na “… falta de indicação da lei em contrário, são considerados titulares do interesse relevante para o efeito da legitimidade os sujeitos da relação controvertida, tal como é configurada pelo autor …” (n.º 3).

Resulta, por seu turno, do art. 36.º do RJEOP que o “… empreiteiro é responsável por todas as deficiências e erros relativos à execução dos trabalhos ou à qualidade, forma e dimensões dos materiais aplicados, quer nos casos em que o projecto não fixe as normas a observar, quer nos casos em que sejam diferentes dos aprovados …” (n.º 1) e que a “… responsabilidade do empreiteiro cessa quando os erros e vícios de execução hajam resultado de obediência a ordens ou instruções escritas transmitidas pelo fiscal da obra, ou que tenham obtido a concordância expressa deste, através de inscrição no livro de obra …” (n.º 2), sendo que nos termos do artigo seguinte pelas “… deficiências técnicas e erros de concepção dos projectos e dos restantes elementos patenteados no concurso ou em que posteriormente se definam os trabalhos a executar responderão o dono da obra ou o empreiteiro, conforme aquelas peças sejam apresentadas pelo primeiro ou pelo segundo …” (n.º 1) e quando “… o projecto ou variante for da autoria do empreiteiro, mas estiver baseado em dados de campo, estudos ou previsões fornecidos, sem reservas, pelo dono da obra, será este responsável pelas deficiências e erros do projecto ou variante que derivem da inexactidão dos referidos dados, estudos ou previsões …” (n.º 2).

Prevê-se, ainda, no art. 38.º que quem “… incorrer na responsabilidade estabelecida nos dois artigos anteriores deve custear as obras, alterações e reparações necessárias à adequada supressão das consequências da deficiência ou erro verificado, bem como indemnizar a outra parte ou terceiros pelos prejuízos sofridos …”.

Por fim, estipula-se o art. 1348.º do CC que o “… proprietário tem a faculdade de abrir no seu prédio minas ou poços e fazer escavações, desde que não prive os prédios vizinhos do apoio necessário para evitar desmoronamentos ou deslocações de terra …” (n.º 1), que logo “… que venham a padecer danos com as obras feitas, os proprietários vizinhos serão indemnizados pelo autor delas, mesmo que tenham sido tomadas as precauções julgadas necessárias …” (n.º 2).

II. Definido o quadro legal a analisar em sede de enquadramento jurídico da causa, importa do mesmo extrair os pertinentes ensinamentos, para o que cumpre tecer breves notas.

III. E como primeira nota importa ter presente que a legitimidade processual constitui um pressuposto adjectivo através do qual a lei selecciona os sujeitos de direito admitidos a participar em cada processo levado a tribunal.

A lei processual civil na redacção aplicável e vigente à data da propositura dos autos "sub judice" nos arts. 26.º do CPC e 10.º do CPTA fornece um critério para aferirmos da legitimidade "in casu" passiva consubstanciado no “interesse directo em contradizer”, o qual se afere pela utilidade derivada do prejuízo que da procedência da acção possa derivar para o demandado, sendo que como vimos supra a não ser que haja lei em sentido contrário o R. é parte legítima se for sujeito da relação material controvertida tal como é configurada pelo autor (n.º 3 do art. 26.º do CPC).

Nessa medida, a titularidade e, consequentemente, a legitimidade deverá ser aferida pelas afirmações do A. na petição inicial, pelo modo como este unilateral e discricionariamente entende configurar o objecto do processo, sem que na determinação das partes legítimas se deva ter de aferir em função da efectiva titularidade da relação material controvertida existente, tomada de forma provisória como objectivamente existente com a configuração que vier a resultar das afirmações do A. e do R., confirmadas pela instrução e discussão da causa.

Na verdade, a legitimidade constitui um pressuposto processual e não uma condição de procedência, pelo que os problemas que se suscitam em torno da existência da relação material controvertida prendem-se com o fundo da pretensão ou mérito da mesma e nada tem que ver com a definição da legitimidade processual dos sujeitos intervenientes num processo.

Refira-se, ainda, que tal regime só faz sentido quando suscitado relativamente ao critério normal de determinação da legitimidade das partes (legitimidade singular e directa), visto que quanto à legitimidade extraordinária (situações de litisconsórcio ou de legitimidade indirecta) a sua existência não se basta, nem depende das meras afirmações do A., mas da efectiva configuração da situação em que assenta a legitimidade nos termos do quadro legal específico.

O regime consagrado na lei processual civil corresponde a uma de duas teses anteriormente em confronto, regime esse que, em nosso entendimento, é aquele que melhor se molda à situação de legitimidade encarada em termos normais (legitimidade directa), como é o caso dos autos, enquanto pressuposto processual que há-de averiguar-se em face da utilidade ou prejuízo (portanto, pelo interesse), que da procedência ou improcedência da acção pode advir para as partes, tendo em presença a relação material controvertida tal como é desenhada pelo A. na petição inicial, assim, se assegurando a coincidência entre os sujeitos que, em nome próprio, conduzem o processo e aqueles em cuja esfera jurídica a decisão judicial vai directamente produzir a sua eficácia.

IV. Como segunda nota importa delimitar e enquadrar o regime de responsabilidade do dono de obra pública e do empreiteiro.

A questão não é nova neste Tribunal.

Com efeito, apreciando é certo a propósito de outra questão este Tribunal no seu acórdão de 18.09.2008 (Proc. n.º 00883/06.0BEBRG in: «www.dgsi.pt/jtcn») sustentou, em termos da caracterização das relações dono obra/empreiteiro e respectivas responsabilidades perante terceiros no quadro de execução de obra, o seguinte: “… face à situação fáctica e jurídica em questão temos que no contrato de empreitada, seja ele de natureza privada seja de natureza pública, não existe qualquer vínculo de subordinação do empreiteiro em relação ao dono da obra, pelo que aquele, em princípio, responde pelos danos causados a terceiro com a execução das obras (cfr. Acs. do STJ de 10.12.1998 - Proc. n.º 98B987, de 18.02.1999 - Proc. n.º 98B1190 in: «www.dgsi.pt/jstj»; Acs. do STA de 07.11.1995 - Proc. n.º 037205, de 17.10.1996 - Proc. n.º 039310, de 20.12.2000 - Proc. n.º 046388, de 09.05.2002 - Proc. n.º 048181 in: «www.dgsi.pt/jsta»).

Com efeito, não existe no regime jurídico do DL n.º 59/99, de 02.03, diploma que disciplina o contrato de empreitada de obras públicas em presença, um princípio geral de responsabilização do dono da obra pela indemnização dos prejuízos provocados pelo empreiteiro ou subempreiteiro no âmbito da execução do contrato, visto o que existe é, em primeira linha, a responsabilização geral do empreiteiro ou do subempreiteiro (cfr. art. 36.º, n.º 1), cingindo-se a responsabilidade do dono da obra aos prejuízos provocados por aqueles nas situações em que os vícios da obra resultaram de ordens ou instruções transmitidas pelo fiscal nomeado pelo dono da obra, ou que hajam obtido a sua concordância expressa, ou daquelas outras situações em que tenha havido erros de concepção do projecto imputáveis ao dono da obra (cfr. arts. 37.º e 38.º) e também daquelas situações em que sobre o dono da obra impendam outros deveres legais autónomos em matéria de fiscalização, de sinalização da obra e vias (vide, sobre a questão e situações aludidas, entre outros, os Acs. do STA de 01.07.1993 - Proc. n.º 031595, de 09.02.1995 - Proc. n.º 034825, de 07.11.1995 - Proc. n.º 037205, de 17.10.1996 - Proc. n.º 039310, de 01.02.2000 - Proc. n.º 045489, de 01.06.2000 - Proc. n.º 043863, de 20.12.2000 - Proc. n.º 046388, de 06.12.2001 - Proc. n.º 048027, de 09.05.2002 - Proc. n.º 048181, de 22.05.2003 - Proc. n.º 01901/02, de 29.10.2003 - Proc. n.º 047104, de 13.10.2005 - Proc. n.º 0643/05 todos in: «www.dgsi.pt/jsta»).

O STA no seu acórdão de 20.12.2000 (Proc. n.º 046388 in: «www.dgsi.pt/jsta» e in: Ap. DR de 12.02.2003, vol. III, págs. 9339 e segs.) considerou, nomeadamente, que “… em regra, é sobre o empreiteiro que recai a obrigação de indemnizar os danos a que este houver dado causa na execução da obra …” mas “… pode admitir-se o dever de indemnizar do dono da obra no domínio da responsabilidade extracontratual, …, se o autor tivesse carreado à petição da acção factos que, oportunamente provados, autorizassem concluir que os danos ocorridos ficaram a dever-se a desajustada e inoperante fiscalização pelo dono da obra, ou a ordens ou instruções escritas transmitidas pelo respectivo fiscal …”.

E aquele mesmo Supremo no seu acórdão de 13.11.2002 (Proc. n.º 0571/02 in: «www.dgsi.pt/jsta») veio sustentar, também, que o “… dever de acompanhamento e fiscalização da execução das obras, que lhe exigia verificar se delas não resultava perigo e se a sua sinalização era a mais conveniente e adequada, mais não é do que uma manifestação do dever de diligência exigido pelo art. 483.º do Código Civil … dever este que não era afastado pela circunstância das obras estarem a cargo de terceiro …”.

Note-se, ainda, que entre o dono da obra e o empreiteiro ou entre este e o subempreiteiro não existe uma qualquer relação de “comissão” no âmbito da qual viesse a ser chamado à colação o regime decorrente do art. 500.º do Código Civil (abreviadamente CC). Com efeito e caracterizando o que seja a expressão "comissão" para efeitos daquele preceito legal temos, diferentemente do contrato de comissão regulado enquanto contrato especial no âmbito do Código Comercial (cfr. arts. 266.º e segs. daquele código), que a mesma é utilizada em sentido muito amplo, abrangendo toda a tarefa (actos de carácter material ou de carácter jurídico), isolada ou duradoura, gratuita ou onerosa, de que uma pessoa (o comissário) tenha sido incumbida por outra (o comitente), desde que exista escolha do comitente, o comissário aja por conta do comitente e se estabeleça uma relação de subordinação do primeiro ao segundo (cfr. A. Menezes Cordeiro, in: "Direito das Obrigações", 2.º Vol., edições AAFDL, Lx 1990, pág. 371; Fernando Pessoa Jorge, in: "Direito das Obrigações", vol. I, edições AAFDL, LX 1975/76, pág. 621 ou in: "Ensaios sobre responsabilidade civil", pág. 148; Pires de Lima e Antunes Varela, in: "Código Civil Anotado", vol. I, 4.ª edição revista e actualizada, pág. 507, nota 3).

Como referem P. Lima e A. Varela (in: ob. cit., pág. 508, nota 3) a "... comissão pressupõe uma relação de dependência entre o comitente e o comissário, que autorize aquele a dar ordens ou instruções a este. Só essa possibilidade de direcção é capaz de justificar a responsabilidade do primeiro pelos actos do segundo ...". Daí que mais adiante afirmam aqueles mesmos autores que por "... falta da tal relação, não podem considerar-se comissários do dono da obra as pessoas que o empreiteiro contrata para execução desta, nem o empreiteiro em face do proprietário ..." (cfr. neste sentido, entre outros, M.J. Almeida e Costa, in: "Direito das Obrigações", 11.ª edição, revista e actualizada, pág. 617; Pedro Romano Martinez in: “Direito das Obrigações - (Parte Especial) Contratos”, 2.ª edição, pág. 464, ou in: "Contrato de empreitada" 1994, pág. 183, bem como in: "O Subcontrato", Lx 1989, pág. 148; Luís Manuel Teles de Meneses Leitão in: “Direito das Obrigações”, vol. I, 7.ª edição, pág. 369; Acs. do STJ de 30.01.1979 in: BMJ n.º 283, págs. 201 e segs. e RLJ Ano 112, págs. 204 e segs., com anotação favorável de A. Vaz Serra, de 26.04.1988 - Proc. n.º 75.571, in: TJ 1ª série, n.º 45, pág. 35 ou in: BMJ n.º 376, págs. 590 e segs., de 10.12.1998 - Proc. n.º 98B987, de 14.09.2006 - Proc. n.º 06B2337, de 31.01.2007 - Proc. n.º 06B4762, de 13.12.2007 - Proc. n.º 07A3550, de 04.03.2008 - Proc. n.º 08A164 in: «www.dgsi.pt/jstj»; Ac. do STA de 09.03.2006 - Proc. n.º 01206/05 «www.dgsi.pt/jsta»).

Sustentou-se no acórdão do STA de 09.03.2006 (Proc. n.º 01206/05), supra citado, que a “… empreitada, enquanto modalidade do contrato de prestação de serviços (art. 1155.º do Código Civil), caracteriza-se por a obrigação do empreiteiro consistir em prestar à outra parte um certo resultado do seu trabalho, que especificamente se traduz na realização de uma obra (arts. 1154.º e 1207.º do mesmo diploma). De acordo com o princípio geral aplicável às prestações de serviço, o empreiteiro não está subordinado ao dono da obra durante a realização dela – ainda que essa relativa autonomia do empreiteiro não exclua os poderes de fiscalização externa que o dono da obra detém (arts. 1208.º e 1209.º do Código Civil). Sendo assim, quaisquer danos causados a terceiros durante a realização da empreitada serão normalmente da exclusiva responsabilidade do empreiteiro, pois o dono da obra só haverá de responder por tais prejuízos se eles se filiarem em facto que lhe seja directamente imputável …”.

Este entendimento e posicionamento tem, aliás, vindo a ser reiterado na jurisprudência entretanto produzida sobre a matéria, registando-se, nomeadamente, entre os mais recentes e no sentido da inexistência da relação de comitente/comissário entre dono obra e empreiteiro o acórdão do STJ de 25.03.2010 [Proc. n.º 428/1999.P1.S1 in: «www.dgsi.pt/jstj»].

Também o STA no seu acórdão de 18.06.2009 (Proc. n.º 0469/09 in: «www.dgsi.pt/jsta») veio reafirmar tal jurisprudência quando no sumário concluiu que o “… dono da obra só responde pelos danos causados a terceiros durante a execução da empreitada se o «modus faciendi» lesivo foi imposto ao empreiteiro ou obteve a expressa concordância do fiscal da obra - como se previa nos arts. 36.º a 38.º do DL n.º 59/99 …” e que estas “… normas não regulavam as relações internas havidas no âmbito da empreitada nem quaisquer direitos de regresso, e o teor delas reforça a convicção de que o dono da obra não é comitente do empreiteiro para os efeitos previstos no art. 500.º do Código Civil …” e da sua fundamentação se extrai que tal como “… se disse no acórdão deste STA de 16/5/01, proferido no recurso n.º 47.082, os comportamentos que lesem terceiros, ocorridos durante a execução de uma empreitada de obras públicas, não são automaticamente assimiláveis a um deficiente e censurável exercício das funções administrativas. Numa empreitada sujeita à disciplina do DL n.º 59/99, …, como era o caso, a responsabilidade extracontratual do dono da obra exigia que os erros e vícios da sua execução resultassem de erros de concepção ou de ordens ou instruções escritas transmitidas pelo fiscal da obra; ou que tais erros e vícios, provindo embora da iniciativa do empreiteiro, houvessem obtido a expressa concordância do mesmo fiscal - como globalmente se alcançava do estatuído nos artigos 36.º a 38.º daquele diploma. Fora dessas hipóteses, e por falta de um genérico vínculo de subordinação da actividade do empreiteiro relativamente ao dono da obra, este não respondia pelos prejuízos causados a terceiros no decurso da execução da empreitada.

Ora, os autores não alegaram que o modo como o empreiteiro levantou a estrutura de andaimes fora imposto pelo dono da obra ou obtivera a concordância dele através de inscrição no livro de obra. E também não alegaram que a recusa de supressão dos andaimes emanou do dono da obra. Consequentemente, tais factos não se apuraram; e, não se tendo apurado, torna-se impossível imputar a sua autoria à Direcção-Geral, de acordo com as referidas normas e em termos de agora se responsabilizar o Estado pelos efeitos danosos que deles decorreram. É que - ao invés do que os recorrentes dizem … - o «onus probandi» desses factos incumbia aos autores, nos termos gerais dos arts. 487.º, n.º 1, e 342.º, n.º 1, do Código Civil.

(…) Mas os autores também abordam a problemática da responsabilidade por factos ilícitos noutra perspectiva, pois acham que a Direcção-Geral actuava «através» do empreiteiro, que seria seu «agente». Depara-se-nos aqui o propósito de enquadrar o assunto no que o art. 500.º do Código Civil genericamente prevê acerca das relações entre comitente e comissário. No entanto, a relativa independência da acção típica do empreiteiro em relação ao dono da obra logo exclui que este possa considerar-se como comitente e o empreiteiro como o comissário correlativo (…). Ou seja: é erróneo afirmar que as condutas do empreiteiro eram ainda as da Direcção-Geral, que agiria «através» dele.

Pelo exposto, nenhum dos factos invocados na petição como significativos da conduta culposa do Estado tem o alcance pretendido pelos autores, sendo seguro que deles não flui a responsabilidade aquileana do réu …”.

V. Presentes estas notas de enquadramento centremos, pois, a nossa atenção no caso vertente e julgamento no mesmo realizado.

Está em causa a apreciação do mérito da decisão judicial recorrida que, em sede de despacho saneador, julgou procedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva da R., mormente, se o fez com correcta interpretação e aplicação do disposto nos arts. 36.º do RJEOP e 1348.º do CC na sua concatenação com o demais quadro factual e normativo que supra se enunciou.

Entrando na análise da alegada violação do art. 36.º do RJEOP por parte da decisão judicial recorrida temos que a mesma improcede face ao entendimento firmado sob o ponto anterior.

Com efeito, dúvidas não temos de que inexiste qualquer vínculo de subordinação entre empreiteiro e dono da obra, pelo que aquele, em princípio, responde pelos danos causados a terceiro com a execução das obras.

Como referimos o regime jurídico do DL n.º 59/99 não contém qualquer princípio geral de responsabilização do dono da obra pela indemnização dos prejuízos provocados pelo empreiteiro ou subempreiteiro no âmbito da execução do contrato, visto o que existe é, em primeira linha, a responsabilização geral do empreiteiro ou do subempreiteiro, cingindo-se a responsabilidade do dono da obra aos prejuízos provocados por aqueles nas situações em que os vícios da obra resultaram de ordens ou instruções transmitidas pelo fiscal nomeado pelo dono da obra, ou que hajam obtido a sua concordância expressa, ou daquelas outras situações em que tenha havido erros de concepção do projecto imputáveis ao dono da obra e também daquelas situações em que sobre o dono da obra impendam outros deveres legais autónomos em matéria de fiscalização, de sinalização da obra e vias.

De igual modo e também como se sustentou entre o dono da obra e o empreiteiro ou entre este e o subempreiteiro não existe uma qualquer relação de “comissão” no âmbito da qual viesse a ser chamado à colação o regime decorrente do art. 500.º do CC.

Daí que sendo este o quadro relacional e de responsabilidade que, aliás, foi sufragado na decisão judicial recorrida temos que esta nesse juízo não enferma de erro, tanto mais que analisada a petição inicial da mesma efectivamente não decorre qualquer factualidade que permita integrar alguma das situações atrás enunciadas e assim imputar responsabilidade civil extracontratual ao aqui R..

Mas se deste entendimento firmado pelo tribunal “a quo” não divergimos a consequência dele retirado em sede de procedência da excepção dilatória de ilegitimidade passiva não pode merecer o nosso aplauso.

É que dado estarmos no âmbito de uma acção administrativa comum condenatória para efectivação de responsabilidade civil extracontratual então a legitimidade do R. afere-se por na relação substantiva ser o sujeito ou agente responsável sobre o qual incide um alegado direito indemnizatório invocado pelos AA., direito este incerto e que se pretende definir ou tornar certo.

Nesta situação, a legitimidade das partes não está dependente da verificação de pressupostos que se autonomizam do objecto da acção, do seu mérito, pelo que terá a mesma de ser aferida em face da posição relativa das partes face à relação material controvertida tal como a configuraram os AA. na petição inicial.

Nessa medida, à luz da relação material controvertida nos termos em que a mesma se mostra delineada pelos AA. naquele articulado temos que assiste ao R. manifesto e claro interesse em contradizer a pretensão que contra o mesmo foi deduzida e como tal legitimidade passiva para a acção administrativa “sub judice” tanto mais que o apurar se a factualidade alegada se mostra idónea ou bastante para a efectivação da responsabilidade civil do R. e sua condenação constitui uma condição de procedência da pretensão substantiva, ou seja, prende-se com o fundo da pretensão ou mérito da acção e como tal nada tem que ver com a definição da legitimidade processual dos sujeitos intervenientes no processo.

Não podemos, por conseguinte, manter o juízo feito em termos da consequência a extrair da ausência de articulação fáctica tendente à imputação de responsabilidade civil do R. já que excepção de ilegitimidade passiva improcede.

Mas daí não deriva que, como vimos, assista razão aos AA. na alegada infracção ao disposto no art. 36.º do RJEOP e na sua pretensão de prosseguimento dos autos com emissão de juízo final de total procedência da sua pretensão.

VI. Num último e derradeiro argumento/fundamento os AA. sustentam a infracção pela decisão judicial impugnada do disposto no art. 1348.º do CC.

E respondendo à questão cumpre desde já afirmar que também aqui não assiste razão aos recorrentes.

Na verdade, a decisão judicial em recurso para além de não haver considerado aquele regime legal e nessa medida não o poder ter errado na sua interpretação e aplicação, sempre também não o tinha de aplicar.

Tal como se sustentou no acórdão do STA de 14.10.2003 (Proc. n.º 0736/03 in: «www.dgsi.pt/jsta»), cujo entendimento jurisprudencial se secunda, temos que, considerado o regime legal previsto nos arts. 36.º a 38.º do DL n.º 59/99 com os contornos supra elencados “… é errado perspectivar a questão da responsabilidade do dono da obra à luz de qualquer outro regime jurídico, nomeadamente do que dimana do art. 1348.º do Cód. Civil (normativo que tem o seu campo primacial de aplicação no domínio das relações jurídico-privadas) …”, já que como deriva da fundamentação “… encontrando-se a conduta em causa especialmente regulada no apontado regime atinente às empreitadas de obras públicas, é errado perspectivar a questão à luz de qualquer outro regime jurídico, nomeadamente do que dimana do citado art. 1348.º do Cód. Civil, normativo que, como se assinalou no citado acórdão deste STA de 01.02.2000 (rec. 45489), tem o seu campo primacial de aplicação no domínio das relações jurídico-privadas, não abrangendo casos como o vertente (ali tratava-se de danos decorrentes da vibração do solo em que não ocorram desmoronamentos ou deslocação de terras) …”.

Nessa medida, tendo o normativo em referência como campo principal de aplicação o das relações jurídico-privadas, situação que não é a vertente, sempre em qualquer caso a mesma não se encaixa na previsão do referido preceito porquanto ali estão em causa apenas danos provocados por desmoronamentos ou deslocações de terras resultado de falta de apoio gerada pela feitura de minas, poços ou escavações.

Ora não é essa inequivocamente a situação dos autos em face do que se mostra alegado.

Improcede, pois, também este fundamento impugnatório.

*

Sumariando, nos termos do n.º 7 do art. 713.º do CPC, concluiu-se da seguinte forma:

I. Inexiste qualquer vínculo de subordinação entre empreiteiro e dono da obra, pelo que aquele, em princípio, responde pelos danos causados a terceiro com a execução das obras.

II. O regime jurídico empreitadas de obras públicas (à data vertido no DL n.º 59/99) não contém qualquer princípio geral de responsabilização do dono da obra pela indemnização dos prejuízos provocados pelo empreiteiro ou subempreiteiro no âmbito da execução do contrato, visto o que existe é, em primeira linha, a responsabilização geral do empreiteiro ou do subempreiteiro, cingindo-se a responsabilidade do dono da obra aos prejuízos provocados por aqueles nas situações em que os vícios da obra resultaram de ordens ou instruções transmitidas pelo fiscal nomeado pelo dono da obra, ou que hajam obtido a sua concordância expressa, ou daquelas outras situações em que tenha havido erros de concepção do projecto imputáveis ao dono da obra e também daquelas situações em que sobre o dono da obra impendam outros deveres legais autónomos em matéria de fiscalização, de sinalização da obra e vias.

III. De igual modo entre o dono da obra e o empreiteiro ou entre este e o subempreiteiro não existe uma qualquer relação de “comissão” no âmbito da qual viesse a ser chamado à colação o regime decorrente do art. 500.º do CC.

IV. Estando-se no âmbito duma acção administrativa comum condenatória para efectivação de responsabilidade civil extracontratual a legitimidade do R. afere-se por na relação substantiva ser o sujeito ou agente responsável sobre o qual incide um alegado direito indemnizatório invocado pelo A., direito este incerto e que se pretende definir ou tornar certo.

V. Nesta situação a legitimidade das partes não está dependente da verificação de pressupostos que se autonomizam do objecto da acção, do seu mérito, pelo que terá a mesma de ser aferida em face da posição relativa das partes face à relação material controvertida tal como a configuraram os AA. na petição inicial.

VI. Encontrando-se a conduta em causa especialmente regulada no referido regime atinente às empreitadas de obras públicas mostra-se errado perspectivar a questão à luz de qualquer outro regime jurídico, nomeadamente do que dimana do art. 1348.º do CC, normativo que tem o seu campo primacial de aplicação no domínio das relações jurídico-privadas e que apenas abrange os danos provocados por desmoronamentos ou deslocações de terras resultado de falta de apoio gerada pela feitura de minas, poços ou escavações o que não acontece no caso vertente.
4. DECISÃO

Nestes termos, acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo deste Tribunal, de harmonia com os poderes conferidos pelo art. 202.º da Constituição da República Portuguesa, em:

A) Julgar improcedente a excepção de ilegitimidade passiva do R., não podendo nesse segmento manter-se a decisão judicial recorrida;

B) No mais negar provimento ao recurso jurisdicional interposto pelos AA. e, em consequência, pelos fundamentos antecedentes julgar a presente acção administrativa comum totalmente improcedente, absolvendo o R. do pedido com as legais consequências.

Custas nesta instância a cargo dos AA./recorrentes, sendo que na mesma a taxa de justiça é reduzida a metade [arts. 73.º-A, n.º 1, 73.º-E, n.º 1, al. a), 18.º, n.º 2 todos do CCJ, 446.º do CPC e 189.º do CPTA].

Notifique-se. D.N..
Restituam-se, oportunamente, os suportes informáticos que hajam sido gentilmente disponibilizados.
Processado com recurso a meios informáticos, tendo sido revisto e rubricado pelo relator (cfr. art. 138.º, n.º 5 do CPC “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA).

 Porto, 11 de Fevereiro de 2011
Ass. Carlos Luís Medeiros de Carvalho

Ass. Antero Pires Salvador
Ass. Rogério Paulo da Costa Martins
Rita Mourato Villaverde
Nº17523
Sub-turma2

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