domingo, 6 de maio de 2012

Acordão Patrocinio judiciário


Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo:0556/09
Data do Acordão:16-09-2009
Tribunal:PLENO DA SECÇÃO DO CA
Relator:RUI BOTELHO
Descritores:PATROCÍNIO
REPRESENTAÇÃO EM JUÍZO
LICENCIADO EM DIREITO
NOTIFICAÇÃO AO MANDATÁRIO DA CONTRAPARTE
Sumário:I - De acordo com o preceituado nos n.ºs 1 e 2 do art.º 11 do CPTA, epigrafado de "Patrocínio judiciário e representação em juízo": "1. Nos processos da competência dos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de advogado. 2. Sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público nos processos que tenham por objecto relações contratuais e de responsabilidade, as pessoas colectivas de direito público ou os ministérios podem ser representados em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico, expressamente designado para o efeito, cuja actuação no âmbito do processo fica vinculada à observância dos mesmos deveres deontológicos, designadamente de sigilo, que obrigam o mandatário da outra parte."
II - O teor destes preceitos mostra claramente que é obrigatória a constituição de advogado nos tribunais administrativos e que é equiparado o patrocínio por advogado à representação "em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico".
III - Se a lei faz equiparar o licenciado em Direito ao advogado constituído, ter-se-á de concluir que a posição no processo, com os consequentes direitos e obrigações processuais, é a mesma para todas as partes quer a autoridade seja patrocinada por advogado quer representada por licenciado nos referidos termos.
IV - Sendo assim, ter-se-á de concluir: a) Nos processos em que são nomeados licenciados em Direito com funções de apoio jurídico a pessoas colectivas públicas ou ministérios, nos termos do art.º 11, n.º 2, do CPTA, os mandatários das partes estão obrigados a dar cumprimento em relação a eles aos deveres de notificação previstos nos art.ºs 229-A e 260-A do CPC; b) Nos mesmos casos, os licenciados em Direito nomeados estão obrigados a dar cumprimento a esses deveres de notificação em relação aos mandatários das partes ou outros licenciados em Direito nomeados para representação processual de outras pessoas colectivas públicas ou ministérios.
Nº Convencional:JSTA00065938
Nº do Documento:SAP200909160556
Data de Entrada:01-07-2009
Recorrente:JUIZ PRESIDENTE DO TAF DE BRAGA
Recorrido 1:*
Votação:UNANIMIDADE
Meio Processual:REENVIO PREJUDICIAL.
Objecto:REQUERIMENTO DE REENVIO PREJUDICIAL PRESIDENTE TAF BRAGA
Decisão:DEFERIMENTO.
Área Temática 1:DIR ADM CONT - ACÇÃO ADM ESPECIAL.
Legislação Nacional:CPTA02 ART6 ART8 ART11 N1 N2 ART83 N3.
LPTA85 ART5 ART26.
EOADV84 ART83.
CPC96 ART229-A ART260-A.
Referência a Doutrina:CASTRO MENDES DIREITO PROCESSUAL CIVIL 1980 V2 PAG125.
Aditamento:
    Hide details for Texto IntegralTexto Integral
Texto Integral: Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
I Relatório
O Presidente do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, sob a égide do art.º 93, n.º 1, do CPTA, procedeu ao reenvio prejudicial para este STA do Processo a que se reporta a Acção Administrativa Especial, instaurada por A... contra o MINISTÉRIO DAS FINANÇAS, em que impugna o despacho de indeferimento liminar proferido pela Subdirectora-Geral dos Impostos.
Fundamentou o pedido nos seguintes termos:
"1- Na acção administrativa especial n.º 88S/O8.ZBESRG do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, foi suscitada a questão de saber se os mandatários das partes têm o dever de efectuar as notificações previstas nos arts 229º-A e 260º-A do CPC em relação aos licenciados em Direito com funções de apoio jurídico que podem ser nomeados por pessoas colectivas de direito público ou ministérios para sua representação em processos que tenham por objecto relações contratuais e de responsabilidade. Com o Código de Processo nos Tribunais Administrativos, a questão da aplicação dos deveres de notificação previstos nestas normas, tanto no que concerne aos eventuais deveres de os mandatários das partes efectuarem as notificações a esses licenciados, como ao possíveis deveres destes efectuarem essas notificações aos mandatários das partes coloca-se em termos novos, pois estabelece-se expressamente, no art. 11º n.º 2, deste Código, que as pessoas nomeadas ficam vinculadas à observância dos mesmos deveres deontológicos dos mandatários da outra parte e da eventual imposição desses deveres aos licenciados referidos em relação aos mandatários das partes poderá resultar, por aplicação do princípio da igualdade das partes enunciado no art. 6º do CPTA, o dever os mandatários das partes efectuarem essas notificações em relação a tais licenciados. As questões de saber se esses licenciados nomeados ao abrigo do art. 11º nº 2, do CPTA estão sujeitos aos deveres de notificação impostos aos mandatários das partes nos arts 229.2-A e 260.2-A do CPC e se estes têm esses deveres em relação a tais licenciados são de difícil resolução, pois esta pode depender não só da interpretação conjugada daquelas normas, mas também de outras, inclusivamente o princípio da cooperação enunciado no nº 1 do artº 8º do CPTA.
2- O artº 25º, n.º 2, do ETAF de 2004 estabelece que compete ao Pleno da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo pronunciar-se, nos termos estabelecidos na lei de processo, relativamente ao sentido em que deve ser resolvida, por um tribunal administrativo de círculo, questão de direito nova que suscite dificuldades sérias e se possa vir a colocar noutros litígios. O art. 93º do CPTA estabelece, no seu nº 1, que, quando à apreciação de um tribunal administrativo se coloque uma questão de direito nova que suscite dificuldades sérias e possa vir a ser suscitada noutros litígios, pode o respectivo presidente determinar que no julgamento intervenham todos os juízes do tribunal, sendo o quorum de dois terços, ou, em alternativa, proceder ao reenvio prejudicial para o Supremo Tribunal Administrativo, para que este emita pronúncia vinculativa sobre a questão no prazo de três meses. No caso em apreço, estão reunidos os requisitos aqui exigidos, pois, para além de as questões referidas serem novas e suscitarem dificuldades sérias, está-se perante questões que se poderão levantar em inúmeros processos. Estando-se perante uma questão cuja resolução não interessa apenas ao Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, não se justifica o julgamento com Formação alargada, mas sim o reenvio prejudicial, que tem potencialmente para promover a uniformização de jurisprudência sobre tal questão.
Pelo exposto, procedo ao reenvio prejudicial para a Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo sobre as seguintes questões:
a) Nos processos em que são nomeados licenciados em Direito com funções de apoio jurídico a pessoas colectivas públicas ou ministérios, nos termos do art. 11º nº 2, do CPTA, os mandatários das partes estão obrigados a dar cumprimento em relação a eles dos deveres de notificação previstos nos arts. 229º-A e 260º-A do CPC;
b) Nos mesmos casos, os licenciados em Direito nomeados estão obrigados a dar cumprimento a esses deveres de notificação em relação aos mandatários das partes ou outros licenciados em Direito nomeados para representação processual de outras pessoas colectivas públicas ou ministérios.
Pelo exposto, requeiro a V. Exa que, distribuído o processo ao Pleno da Secção do Contencioso Administrativo, se sigam os ulteriores termos previstos no art. 93.º do CPTA."
1. Por acórdão de 4.6.09 foi admitido o reenvio, cuja admissão, depois de enunciar as questões a apreciar, se apoiou nas seguintes considerações: "A questão essencial a dirimir respeita à interpretação do preceituado nos artigos 229°-A e 260° do CPC, aplicáveis ao contencioso administrativo por força do n.° 1 do CPTA. Dispõem assim os mencionados preceitos (com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.° 324/2003 de 27/12 e Decreto-Lei n.° 303/2007 de 24/08)
Artigo 229-A
Notificações entre os mandatários das partes
1- Nos processos em que as partes tenham constituído mandatário judicial, os actos processuais que devam ser praticados por escrito pelas partes após a notificação da contestação do réu ao autor, são notificados pelo mandatário judicial do apresentante ao mandatário judicial da contraparte, no respectivo domicílio profissional, nos termos do artigo 260° -A.
2- O mandatário judicial que assuma o patrocínio na pendência do processo comunica o seu domicílio profissional e endereço de correio electrónico ao mandatário judicial da contraparte.
Artigo 260°-A
Notificações entre os mandatários
1- As notificações entre os mandatários judiciais das partes, nos termos do n.° 1 do artigo 229°-A, são realizadas por todos os meios legalmente admissíveis para a prática de actos processuais, aplicando-se o disposto nos artigos 150° e 152º.
2- Os termos a que devem obedecer as notificações entre os mandatários judiciais das partes, quando realizadas por transmissão electrónica de dados, são definidos na portaria prevista no n.° 1 do artigo 138°-A.
3- O mandatário judicial notificante deve juntar aos autos documento comprovativo da data da notificação à contraparte, sendo essa junção dispensada quando a notificação seja realizada por transmissão electrónica de dados nos termos definidos na portaria prevista no n.° 1 do artigo 138°-A.
4- Se a notificação ocorrer no dia anterior a feriado, sábado, domingo ou férias judiciais, o prazo para a resposta a tal notificação inicia-se no primeiro dia útil seguinte ou no primeiro dia posterior ao termo das férias judiciais, respectivamente, salvo nos processos judiciais que correm termos durante as férias judiciais.
São disposições inovatórias cuja interpretação e aplicação não foi objecto de pronúncia pelo STA e que são aplicáveis aos processos da competência dos tribunais administrativos pelo que a novidade e importância prática estão fora de dúvida. Quanto ao requisito de admissão do reenvio de a questão de direito suscitar dificuldades sérias ela deve ser entendida de modo muito amplo em relação a questões processuais novas, uma vez que nesta sede importa mais a clarificação e uniformidade de procedimentos para evitar dificuldades de aplicação no dia a dia, uniformizar os procedimentos e assim estabilizar de modo seguro para os operadores o funcionamento e progressão dos processos do que a grande dificuldade técnico-jurídica. É neste entendimento que se consideram preenchidos os pressupostos para o reenvio previsto no artigo 93º nºs 1 e 3 do CPTA e se admite a apreciação da questão colocada pelo TAF de Braga."
2. Vejamos então. O art.º 11 do CPTA, epigrafado de "Patrocínio judiciário e representação em juízo" diz o seguinte:
"1. Nos processos da competência dos tribunais administrativos é obrigatória a constituição de advogado.
2. Sem prejuízo da representação do Estado pelo Ministério Público nos processos que tenham por objecto relações contratuais e de responsabilidade, as pessoas colectivas de direito público ou os ministérios podem ser representados em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico, expressamente designado para o efeito, cuja actuação no âmbito do processo fica vinculada à observância dos mesmos deveres deontológicos, designadamente de sigilo, que obrigam o mandatário da outra parte.
3. ...
4. ...
5. ..."
As normas que o antecederam no regime anterior, o da LPTA, o art.º 5, tinha como epígrafe "Constituição de advogado" e dispunha que "É obrigatória a constituição de advogado nos processos da competência dos tribunais administrativos, sem prejuízo do disposto no presente diploma e da possibilidade de os licenciados em Direito advogarem nas causas especialmente previstas na lei" e o art.º 26, tinha como epígrafe "Poderes processuais da autoridade recorrida", e referia que: "I- A autoridade recorrida pode produzir alegações e exercer quaisquer outros poderes processuais correspondentes aos dos demais recorridos, incluindo o de impugnar as decisões proferidas no recurso contencioso, desde que os respectivos actos processuais sejam praticados por advogado constituído ou por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico designado para aquele efeito. 2- A resposta ao recurso só pode ser assinada pelo autor do acto recorrido ou por quem haja sucedido na respectiva competência."
A mera enunciação dos indicados quadros jurídicos, o actual e o anterior, deixa perceber ter ocorrido uma alteração substancial: contrariamente ao que sucedia no regime da LPTA o licenciado em Direito com funções de apoio jurídico nomeado pela autoridade pública (pessoa colectiva de direito público ou ministério) passou a subscrever a contestação (poder até aí exclusivo da autoridade, que o perdeu), mas, para além disso, passou a poder intervir pelo lado activo (quando antes todo o desenho da LPTA apontava, só, para a sua intervenção pelo lado passivo, pois que, quando se falava na possibilidade de intervir apenas se aludia aos poderes processuais correspondentes aos dos demais recorridos).
A simples leitura daqueles dois preceitos do art.º 11 mostra claramente duas coisas: é obrigatória a constituição de advogado nos processos da competência dos tribunais administrativos; é absolutamente equiparado o patrocínio por advogado Note-se que o patrocínio judicial é uma forma de representação como outra qualquer tendo como particularidade, que constitui a sua a característica fundamental, a circunstância de se exercer nos tribunais, traduzindo-se na representação aí das partes no processo (Castro Mendes, Direito Processual Civil, 1980, 2.º, 125). Daí que, em termos conceptuais, se não veja distinção relevante entre o patrocínio judicial por advogado e a representação por licenciado em Direito nos termos da lei. De resto, por força da mesma lei, como se viu, ambos estão subordinados aos deveres deontológicos previstos no EOA (art.º 83 e ss.). à representação "em juízo por licenciado em Direito com funções de apoio jurídico" (o despacho de nomeação, como a procuração forense, quando for caso disso, deve ser junto com o primeiro articulado, nos termos do art.º 83, n.º 3, do CPTA). Observe-se, em apoio desta segunda asserção, que se manda aplicar a estes "os mesmos deveres deontológicos" que são impostos àqueles. Portanto, se é obrigatória a constituição de advogado, se a entidade pública pode optar entre o patrocínio por advogado e a representação por jurista nomeado para o efeito e se ambos estão subordinados aos mesmos deveres deontológicos, justamente porque desempenham as mesmas funções no processo, resulta patente que também terão de beneficiar dos mesmos direitos e de estar sujeitos ao cumprimento das mesmas obrigações processuais. Por outro lado, se as autoridades têm o poder de optar, essa opção não pode traduzir-se na sobrecarga da parte contrária ou na retirada de direitos processuais seus, mas também não pode permitir a diminuição das suas obrigações no processo. Ora, não contendo a lei qualquer restrição ou limitação ao exercício da sua função, que, em abstracto, sempre poderia existir quando a autoridade pública se fizesse representar por licenciado em Direito, e sendo certo que a mesma lei faz equiparar o exercício do licenciado em Direito ao exercício do advogado constituído, ter-se-á de concluir que a posição no processo, com os consequentes direitos e obrigações processuais, é a mesma para todas as partes quer a autoridade seja patrocinada por advogado quer representada por licenciado nos referidos termos. Logo, as "notificações entre os mandatários judiciais das partes" a que aludem os referidos preceitos do CPC - como quaisquer outros com semelhante conteúdo - têm que ser entendidas neste contexto. Outra solução não seria conforme ao respeito pelos princípios da igualdade e da cooperação com assento nos art.ºs 6 e 8 do CPTA. E, sendo assim, a resposta a dar às perguntas colocadas não pode deixar de ser positiva.
IV Decisão
Nos termos e com os fundamento expostos acordam em declarar que:
a) Nos processos em que são nomeados licenciados em Direito com funções de apoio jurídico a pessoas colectivas públicas ou ministérios, nos termos do art.º 11, n.º 2, do CPTA, os mandatários das partes estão obrigados a dar cumprimento em relação a eles aos deveres de notificação previstos nos art.ºs 229-A e 260-A do CPC;
b) Nos mesmos casos, os licenciados em Direito nomeados estão obrigados a dar cumprimento a esses deveres de notificação em relação aos mandatários das partes ou outros licenciados em Direito nomeados para representação processual de outras pessoas colectivas públicas ou ministérios.
Sem custas.
Lisboa, 16 de Setembro de 2009. – Rui Manuel Pires Ferreira Botelho (relator) – José Manuel da Silva Santos Botelho – Rosendo Dias José – Maria Angelina Domingues – Américo Joaquim Pires Esteves – Luís Pais Borges – Alberto Acácio de Sá Costa Reis – Adérito da Conceição Salvador dos Santos – Jorge Artur Madeira dos Santos – Alberto Augusto Andrade de Oliveira – António Políbio Ferreira Henriques – José António de Freitas Carvalho – António Bento São Pedro – Fernanda Martins Xavier e Nunes.




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