terça-feira, 22 de maio de 2012

O NOSSO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO




Todo o processo administrativo se tornou de plena jurisdição.

O art 268º/4 da CRP consagrando a garantia aos administrados da tutela jurisdicional efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, representou uma mudança copérnicana no modo como a justiça administrativa passou a ser entendida.



No direito comparado, há dois modelos possíveis de concretização deste paradigma constitucional: o modelo germânico e o modelo francês.

O modelo germânico, nascido da Lei fundamental alemã, está mais próximo do processo civil e conduz à criação de distintos meios processuais que se diferenciam em razão dos pedidos e em razão das sentenças. Numa lógica similar ao processo civil, a cada direito corresponde uma acção, um meio processual adequado à sua tutela e outros meios processuais que se distinguem.

O modelo francês/latino em vez de ter desdobramento de meios processuais, concentra todo o processo em um único modelo com grande amplitude, um modelo de “banda larga”.

Foi o modelo próximo do francês que o legislador português veio a consagrar no âmbito do Código de Processo Administrativo.

Há agora um novo centro para o direito administrativo.

É através deste novo centro de tutela dos direitos dos particulares em função de uma tutela plena e efectiva dos seus direitos que são concebidos os meios contenciosos, onde é concebido o contencioso administrativo.

É um modelo comum a outros países e resulta de uma evolução que é marcada por um acto de reafirmação de natureza jurisdicional do contencioso administrativo, por um lado, e por outro lado pelo princípio da tutela plena e efectiva dos direitos dos particulares.


Este modelo estabelece dois meios processuais principais: a acção administrativa comum (art 37º e ss) e a acção administrativa especial (art 46º e ss). Para além destes dois meios principais, o legislador estabelece ainda processos urgentes, tutela cautelar e processo executivo.

Em suma: há dois meios processuais principais que concentram em si todos os requisitos no quadro do contencioso administrativo.

O legislador estabeleceu um princípio de tutela jurisdicional plena - Art 2º CPA, que admite que todos os pedidos sejam feitos a propósito de todos os meios processuais, ou seja, quer se trate de acção comum quer se trate de acção especial é possível fazer pedidos de simples apreciação, de anulação ou de condenação que podem resultar sentenças de simples apreciação, de anulação ou de condenação.

Significa que agora, no quadro do contencioso administrativo, não é possível fazer o raciocínio que se faz no direito privado, de se saber em razão do meio processual, qual é o efeito da sentença.

Pelo contrário, cada meio processual permite que todas as sentenças sejam produzidas. É possível esgotar, no mesmo processo, pedidos diferentes, relativos a actuações administrativas diferentes desde que a relação jurídica seja a mesma.


Acção Comum e Acção especial – a denominação no nosso código.



Qual o critério de distinção entre a acção administrativa especial e a acção comum?

É preciso ter algum cuidado, pois o legislador parece afirmar um critério no artigo 37º, mas na verdade estabelece um critério diferente, de natureza substantiva – Art 46º


O artigo 37º dispõe de um critério processual. Segundo este enunciado, este seria o meio processual de excelência do contencioso administrativo. Na acção administrativa especial caberiam apenas casos especialmente regulados em lei especial. É um critério próximo do CPC.

Contudo não é este o critério efectivo.

O critério real, substantivo, depende das formas de actuação administrativa – art. 46º.


Este critério introduz diversos problemas. Por exemplo a sua própria denominação.

Esta distinção entre o comum e o especial havia sido já utilizada, historicamente, para duas coisas: primeiro entendia-se que o processo contencioso administrativo era especial na medida em que o juiz estava limitado nos seus poderes.

Por outro lado, a expressão especial foi entendida na doutrina francesa como excepcional, como um conjunto de excepções ao processo civil.

Esta já não é a lógica do processo administrativo. O nosso código manda aplicar directamente na acção administrativa comum o art 35º que nos diz que o CPC é aplicado supletivamente.

Em suma: o legislador não utilizou bem a expressão acção comum/acção especial no quadro do seu entendimento histórico.

Um problema mais grave é o nome ter sido trocado. Isto é, deveria ter sido denominada acção comum àquela que é verdadeiramente comum e não acção especial e vice-versa. Porque se o universo da acção dita especial é o universo do acto e do regulamento; se estes podem ser conhecidos em simultâneo com contratos, com formas de actuação não autoritárias, com actuações técnicas; se há possibilidade de cumulação generalizada de pedidos, isto significa que o universo do contencioso sobre actos e regulamentos é a esmagadora maioria dos processos existentes.

Usar o critério do art 46º significa que a verdadeira acção comum é a acção a quem o legislador chamou acção especial.

O legislador previu ainda uma outra possibilidade que está regulada no art 5º - que diz respeito à cumulação de pedidos. Nos casos em que há meios processuais em concorrência, o meio processual a ser utilizado é a acção administrativa especial, que é a verdadeira acção comum. Por ser mais frequente, por ser a que está especialmente regulada neste código, por ser a que caracteriza o contencioso administrativo.


O legislador não só deveria ter utilizado outra denominação como, insistindo em permanecer só estes nomes, deveria tê-los trocado.

CRISTINA ROSAS
Aluna Nº. 11323

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