quarta-feira, 11 de abril de 2012




Acórdão de data posterior á Reforma   2002/2004

Enfim, fruto dos traumas de uma infância bastante difícil………….

Acórdãos STA
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo
Processo: 0927/02 Data do Acordão: 24-05-2005
Tribunal: PLENO DA SECÇÃO DO CA Relator: PIRES ESTEVES Descritores: CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS.
REGIME DISCIPLINAR.
TRIBUNAL COMPETENTE.
Sumário: I - Caixa Geral de Depósitos nasceu com a Lei de 10 de Abril de 1876, germinando do Depósito Público criado no século XVI, desempenhou sempre um serviço público, através das suas vária e sucessivas transformações (Lei de 26/4/1880, Lei de 15/7/1885, Lei de 8/5/1896, Decreto de 23/6/1897, Lei de 26/9/1909, Decreto de 9/12/1909, Decreto n° 4670, de 14/7/1918, Decreto nº 8 162, de 29/5/1922).
II - Com o DL. n°48 953, (Lei Orgânica da Caixa Geral de Depósitos) a Caixa Geral de Depósitos passou a ser uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia e financeira, com património próprio, competindo-lhe o exercício das funções de instituto de crédito do Estado... .(artº 2º).
Esta lei orgânica foi completada pelo DL. nº 693/70, de 31/12, em nada alterando a natureza jurídica da CGD definida em tal lei, continuando, por isso, a ser uma pessoa colectiva de direito público, aliás o que continuou a afirmar-se no Decreto n°694/70, de 31/12, diploma este que aprovou o Regulamento da Caixa Geral de Depósitos.
III - O DL. n°298/92, de 31/12, que transpôs para a ordem jurídica interna as directivas comunitárias, aprovou o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, sujeitando ao seu regime as empresas públicas, designadamente a CGD (arts. 1º nº 2, 2º e 3º).
IV - Para adaptação final deste Regime Geral à CGD foi publicado o DL. n°287/93, de 20/8, que a transformou em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos (artº1º nº 1), natureza esta que foi novamente repetida no artº l° dos Estatutos da Caixa Geral de Depósitos.
V - Até à publicação do DL nº287/93, aos trabalhadores da CGD era aplicável o regime jurídico da função pública e o regime disciplinar do Decreto de 22/2/1913. Após a publicação e entrada em vigor daquele DL n°287/93, é-lhes aplicável o regime do Contrato Individual de Trabalho.
VI — Quanto às normas disciplinares a que os funcionários da CGD estão sujeitas podem existir as seguintes situações:
a) regime disciplinar do Decreto de 22/2/1913;
- é aplicável aos trabalhadores que se encontravam ao serviço na data de entrada em vigor do DL. n°287/93 (1/9/3) e não optaram pelo Regime do Contrato Individual de Trabalho;
- é aplicável aos restantes trabalhadores da CGD quer se encontrassem ao serviço na data de entrada em vigor do DL nº 287/93 (1/9/3) e que optaram pelo Regime do Contrato Individual de Trabalho quer aos que entraram ao serviço em data posterior a 1/9/1993, que já foram contratados de acordo com este RCIT até à da entrada em vigor do Despacho n°104/93 do Conselho de Administração da CGD (31/8/1993).
b) regime disciplinar do Despacho nº 104/93;
- é aplicável, desde a sua entrada em vigor, aos trabalhadores da CGD quer se encontrassem ao serviço na data de entrada em vigor do DL. nº 287/93 (1/9/3) e que optaram pelo Regime do Contrato Individual de Trabalho quer aos que entraram ao serviço em data posterior a 1/9/1993, que já foram contratados de acordo com este RCIT.
VII – Para conhecer de uma pena constante do Regime disciplinar do Decreto de 22/2/1913 aplicada a trabalhador da CGD são competentes os tribunais administrativos.
Nº Convencional: JSTA0005479
Nº do Documento   SA2200505240927
Recorrente: CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA CAIXA GERAL DE DEPÓSITOS
Recorrido 1: A...
Votação: *
Área Temática 1:
Aditamento:
Texto Integral: Acordam no Tribunal Pleno da Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo:
A…, casado, empregado bancário, residente em …, interpôs recurso contencioso de anulação da deliberação do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos (doravante, CACGD), de 17/3/1999, que lhe aplicou a pena disciplinar de despedimento com justa causa.
Por sentença o Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra declarou-se incompetente em razão da matéria para conhecer do recurso, declarando competente o Tribunal de Trabalho (fls. 203 a 205).
Não se conformando o recorrente contencioso com esta decisão, da mesma interpôs recurso jurisdicional para o Tribunal Central Administrativo.
Por acórdão de 28/2/2002 do TCA foi revogada a sentença recorrida e, julgando procedente o recurso contencioso, anulou a deliberação contenciosamente impugnada (fls. 293 a 309).
Deste acórdão interpôs o ora recorrente o presente recurso jurisdicional, com fundamento em oposição de julgados, oposição que foi reconhecida por acórdão deste tribunal de 19/2/2004 (fls. 382 a 391).
Nas suas alegações formula o recorrente as seguintes conclusões:
“1ª - O Despacho n° 104/93, emitido pelo Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, corresponde ao exercício do poder regulamentar e encontra-se submetido, como qualquer outra forma de actividade administrativa, ao respeito do princípio da legalidade, seja na vertente de preferência de lei, seja na vertente de precedência de lei (cf. fls. 44 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
2ª - O artigo 36° do Decreto-Lei n° 48 953, na redacção dada pelo Decreto-Lei n° 461/77, constitui a habilitação legal necessária à emissão do regulamento por um órgão administrativo. A revogação do artigo 36°, operada pelo artigo 9°, n° 1, do Decreto-Lei n° 287/93, não impele à procura de um outro padrão normativo aferidor da legalidade do regulamento nem implica que o Despacho n° 104/93 tenha cessado a sua vigência (cf. fls. 44 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
3ª - Tendo este entrado em vigor no dia 31 de Agosto de 1993, veio a integrar o regime jurídico aplicável aos funcionários da Caixa, regime esse que o artigo 7°, n° 2, do Decreto-Lei n°287/93, determinou que continuasse a ser aplicado depois de 1 de Setembro de 1993, data da entrada em vigor deste último diploma (cf. fls. 44 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
4ª - Ao determinar, no n° 1 do Despacho n° 104/93, que os trabalhadores da Caixa ficariam sujeitos ao «regime disciplinar aplicável à generalidade dos trabalhadores bancários», o Conselho de Administração não extravasou o poder regulamentar que lhe fora atribuído pelo artigo 36° do Decreto-Lei n° 48 953, na redacção dada pelo Decreto-Lei n° 461/77 (cf. fls. 44 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
5ª - Da leitura conjugada dos artigos 31°, n°2 e 36°, resulta a compreensão do que possa ser, nas palavras do legislador, o «peculiar estatuto laboral» dos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos (preâmbulo do Decreto-Lei n° 461/77 e fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
6ª - Se, por um lado, foi mantida a sujeição ao regime do funcionalismo público, não foi ignorado, por outro lado, a natureza da actividade bancária desenvolvida pela Caixa Geral de Depósitos e a sua progressiva aproximação ao direito privado (cf. fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
7ª - O sentido das normas que conferiam capacidade negocial à Caixa nos processos de contratação colectiva e que, em especial, atribuíram poder regulamentar em matéria disciplinar, apenas pode ser entendido como finalidade de afastamento do regime geral do funcionalismo público e de adaptação aos condicionalismos especiais do trabalho na Instituição (cf. fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
8ª - No momento em que foi exercido o poder regulamentar de que dispunha o Conselho de Administração da Caixa desde 1977 — em Agosto de 1993 — mais premente se tornara o imperativo de afastamento do regime geral do funcionalismo público e de aproximação ao direito privado (cf. fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
- Não só a Caixa já fora equiparada aos Bancos no respeitante ao tipo de actividades a desenvolver, através do Decreto-Lei n°298/92, como se encontrava na iminência de ser transformada em sociedade anónima pelo Decreto-Lei n°287/93 (cf. fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Século Correia);
10ª - A Caixa pertencia, assim, ao sector bancário em geral e os seus trabalhadores desempenhavam já actividades idênticas aos restantes trabalhadores bancários (cf. fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
11ª - O regime jurídico do contrato individual de trabalho, ao invés de ser apenas aplicado aos trabalhadores de outras instituições de crédito, passaria a ser aplicado na própria Caixa Geral de Depósitos, a todos os trabalhadores contratados após 1 de Setembro de 1993 (cf. fls. 45 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
12ª - O objectivo pretendido pelo legislador do Decreto-Lei n°461/77 — «a harmonização das (...) condições de prestação de trabalho com as que são comuns à generalidade do sistema bancário» — operou- se, com a sujeição dos trabalhadores ao «regime disciplinar aplicável à generalidade dos trabalhadores bancários» (cf. fls. 46 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
13ª - As normas jurídicas que compõem o regime disciplinar aplicável aos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos através do Despacho n°104/93 não apresentam natureza jurídico-privada mas antes natureza jurídico-pública (cf. fls. 46 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
14ª - A fonte, enquanto modo de formação de tais normas consiste num regulamento administrativo, de inequívoca natureza jurídico-pública (cf. fls. 46 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
15ª - O mesmo sucede, como aliás decorre do n° 1 e do nº 2 do artigo 32° do Dec-Lei n°48953 e tem sido sufragado pela jurisprudência administrativa, com as cláusulas de contratos colectivos de trabalho, as quais vigoram, não enquanto tais, mas enquanto normas regulamentares próprias da Caixa Geral de Depósitos (cf. fls. 46 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
16ª - Não fosse esta diferença de fontes decisiva para a conclusão pela diferente natureza jurídica das normas por si reveladas, sempre se poderia acrescentar que, apesar da identidade do texto das normas, não nos encontramos perante a aplicação das mesmas normas disciplinares (cf. fls. 46 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
17ª - Tal decorre, em primeiro lugar, das características da própria técnica remissiva, utilizada pelo n° 1 do Despacho n°104/93 (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
18ª - Visando esta técnica a aplicação de normas, pertencentes a um instituto ou regime jurídico, diferentes daqueles que directamente regem a matéria, entende-se que as normas aplicáveis por força da remissão nunca serão exactamente aquelas que servem de referência à remissão mas antes normas paralelas, resultantes da necessária adaptação das normas ad quem a outros domínios jurídicos cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
19ª - A aplicação, por força da técnica remissiva, há-de ser sempre, assim, uma mera «aplicação correspondente» (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
20ª - A adaptação sofrida pelas normas ad quem, aplicáveis por força da regra remissiva, será tão mais necessária quanto diferente é o domínio jurídico em que venham a ter aplicação (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
21ª - Será o caso da remissão, por normas administrativas, para normas de direito privado que integrarão, assim o sistema de direito administrativo, autónomo do direito privado (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
22ª - Os actos praticados ao abrigo do regime disciplinar são, assim, actos administrativos, convocando a aplicação de normas de competência, de regras gerais de validade e eficácia do acto administrando e importando a limitação do controlo jurisdicional sobre a margem de livre decisão (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
23ª - A diferenciação das normas aplicáveis por via do Despacho n°104/93 em relação às vigentes no direito privado é ainda reforçada por se tratarem de normas disciplinares (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
24ª - Enquanto normas sancionatórias da preterição de determinados deveres jurídicos, as normas disciplinares não contém a previsão de tais deveres, antes pressupondo a sua consagração em outras normas jurídicas (cf. fls. 47 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
25ª - No que respeita aos trabalhadores da Caixa abrangidos pelo Despacho n.° 104/93, ao contrário dos trabalhadores sujeitos ao regime do contrato individual de trabalho, tais normas não pertencem a este regime mas sim ao do funcionalismo público, reforçando assim a natureza jurídico-pública das normas disciplinares aplicáveis (cf. fls. 48 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
26ª - É indubitável, pois, a validade do Despacho n°104/93, de 11 de Agosto do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos (cf. fls. 48 do douto Parecer do Prof. Doutor Sérvulo Correia);
27ª- Acresce que o douto acórdão recorrido fundamentou a sua decisão no Acórdão da 1 Subsecção do Sup. Trib. Adm., de 14 de Outubro de 2000, proferido no recurso n°46 314, publicado na Antologia de Acórdãos do Supremo Tribunal Administrativo, ano IV, n° 1, págs. 113 —114,
Sucedendo, porém, que
28ª - O referido Acórdão de 14.10.00, em que o douto acórdão recorrido se louvou para decidir, como decidiu, nunca transitou em julgado e foi expressamente revoltado, por ser nulo, pelo acórdão do STA, 1ª Secção, de 31.05.01;
29ª - Em relação aos trabalhadores da CGD sujeitos ao regime de funcionalismo público:
a) as normas do ACTV do Sector Bancário relativas a admissões, acessos, categorias, vencimentos e outras condições, aplicam-se a esses trabalhadores como regulamento interno de direito público por força da declaração feita pela CGD aquando da outorga das revisões desse ACTV;
b) as normas do ACTV do Sector Bancário relativas a regime disciplinar aplicam-se a esses trabalhadores, como regulamento interno de direito público, por força do Despacho n°104/93, de 11 de Agosto, elaborado ao abrigo do n°1 do artigo 36° do Dec-Lei 48 953, de 5 de Abril de 1969, na redacção dada pelo Dec-Lei n° 461/77, de 7 de Novembro.
30ª - O Despacho n°104/93, de 11 de Agosto, integra o regime disciplinar aplicável aos funcionários da Caixa Geral de Depósitos sujeitos ao regime do funcionalismo público, é inteiramente válido e legal, como correctamente decidiu o Acórdão fundamento invocado neste recurso.
31ª - Como inteiramente válida e legal é também a deliberação do ora Recorrente de 17.03.1999, que aplicou ao ora Recorrido a sanção disciplinar de despedimento com justa causa;
Com efeito:
32ª - Ao arguido, ora Recorrido, foi aplicada a sanção disciplinar de despedimento por ter praticado os seguintes actos consubstanciadores de infracções disciplinares de manifesta e pesadíssima gravidade:
- ter procedido à montagem e autorização de um empréstimo de credicaixa em nome da filha de uma empregada da Agência de Sátão, onde, então, exercia as funções de Subgerente, alegadamente destinado à aquisição de material informático para a mesma, mas cujo produto, na verdade, foi recebido e aplicado pelo arguido no pagamento de despesas de registos de uma hipoteca a favor da Caixa, referentes a um crédito concedido a outros mutuários, registos esses que haviam caducado por deficiente controlo da sua parte;
- por ter autorizado mobilizações antecipadas de valores depositados e descobertos, de forma sistemática e indiscriminada, nomeadamente em contas tituladas pela esposa e mãe, alguns para seu próprio benefício; e
- por ter concedido empréstimos com fundamentação que bem sabia não corresponder à verdade, cujo produto era quase sempre aplicado em finalidades diferentes das declaradas e que visaram, essencialmente, aproveitar a rotação de capitais entre diversas contas e permitir a liquidação de outros já vencidos ou a regularização de descobertos.
33ª - A decisão punitiva de despedimento sem justa causa fundamentou-se nos n°s 1 a 3 do Despacho n° 104/93, de 11 de Agosto, do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, ora Recorrente;
34ª - Despacho esse que constituía o Regulamento Disciplinar de Direito Público ao caso aplicável;
35ª - Com remissão para os comandos - integrados por esse Despacho como normativos de direito público - do disposto nas cláusulas 34° e 117° n°1 al. e) do ACT para o sector bancário, nas alíneas b), d), e g) do n° 1 do art. 20º do DL. n°49 408, de 24/11/69, e, ainda, no n°1 do art. 9° do DL n°64-A/89, de 27/2,
36° - Aplicáveis na Caixa como Regulamento Administrativo de Direito Público, aos funcionários, como o Recorrido, que se encontrem ligados por contrato administrativo de provimento, ex vi do Despacho n°104/93, de 11 de Agosto, do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, elaborado ao abrigo do artigo 36° do Dec-Lei n° 48 953, de 5.4.969, na redacção dada pelo Dec-Lei n.°461/77, de 7 de Novembro.
Assim,
37ª - É inquestionável que o ora Recorrido foi despedido ou demitido com justa causa;
38ª - O acto recorrido é, pois, inteiramente válido e legal, devendo por isso ser mantido.
39ª - Decidindo, como decidiu, o douto acórdão recorrido violou o disposto no Despacho n°104/93, de 11 de Agosto, do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, elaborado ao abrigo do artigo 36° do Dec-Lei n°48 953, de 5.4.969, na redacção dada pelo Dec- Lei n.°461/77, de 7 de Novembro,
40ª - E os artigos 31° n° 2, 32° n° 2 e 36° n°1, do Dec-Lei n°48 953, de 5 de Abril de 1969, na redacção que lhes foi dada pelo Dec-Lei n°461/77, de 7 de Novembro e no artigo 7° n° 2, do Dec-Lei n°287/93, de 20 de Agosto.
41ª - O acto recorrido é, pois, inteiramente válido e legal, devendo por isso ser mantido.
Contra-alegou o recorrido, acabando por formular as seguintes conclusões:
“1ª - Para ocorrer oposição entre julgados é indispensável que sejam idênticos os factos neles tidos em conta e que, em ambos os arestos, a decisão haja assumido forma expressa, não bastando a simples oposição entre razões ou argumentos enformadores ou a simples invocação de decisões implícitas.
2ª - O Acórdão Fundamento não se pronuncia sobre a questão controvertida nos presentes autos — legalidade ou ilegalidade do despacho n°104/93 de 11/8 — limitando-se apenas a transcrever em sede de relatório os fundamentos de facto e, de direito, em que assentou a decisão da primeira instância.
3ª - Quer o acórdão fundamento, quer o acórdão recorrido, não proferiram decisão expressa sobre a mesma questão fundamental de direito sendo, inclusive, duvidoso que o aresto fundamento tenha, sequer implicitamente, aderido à tese do ora Recorrente acerca da legalidade do supra referido despacho 104/93 de 11/8.
4ª - Nos presentes autos, o caminho julgado adequado pelas instâncias foi o de verificar a legalidade do enquadramento punitivo, decidindo-se claramente pela ilegalidade do despacho n°104/93 de 11/08, porquanto não respeitou o disposto no n° 2 do art°31° do DL n°48 953 de 5 de Abril de 1969.
5ª - O acórdão fundamento, optou por analisar apenas o comportamento indiciador da sanção expulsiva não questionando a legalidade do enquadramento punitivo.
6ª - Os dois acórdãos objectos do presente recurso por oposição de julgados não se opõem.
7ª - A sanção de despedimento aplicada ao alegante reveste a natureza de uma pena inexistente, atenta a especificidade do regime disciplinar que é aplicável ao alegante, pelo que o acto em causa carece em absoluto de forma legal o que, nos termos do art°133° al. f) do C.P.A. acarreta a sua nulidade.
8ª - O Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Outubro de 2000, proferido no Rec°41 942, in Ac. Doutrinais do STA n°424 p. 457), entende, também que o despacho n° 104/93 de 11/08 é ilegal, porquanto não respeitou o disposto no n°2 do art° 31º do DL. n°48953 de 5 de Abril de 1969.
Nestes termos e, para além de se declarar não existir a oposição nos acórdãos referidos, o provimento a dar ao presente recurso deve ser efectivado com a prolação de uma decisão que opte pela confirmação do sentido decisório do Acórdão proferido nos presentes autos, Acórdão do TCA de 28 de Fevereiro de 2002 (e no sentido do Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 14 de Outubro de 2000 proferido no rec. n°41 942 in Ac. Doutrinais do STA n°424 p.457), e que decidiu pela ilegalidade do despacho 104/93 de 11/8, quando aplicado aos que prestam trabalho na Recorrente CGD, mantendo a sujeição ao Regime do Funcionalismo Público e, consequentemente, pela ilegalidade da sanção aplicada ao ora Alegante”.
Emitiu douto parecer o Ex.mo Magistrado do Ministério Público com o seguinte teor:
“Sufragando o teor do parecer emitido e junto a fls. 424 a 473, deve considerar-se válido e legal o despacho n°104/93, de 18 de Agosto, proferido pelo Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, assim se concedendo provimento ao recurso jurisdicional ora interposto e revogando-se o acórdão recorrido
Colhidos os vistos legais cumpre decidir.
No acórdão recorrido foram dados como assentes os seguintes factos:
1 — O recorrente foi admitido em 1980 como funcionário da C.G.D. e não optou pelo regime jurídico do contrato individual do trabalho.
2- A 20-5-97 e na sequência de auditoria realizada à agência da C.G.D. de Vila Franca do Campo, foi levada à consideração superior a justificação (e consequente proposta) de instauração de processo disciplinar ao recorrente, sub-gerente daquela agência, com intenção de despedimento.
3 — Foi ordenada a instauração de processo disciplinar a 22 de Maio de 1997, tendo sido deduzida nota de culpa contra o recorrente depois do processo instrutor e que aqui se dá por reproduzido.
4 — Por deliberação de 27 de Novembro de 1997, foi aplicada ao recorrente pena disciplinar de despedimento com justa causa.
5 — Tal deliberação baseou-se no relatório final do processo disciplinar que considerou provados os factos constantes da nota de culpa.
6 — Tal deliberação baseou-se no “regime disciplinar aplicável à Caixa por força dos n° 1 a 3 do Despacho n°104/93, de 11 de Agosto, do Conselho de Administração (cláusulas 34ª alínea b), 115° e 117° n° 1 alínea e) do ACT do Sector Bancário, alínea b), d), e g) do art°20° ao D.L. n°49 408, de 24 de Novembro, e, ainda, o n° 1 do art°9° do D.L. n°64-A/89, de 27 de Fevereiro).
7 — Sobre o projecto do despacho n°104/93 foi ouvida a Comissão de trabalhadores que emitiu parecer de concordância.
8 — Durante a pendência do processo disciplinar, o recorrente não foi suspenso do exercício das suas funções.
9 — No relatório final do processo disciplinar constata-se que as testemunhas arroladas pelo recorrente corroboraram a versão dos factos apresentados por ele.
10 — O recorrente não tem antecedentes disciplinares.
Tendo por base estes factos, o tribunal de lª instância entendeu serem os Tribunais Administrativos incompetentes para conhecer do objecto do litígio, cabendo materialmente tal competência ao Tribunal de Trabalho.
O acórdão recorrido revogou esta sentença, entendendo serem competentes os Tribunais Administrativos para conhecer do objecto do litígio e conhecendo do mérito anulou a deliberação contenciosamente impugnada.
E deste acórdão que vem interposto o presente recurso jurisdicional.
O que importa agora decidir é se ao caso dos autos “se deve aplicar o regime jurídico do funcionalismo público, com as modificações exigidas pela natureza específica da actividade da CGD como instituição de crédito” como se decidiu no acórdão recorrido, posição que é sufragada pelo recorrido, ou se “se, deve aplicar o regime do despacho n°104/93, de 18/8, do Conselho de Administração da CGD”, como se decidiu no acórdão fundamento, posição que é defendida pelo recorrente.
Começaremos por apurar qual a natureza jurídica da Caixa Geral de Depósitos.
Foi a Lei de 10 de Abril de 1876 que criou a Caixa Geral de Depósitos, tendo a sua administração sido conferida à Junta de Crédito Público (art°1°).
Veio a Caixa Geral de Depósitos, então criada, ser a herdeira do antigo Depósito Público, nascido no século XVI, cujas finalidades principais eram a recolha e administração dos depósitos necessários que eram os efectuados por disposição da lei ou dos tribunais e a arrecadação dos depósitos voluntários que abrangiam o produto de economias dos particulares.
Nesta Caixa então criada, ou nas suas delegações, “darão entrada todos os depósitos em dinheiro, valores de oiro, prata e pedras preciosas, e quaisquer papeis de crédito, que pela legislação em vigor se acham a cargo das actuais repartições do depósito público de Lisboa e do Porto, e de quaisquer depositários judiciais das outras comarcas, bem como os que se destinam a afiançar contratos, a servir de caução ao exercício de qualquer emprego, e a habilitar concorrentes nas licitações, em hasta pública, sobre quaisquer obras públicas, empresas ou fornecimentos ao Estado” (art°2°). Mas a “Administração desta mesma Caixa fica autorizada a receber na mesma caixa depósitos em dinheiro efectivo, em títulos da dívida consolidada, ou em quaisquer outros papeis de crédito, que lhe forem voluntariamente oferecidos por qualquer pessoa, corporação ou associação legalmente constituída” (art°6°),
Tem, pois, a Caixa Geral de Depósitos uma função pública não só na recolha como na administração dos depósitos necessários, assim como uma função privada, e a arrecadação dos depósitos voluntários que abrangiam o produto de economias dos particulares.
No sentido de “difundir, promover e incitar nas classes menos abastadas o espírito de economia, facultando-lhes meios seguros de tornar frutífera a acumulação de quantias, que por sua pequenez dificilmente pudessem encontrar outra aplicação produtiva” foi criada com a garantia do Estado, pela Lei de 26/4/1880, a Caixa Económica Portuguesa. Esta Lei foi alterada e complementada pela Lei de 15/7/1885, no sentido de melhor facilitar a sua utilização e simplificação ao seu acesso.
Pela Lei de 8/5/1896 foi criada a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência, abrangendo os seus serviços: a Caixa Geral de Depósitos, a Caixa Económica Portuguesa, a Caixa de Aposentações a trabalhadores assalariados e o Monte de piedade nacional (art° 1°).
A nomeação do pessoal da caixa geral de depósitos e instituições de previdência era feita pelo ministro da fazenda (art°58°), e para o desempenho dos novos serviços atribuídos àquela caixa e àquelas instituições foram nomeados empregados especiais pelo governo sob proposta do administrador geral da caixa (art°64°).
Para confirmar a natureza pública da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência vem o facto de elas gozarem da isenção de selos e custas nos tribunais e nas repartições públicas, nos mesmos termos que a fazenda nacional (art°65°), além de aos respectivos empregados se aplicarem as disposições concernentes aos empregados das direcções gerais do ministério da fazenda (art°63°) e poderem ser despedidos do serviço quando não satisfizessem devidamente as suas obrigações e pela mesma forma como eram nomeados (art°64° § único), competindo ao governo publicar os regulamentos necessários para a execução desta lei (art°66°).
Ao abrigo desta última disposição legal, foi publicado o Decreto de 23/6/1897 que aprovou o Regulamento dos Serviços da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência.
O art° 1° deste Regulamento estatuía, em termos semelhantes ao da anterior legislação que “a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência abrangia os serviços relativos a: Caixa Geral de Depósitos, Caixa Económica Portuguesa, Caixa de Aposentações a Trabalhadores Assalariados; e Monte de Piedade Nacional”. Acrescentava-se no art°3° seguinte que “os serviços da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência eram divididos em quatro repartições: Contabilidade, Caixa Geral de Depósitos. Caixa Económica Portuguesa e Caixa de Aposentações e Monte de Piedade “. E no seu § único referia-se que “o pessoal d’estas quatro repartições consta do quadro geral que vai designado na tabela anexa a este regulamento“.
Mantêm-se as mesmas espécies de depósitos, pois que no art° 15° Decreto 23/6/1897 refere-se que “a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência tem por fim a arrecadação, guarda, administração e restituição de todos os depósitos em dinheiro, valores de oiro, prata e pedras preciosas, e quaisquer papéis de crédito, que, nos termos da carta de lei de 10 de Abril de 1876, possam ou devam ser recebidos pela mesma Caixa ou pelas suas delegações
Vem, por sua vez, tratado no Título VIII o estatuto dos empregados e suas atribuições, nomeação, contrato e concurso (arts.267° a 280°) e as disposições disciplinares: faltas, licenças e penalidades (arts. 291° a 302°).
Sendo a nomeação do pessoal do quadro da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência será feita pelo ministro da fazenda, ou pelo governo, ou por concurso documental, conforme a categoria do cargo (arts. 267° a 280°), as penas disciplinares de repreensão é aplicada pelo administrador geral (art°294°), a pena de suspensão será aplicada, conforme a sua gravidade, ou pelo administrador geral (suspensão de um a oito dias) ou pelo ministro da fazenda (suspensão superior a oito dias) (art°293°), a pena de demissão será aplicada pelo ministro da fazenda (art°295°).
A Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência foi posteriormente regulamentada, para além do mais, uma melhor distribuição dos serviços, remodelando-os, autorizando-se o Governo a criar, quando não tenha disponíveis títulos da dívida interna necessários para a liquidação do débito, pela Lei de 26/9/1909
No art° 1° (Base I) desta lei continua a afirmar que “a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência abrange os serviços relativos: a) à Caixa Geral de Depósitos; b) à Caixa Económica Portuguesa, e; c) à Caixa de Aposentações para as classes operárias e trabalhadoras”, sendo das atribuições da Caixa a arrecadação não só dos depósitos necessários como dos depósitos voluntários, pagando por estes um determinado juro (Base II - art°2°), assegurando o Estado a restituição de todos os depósitos, bem como garantir todas as operações efectuadas pela Caixa Económica Portuguesa, mesmo em casos fortuitos ou de força maior (art°7° - Base 1).
Continua a manter-se, de acordo com estes preceitos, a natureza pública da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência, ideia esta indiciada ao afirmar-se no art°8 da Base I que “a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência continuará a desempenhar os serviços relativos aos fundos de viação municipal e de instrução primária, e os demais constantes da legislação em vigor ou que de futuro lhe sejam incumbidos” e acrescentando-se no art°9° da Base I que “os corpos administrativos só poderão fazer os seus depósitos de fundos na Caixa Geral de Depósitos ou na Caixa Económica Portuguesa”.
O Administrador Geral é de nomeação do Governo, de certas deliberações do Conselho da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência cabe recurso para o Governo (arts.6° e 110 da Base III), sendo a nomeação do pessoal do quadro da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência feita pelo Governo, nuns casos, e, noutros por concurso (arts. 19º e 20º da Base IV), todavia, “quando o desenvolvimento dos serviços da Caixa exija o aumento do quadro de pessoal, este só pode fazer-se por proposta do Conselho da caixa, e as nomeações só poderão efectuar-se depois de inscrita e aprovada a verba respectiva no Orçamento Geral do Estado” (art° 16° da Base IV).
No art° 1° da Base IV exigia-se que o orçamento da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência fosse enviado ao Ministro da Fazenda até ao dia 15 de Setembro de cada ano, para ser incluído no Orçamento Geral de Estado, nos termos da lei de contabilidade, podendo o Governo mandar inspeccionar, sempre que o julgue conveniente, a escrita e o movimento de fundos da Caixa (art°4° -Base III), as contas anuais da gerência e do tesouro da Caixa serão submetidas ao julgamento do Tribunal de Contas (art°5°-Base III), sendo a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência representada em juízo pelos agentes do Ministério Público.
Acresce que o artº 2° da Base 4ª equipara a Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência a secretarias de Estado o art°3° da mesma Base isenta de imposto de selo as operações efectuadas pela Caixa Económica Portuguesa com os seus depositantes.
Esta Lei de 26/9/1909 foi regulamentada por Decreto de 9/12/1909, nele se mantendo a natureza pública da Caixa Geral de Depósitos e Instituições de Previdência e continuando a concessão de privilégios à mesma e a intervenção do Governo (a título meramente exemplificativo ver: arts. 9º a 10°, 17°, 26°, 72°, 73°, 86°, 236°, 266°, 267° a 293°, 304° a 364°).
O Decreto n°4 670 de 14/7/1918 que veio regular novamente a Caixa Geral de Depósitos mantém-lhe a natureza pública, com determinadas prorrogativas, assim, a arrecadação de depósitos de valores em dinheiro e papéis de crédito que, por lei, nela só podem constituir-se, os chamados depósitos necessários (art° l° n°1), os administradores são nomeados pelo Governo (art°3°), o Governo tem o poder de mandar inspeccionar sempre que queira a escrita e o movimento de fundos da Caixa (art°4°), o Conselho de Administração envia mensalmente o seu boletim à Secretaria de Estado das Finanças (art°5°), o Conselho Fiscal da Caixa é constituído pelos directores gerais da fazenda e contabilidade públicas, por um dos membros do Conselho Superior da Administração Financeira do Estado, nomeado trienalmente pelo Governo, e por mais quatro vogais eleitos trienalmente pelo Senado, Câmara dos Deputados, Supremo Tribunal Administrativo e Junta do Crédito Público (art°8°), isenção de imposto de selo sobre as operações efectuadas pela Caixa Económica portuguesa com os seus depositantes (art°2° da Base IV), do despacho do administrador geral cabe recurso para os tribunais (art°4° da Base IV), sendo a caixa representada em juízo pelos M°P° e gozando de isenção de selos e custas nos mesmos termos em que a tem a Fazenda Nacional (art°3° da Base IV), os vencimentos do pessoal do quadro da Caixa são os mesmos que os dos funcionários da Secretaria de Estado das Finanças (art°14° da Base IV).
O Regulamento da Caixa Geral de Depósitos previsto neste Decreto (art°l°) apenas foi publicado pelo Decreto n°8 162, de 29/5/1922.
A natureza pública da caixa aflora em vários preceitos. Assim, a CGD montará os seus serviços onde o interesse público o indicar (art°2°), onde o movimento demográfico nacional o exigir a assistência económica da CGD, poderá esta encarregar-se do serviço financeiro do Estado (art°5°), o administrador geral e os administradores vogais da CGD são de livre nomeação do Governo, tomando posse perante o Ministro das Finanças (art°13°), os funcionários da CGD têm as prerrogativas atribuídas aos da Direcção Geral das Contribuições e Impostos (art°26°), o administrador geral poderá consultar, sobre os negócios que lhe forem afectos, a Procuradoria Geral da República (art°29°), etc.
Face a este percurso legal até este momento percorrido, podemos, em síntese, afirmar que a Caixa Geral de Depósitos desempenha essencialmente “um serviço público — o do exercício de funções de crédito, além da gestão da previdência do funcionalismo — e, como tal, embora administrativa e financeiramente autónoma e dispondo de património próprio, não se distinguindo de qualquer outro serviço público, devendo, por consequência, subordinar-se, em princípio, às mesmas regras que disciplinam a administração burocrática do Estado”.
Quanto ao regime e situação do pessoal da Caixa, o sistema que vem desde a sua criação, é o de aplicar integralmente a esse pessoal o regime jurídico do funcionalismo público (ver neste sentido: o preâmbulo do DL n°48 953, de 5/4/1969).
Porém, “além de outros inconvenientes, resulta desta concepção uma inevitável rigidez em diversos aspectos da estrutura e do funcionamento da Caixa, designadamente no tocante à organização dos serviços e ao recrutamento e situação do pessoal. Quanto ao primeiro ponto, o problema reside, em síntese, na dificuldade de adaptar rapidamente aquela orgânica às exigências de um sistema flexível de crédito, de acordo com as presentes condições da vida económica e social. Relativamente ao funcionalismo da Caixa, o regime aplicável acarreta sérias limitações, que frequentemente não consentem recrutar ou manter ao serviço elementos qualificados em número suficiente, dado serem atraídos por condições mais favoráveis em outros sectores. Tem-se sobretudo em vista o exercício de funções directivas ou de carácter técnico, e outras de especial responsabilidade, cuja importância, num estabelecimento com a dimensão e as atribuições da Caixa, é ocioso salientar” (Preâmbulo acima referido).
Assim, no sentido de imprimir uma maior flexibilidade e dinamismo à acção da Caixa, mediante o reforço da autonomia da sua gestão, o acréscimo da produtividade e eficiência dos serviços, e a garantia de colaboração, em todos os níveis, de elementos de trabalho aptos ao desempenho das múltiplas e cada vez mais complexas tarefas que incumbem ao estabelecimento.
Todavia, havendo a Caixa que se adaptar ao sentido destes ventos no aspecto económico, não se podia, porém, esquecer que a mesma é simultaneamente um estabelecimento de crédito do Estado e uma instituição gestora da previdência do funcionalismo público, além de no exercício das suas funções de crédito, o objecto da actividade da Caixa é a oferta no mercado de serviços de natureza bancária e financeira em condições de relativa concorrência com os demais elementos do sistema.
Para atingir este desiderato, foi publicada uma nova Lei Orgânica da Caixa Geral de Depósitos (DL. n°48 953, de 5/4/1969).
Deste diploma legal, e para o que neste momento interessa, importa transcrever os seguintes preceitos:
Art°l°:
A Caixa Geral de Depósitos, Crédito e Previdência, que pode designar-se apenas por Caixa Geral de Depósitos, passa a reger-se pelo disposto no presente diploma e nos regulamentos que venham a ser adoptados em sua execução, continuando em vigor a legislação que lhe é aplicável em tudo o que não seja alterado por este decreto-lei e suas normas regulamentares.
Art°2°
A Caixa Geral de Depósitos é uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com património próprio, competindo-lhe o exercício das funções de instituto de crédito do Estado....
Art°31°
1— O pessoal da Caixa é comum aos seus serviços privativos e aos das instituições anexas.
2 — O referido pessoal continua sujeito ao regime jurídico do funcionalismo público, com as modificações exigidas pela natureza específica da actividade da caixa como instituição de crédito, de harmonia com o disposto no presente diploma e nos restantes preceitos especialmente aplicáveis ao estabelecimento.
Art°36°
O pessoal continua sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável, incumbindo ao conselho de administração exercer, em relação ao mesmo pessoal, a competência atribuída aos Ministros por aquele regulamento.
De acordo com estes preceitos acabados de transcrever, a CGD uma pessoa colectiva de direito público, o seu pessoal continua sujeito ao regime jurídico do funcionalismo público e sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável.
O quadro de disposições legais pelas quais se devia reger a CGD foi posteriormente completado pelo DL. n° 693/70, de 31/12. Porém, atentando nos seus preâmbulo e texto, verifica-se que são aditadas novas normas e alteradas outras, porém, todas elas respeitam ao funcionamento da caixa, ou seja, mais concretamente, são atinentes ao seu objecto que é a oferta no mercado de serviços de natureza bancária e financeira em condições de relativa concorrência com os demais elementos do sistema.
Em cumprimento do disposto no DL. n° 48 953, de 5/4/1969 e no sentido de completar a reorganização efectuada por tal diploma legal e pelo DL. n°693/70, de 31/12 foi publicado o Decreto n°694/70, de 31/12 aprovou o novo Regulamento da Caixa Geral de Depósitos.
Neste regulamento continua a qualificar-se a CGD como uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com património próprio, competindo-lhe o exercício das funções de instituto de crédito do Estado e a administração da Caixa Geral de Aposentações e o Montepio dos Servidores do Estado, sob a designação genérica de Caixa Nacional de Previdência, e da Agência Financial de Portugal no Rio de Janeiro, criada pelo Decreto de 29 de Dezembro de 1887 (arts. 1°, 3° e 4º).
Relativamente ao pessoal refere-se no art° 108°: “1 - o pessoal da Caixa é comum aos seus serviços privativos e aos das instituições anexas; 2 - o referido pessoal continua sujeito ao regime jurídico do funcionalismo público, com as modificações exigidas pela natureza específica da actividade da Caixa como instituição de crédito, de harmonia com o disposto no presente diploma e nos restantes preceitos especialmente aplicáveis ao estabelecimento; 3-. ..”
Acrescenta-se, ainda, no artº 116°: “1-o pessoal continua sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável, incumbindo ao conselho de administração exercer, em relação ao mesmo pessoal, a competência atribuída aos Ministros por aquele regulamento; 2-as penas dos n°s 1 e 5 do art°6° do referido regulamento são da competência do administrador-geral, podendo este delegar nos directores de serviços a aplicação das penas dos n°s 1 e 2 do mesmo artigo”.
O peculiar estatuto laboral dos trabalhadores da Caixa Geral de Depósitos — ligados a este instituto de crédito do Estado por contratos que conservavam a natureza administrativa de contratos de provimento, com um conteúdo de direitos e deveres tendente à harmonização das suas condições de prestação de trabalho com as que são comuns à generalidade do sistema bancário, aconselhou que se modifica, além do mais, o enquadramento normativo então vigente na Caixa em matéria disciplinar.
Então, pelo DL. n°461/77, de 7/11 (art°1°), e para dar satisfação a esta necessidade foi dada nova redacção ao art°36° do DL. n°48 953, de 5/4/1969, passando tal artigo a ter o seguinte teor:
“1 — As normas disciplinares aplicáveis ao pessoal da Caixa constarão também de regulamento interno aprovado pelo conselho de administração, tendo-se em conta as condições especiais da prestação de trabalho na instituição e o regime aplicável à generalidade do sector bancário público.
2 — Enquanto não for estabelecido o regulamento referido no número anterior, o pessoal permanecerá sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável, continuando a incumbir ao conselho de administração exercer, em relação ao mesmo pessoal, a competência atribuída aos Ministros pelo referido regulamento”.
O art°2° do mesmo DL. n°461/77 teve que dar nova redacção ao art° 116° do Regulamento da Caixa Geral de Depósitos, aprovado pelo Decreto n°694/70, de 31/12, para ficar harmonizado com a actual redacção do art°36° do DL. n°48 953, de 5/4/1969.
Passou, assim, o art° 116° a ter o seguinte teor:
“1-as normas disciplinares aplicáveis ao pessoal constarão também de regulamento interno aprovado pelo conselho de administração, tendo-se em conta as condições especiais de prestação de trabalho na instituição e o regime aplicável à generalidade do sector bancário público.
2-Enquanto não for estabelecido o regulamento referido no número anterior, o pessoal permanecerá sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável, continuando a incumbir ao conselho de administração exercer, em relação ao mesmo pessoal, a competência atribuída aos Ministros pelo referido regulamento e sendo da competência do administrador-geral a aplicação das penas dos n°s 1 a 5 do art°6° do mesmo regulamento, com a faculdade de delegar nos directores de serviço a aplicação das penas dos n°s 1 e 2 daquele artigo”.
A regulamentação do sistema financeiro português, com exclusão do sector de seguros e de fundos de pensões, foi reformado com a transposição para a ordem jurídica interna, pelo DL. n°298/92, de 31/12, das Directivas n°77/780/CEE do Conselho, de 12/12/1989, n°897/646/CEE do Conselho, de 15/12/1989 e Directiva n°92/30/CEE do Conselho, de 6/4/1992.
Aquele DL. nº 298/92 aprovou o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, estipulando este regulamento no seu art°1° n°2 que “as instituições de crédito sob a forma de empresa pública ficam sujeitas às normas do presente diploma que não sejam incompatíveis com a sua forma”.
No art°2° consagra-se que “são instituições de crédito as empresas cuja actividade consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis, a fim de os aplicarem por conta própria mediante a concessão de crédito”.
Entre as instituições reconhecidas por este RGICSF vem mencionada a Caixa Geral de Depósitos (art°3°), podendo esta efectuar todas as operações permitidas aos bancos, sem prejuízo de outras atribuições conferidas pela legislação que lhe é própria (art°4° n°2).
Portanto, a Caixa Geral de Depósitos, criada pela Carta de Lei de 10 de Abril de 1876, nasceu com uma vocação exclusivamente centrada no âmbito do Estado, tendo como função principal a recolha e administração dos depósitos efectuados por imposição da lei ou dos tribunais; cresceu como um banco de poupança e investimento ligado à política económica, continuando a recolher os depósitos públicos ou determinados pelo Estado, bem como a poupança privada, e chegou aos nossos dias com uma posição de grande destaque no conjunto das instituições de crédito portuguesas, já não dependendo dos depósitos públicos, actuando como um banco universal e sendo a matriz do maior grupo financeiro português. E, pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo DL. n°298/92, de 31/12, a CGD foi equiparada aos bancos no que respeita às actividades que está autorizada a exercer.
Ora, todos estes circunstancialismos apontam a sujeição da Caixa a um regime de direito privado, ou, mais rigorosamente, para a aplicação à instituição de regras idênticas às que regem as empresas privadas do sector, designadamente, a adopção da forma de sociedade anónima. Mas, dada a natureza da actividade exercida, a posição e o papel que a empresa ocupa no mesmo sector, foi entendido que deveria ser apenas o Estado, e não qualquer outra pessoa colectiva de direito público, o detentor do capital.
Para adaptação da natureza da Caixa Geral de Depósitos a estes novos princípios orientadores foi publicado o DL. n°287/93 de 20/8.
De acordo com este diploma legal, a Caixa Geral de Depósitos foi transformada em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos (art°l° n°1). Esta natureza e denominação foi confirmada no art°1° dos Estatutos da Caixa Geral de Depósitos.
A Caixa rege-se pelo disposto neste diploma, pelas normas gerais e especiais aplicáveis às instituições de crédito e pela legislação aplicável às sociedades anónimas (n°2 do art°1° do mesmo decreto-lei).
Quanto aos trabalhadores da Caixa diz-se no art°7° que: “1-sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os trabalhadores da caixa ficam sujeitos ao Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho; 2-os trabalhadores que se encontrem ao serviço da Caixa na data da entrada cm vigor do presente diploma continuam sujeitos ao regime que lhes era até aí aplicável, podendo contudo optar pelo regime previsto no número anterior, mediante declaração escrita feita nos termos e no prazo a fixar pela indemnização da Caixa; ...“.
Acrescenta-se no n°3 do art°9° seguinte que “se mantêm também em vigor, mas unicamente para aplicação aos trabalhadores da Caixa que não tenham exercido a faculdade a que se refere o n°2 do art°7°, e com as necessárias adaptações, os artigos 31° n°2, 32° e 34° n°2 do DL. n° 48 953, de 5/4/1969”.
Em 11/8/1993, o Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos, tomou a deliberação, publicada através da Ordem de Serviço nº 19/93 de 17/8/1993, de “1-os empregados da Caixa Geral de Depósitos ficam abrangidos pelo regime disciplinar aplicável à generalidade dos trabalhadores bancários;...”.
Aqui chegados apuramos, e muito resumidamente, que a Caixa Geral de Depósitos nasceu com a Lei de 10 de Abril de 1876, germinando do Depósito Público criado no século XVI, desempenhou sempre um serviço público, através das suas várias e sucessivas transformações (Lei de 26/4/1880, Lei de 15/7/1885, Lei de n°8/5/1896, Decreto de 23/6/1897, Decreto de 23/6/1897, Lei de 26/9/1909, Decreto de 9/12/1909, Decreto n° 4670, de 14/7/1918, Decreto n°8 162, de 29/5/1922).
Com o DL. n°48 953, de 5/4/1969 (Lei Orgânica da Caixa Geral de Depósitos) a Caixa Geral de Depósitos passou a ser uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa e financeira, com património próprio, competindo-lhe a exercício das funções de instituto de crédito do Estado. . . .(art°2°).
Esta lei orgânica foi completada pelo DL. n°693/70, de 31/12, em nada alterando a natureza jurídica da CGD definida em tal lei, continuando, por isso, a ser uma pessoa colectiva de direito público, aliás o que continuou a afirmar-se no Decreto n°694/70, de 31/12, diploma este que aprovou o Regulamento da Caixa Geral de Depósitos.
O DL. n°298/92, de 31/12, que transpôs para a ordem jurídica interna as directivas comunitárias, aprovou o Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, sujeitando ao seu regime as empresas públicas, designadamente a CGD (arts. 1° n°2, 2° e 3°).
Para adaptação final deste Regime Geral à CGD foi publicado o DL. n°287/93, de 20/8, que a transformou em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos (art°1° n°1), natureza esta que foi novamente repetida no art°1° dos Estatutos da Caixa Geral de Depósitos.
A Caixa que nasceu como uma instituição prestando um serviço público, transformou-se, posteriomente, em pessoa colectiva de direito público e existe hoje como sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos.
Estas sucessivas transformações da natureza jurídica iam-se projectando na natureza do vínculo que ligava a CGD aos seus trabalhadores.
Como se reconheceu no preâmbulo do DL. n°48 953, de 5/4/1969, o regime e situação do pessoal da Caixa que vem desde a sua criação, é o de aplicar integralmente a esse pessoal o regime jurídico do funcionalismo público.
No art°31° n°2 deste diploma refere-se expressamente que “o pessoal da Caixa continua sujeito ao regime do funcionalismo público”. E continua também sujeito ao regulamento disciplinar que naquele momento lhe era aplicável (art°36°).
Estas ideias expressas nos arts. 31° e 36° foram, logo de seguida, repetidas no DL. n°693/70 e nos arts. 1°, 3°, 4°, 108° e 116° do Regulamento da Caixa Geral de Depósitos (DL. n°694/70).
Porém, pelo RGICSF (DL. n°298/92, de 3 1/12) a CGD foi equiparada aos bancos “no que respeita às actividades que está autorizada a exercer”, nada referindo quanto aos seus funcionários, como aliás nada o justificava que fizesse, dado o mesmo versar tão só sobre a regulamentação da actividade das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras.
Assim, quanto aos funcionários da CGD o seu regime jurídico não foi modificado, continuando, por isso, em vigor tudo o que anteriormente lhes era aplicável.
A natureza jurídica da CGD foi alterada pelo DL. n°287/93, de 20/8, que a transformou de pessoa colectiva de direito público em “Sociedade Anónima de Capitais exclusivamente Públicos” (art°1° n°1) e estatuindo no n°2 deste mesmo artigo que “a Caixa se rege pelo presente diploma, pelos seus estatutos, pelas normas gerais e especiais aplicáveis às instituições de crédito e pela legislação aplicável às sociedades anónimas “.
Quanto aos funcionários da CGD, e para o que agora nos interessa, diz o art°7° deste mesmo DL. n°287/93: “1-Sem prejuízo do disposto nos números seguintes, os trabalhadores da Caixa ficam sujeitos ao Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho. 2-Os trabalhadores que se encontrem ao serviço da Caixa na data da entrada em vigor do presente diploma continuam sujeitos ao regime que lhes era até aí aplicável, podendo contudo optar pelo regime previsto no número anterior, mediante declaração escrita feita nos termos e no prazo a fixar pela administração da Caixa.3-Os trabalhadores da Caixa que sejam chamados a ocupar cargos nos órgãos desta empresa ou que sejam requisitados para exercer funções em empresas ou serviços públicos não podem, por esse facto, sofrer qualquer prejuízo, regressando aos seus lugares logo que terminem o mandato ou a requisição. 4-...”.
Face ao disposto no art°7° acabado de referir, podemos dizer que os funcionários da CGD que iniciaram funções a partir da entrada em vigor do DL. n°287/93 (o que aconteceu no dia l/9/1993-art°10°) ficaram sujeitos ao Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho. Quanto aos funcionários de tal Caixa que já o eram aquando da entrada em vigor do DL. n°287/93 têm duas hipóteses: ou optam pelo Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho ou, nada fazendo, continuam sujeitos ao regime que lhes era até aí aplicável — o regime da função pública.
Aqui chegados, resta-nos averiguar, por fim, qual o regime disciplinar aplicável aos funcionários da Caixa Geral de Depósitos.
Até à entrada em vigor do DL. n°48 953, de 5/4/1969 o pessoal da Caixa estava sujeito disciplinarmente ao Regulamento Disciplinar aprovado pelo Decreto de 22/2/1913 (vide neste sentido, o Acórdão do TP de 27/11/1986-rec. n°16 343, in AD.306°, pág. 847 e ss.).
Após a entrada em vigor deste diploma legal e de acordo com o seu art°36° “o pessoal da CGD continua sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável, incumbindo ao conselho de administração exercer, em relação ao mesmo pessoal, a competência atribuída aos Ministros por aquele regulamento”.
Isto mesmo resultava também do art°116° do Regulamento da CGD (aprovado Decreto n°694/70, de 31/12).
Assim, de acordo com este preceito continuam os trabalhadores da Caixa sujeito ao Regulamento Disciplinar de 1913.
A este art°36°, pelo DL. n°461/77 de 7/11, foi dada a seguinte redacção: “1 —As normas disciplinares aplicáveis ao pessoal da Caixa constarão também de regulamento interno aprovado pelo conselho de administração, tendo-se em conta as condições especiais da prestação de trabalho na instituição e o regime aplicável à generalidade do sector bancário público. 2 — Enquanto não for estabelecido o regulamento referido no número anterior, o pessoal permanecerá sujeito ao regulamento disciplinar que actualmente lhe é aplicável, continuando a incumbir ao conselho de administração exercer, em relação ao mesmo pessoal, a competência atribuída aos Ministros pelo referido regulamento “.
O conteúdo desta nova redacção do art°36° levou a que ao art 116° do Regulamento da CGD fosse dada redacção de conteúdo idêntico, pelo art° 2° do mesmo DL. n°461/77.
O recorrente foi admitido em 1980 como funcionário da CGD e não optou pelo regime jurídico do contrato individual do trabalho, pelo que de acordo com o art°7° deste mesmo DL. n°287/93 continuou sujeito ao regime que lhe era até aí aplicável, ou seja, o regime aplicável ao funcionalismo público.
Mas o regime disciplinar aplicável a todos os funcionários da Caixa, enquanto não fosse publicado o novo regulamento, era o da função pública — o Decreto de 22/2/1913 — (art°279° do Regulamento da Caixa Geral de Depósitos, aprovado pelo DL. n°8162, de 29/5/1929, regime que foi mantido pelo disposto no art° 36° nºs 1 e 2 do DL. n°48 953). Também o n°2 do art°19° do Regulamento da Caixa Geral de Depósitos determinava que “as infracções, penalidades, efeitos e suspensão de penas, o processo disciplinar e sua revisão, são regidas pelo Regulamento Disciplinar dos Funcionários Civis, de 22/2/1913, com os ajustamentos introduzidos pelos diplomas orgânicos e regulamentares da Caixa”.
Aliás, a própria CGD não pôs em causa a aplicação deste regulamento, pois que a mesma, na ocasião da Revisão do Contrato Colectivo do Sector Bancário, em declaração de voto, reafirmou as ressalvas feitas na sua declaração aquando da assinatura do CCT, então revisto, ressalvas estas relativamente “a matéria de processo disciplinar, invocando o art°36° n°1 do DL. n°48 953 (cfr. Boletim do Trabalho e Emprego, 1 série, n°26, de 15/7/1980 e n°18, de 15/5/1978).
O Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos aprovou, em 11/8/1993, este Novo Regulamento Disciplinar, para entrar em vigor em 31/8/1993, sujeitando todos os trabalhadores da Caixa a este regime disciplinar.
Apurar o âmbito de aplicação deste regime disciplinar aprovado pelo despacho n°104/93 do Conselho de Administração da CGD é o que incumbe fazer a este tribunal no presente momento.
Não está em causa o poder do Conselho de Administração de poder regulamentar a matéria disciplinar, pois existe uma lei habilitante — o art°36° n°1 do DL. n°48 953, de 5/4/1969 (na redacção dada pelo DL. n°461/77), mas sim, saber se o poder conferido pela lei habilitante seria extensível a todos os trabalhadores da Caixa ou somente àqueles a que se lhes fosse aplicável o Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, quer porque por ele tivessem optado quer porque tivessem sido contratados já após a entrada em vigor do DL. n°287/93 (o que aconteceu no dia 1/9/1993-art°10°).
O n°1 do art°36° do DL. n°48 953 prevê que o Conselho de Administração da CGD aprove o regulamento interno onde constem as normas disciplinares aplicáveis ao pessoal da Caixa, só que o n°2 do art°31 do mesmo diploma legal impõe, desde logo limites ao exercício de tal poder, pois que “o referido pessoal continua sujeito ao regime jurídico do funcionalismo público, com as modificações exigidas pela natureza específica da actividade da Caixa como instituição de crédito...”.
Ora, o regime jurídico do funcionalismo público, o que poderemos apelidar de “Estatuto da Função Pública” é composto por várias normas disperas por diversos diplomas legais, alguns de aplicação comum e outros de aplicação meramente sectorial (ex. Leis Orgânicas), estando a disciplina dos funcionários, que é apenas um capítulo daquele estatuto, regulada no actual Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local (cfr. Marcelo Caetano, Manual de Direito Administrativo, 10ª ed., 2° vol. Págs. 686/687).
Aliás, nas Bases do Direito da Função Pública deve estar o Estatuto da Função Pública, contendo este as medidas disciplinares aplicáveis ao funcionalismo público (cfr. Gustave Peiser, in Droit Administratif, 8 ª ed., pág. 9 e segs.).
Podemos, pois, concluir que ao permitir-se aos funcionários da Caixa Geral de Depósitos a sua sujeição ao regime jurídico funcionalismo público de acordo com o art°7° deste mesmo DL. n°287/93, este regime englobava a disciplina.
Na verdade, não se compreenderia muito bem como é que o Despacho n°104/93 de 11/8/1993 se quer aplicável a todos os trabalhadores da Caixa, quando em 20/8/1993 é publicada um diploma legal (DL. n°287/93), de hierarquia superior àquele regulamento, a permitir que os trabalhadores que se encontrassem ao serviço da Caixa na data da sua entrada em vigor (1/9/1993) e que não optassem, pudessem continuar sujeitos ao mesmo regime jurídico — o do funcionalismo público — que até ali os regia.
Mas a sujeição de tais trabalhadores da Caixa, como o recorrido A… e outros que não optaram pelo Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, ao regime do funcionalismo público resulta claramente do disposto no art°9° n°3 do DL. n°287/93, ao estatuir que “manterem-se em vigor, mas unicamente para aplicação aos trabalhadores da Caixa que não tenham exercido a faculdade de opção pelo Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, o disposto no art°31° n°2 do DL. n° 48953...,,, estatuindo-se neste preceito que “o pessoal da Caixa continua sujeito ao regime jurídico do funcionalismo público”.
E não se argumente contra esta posição que foram as mudanças impostas pelo Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras (DL. n°298/92, de 31/12) e pelo DL. n°287/93, de 20/8 que transformou a CGD em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos e aprovou os Estatutos da mesma Caixa que impõem a aplicação do Regulamento Disciplinar aprovado pelo Despacho n°104/93, de 11/8 à universalidade dos trabalhadores da Caixa. Tais diplomas legais vieram, o primeiro, produzir alterações quanto à liberdade de estabelecimento das empresas financeiras, a liberdade de prestação de serviços pelas mesmas empresas, a harmonização e o reconhecimento mútuo das regulamentações nacionais, a liberdade de circulação de capitais, a união económica e monetária, o segundo, a sujeição da Caixa às regras das empresas privadas do sector, que impuseram uma alteração ao regime disciplinar dos trabalhadores, pois que não há qualquer obstáculo a esta nova adaptação da Caixa às novas circunstâncias e a aplicação do regime disciplinar da função pública aos trabalhadores da CGD sujeitos ao regime do funcionalismo público.
Além disso, a solução propugnada por este aresto é aquela que melhor respeita a situação dos trabalhadores, baseada nas certeza e segurança jurídicas, de não verem alterada a sua situação juridico-laboral.
Finalmente, a vigência simultânea destes dois regulamentos disciplinares será meramente transitória, pois que o instituído pelo Decreto de 22/2/1913 deixará de se aplicar quando deixarem de existir trabalhadores com o estatuto de funcionário público que não tenham optado pelo Regime do Contrato Individual de Trabalho, o que inexoravelmente vai acontecer.
Conclui-se, pois, que o Regulamento Disciplinar aprovado pelo Despacho n°104/93 viola o disposto no art°31° n°2 do DL. n°48 953, de 5/4/1969, ao mandar aplicar o seu regime aos trabalhadores da Caixa que continuaram sujeitos ao regime jurídico do funcionalismo público, por que a estes aplica-se-lhes o Regulamento Disciplinar do Decreto de 22/2/1913, sendo os tribunais administrativos os competentes para conhecer da legalidade do acto que lhes aplicar uma pena disciplinar.
Em concordância com tudo o exposto, improcedendo as conclusões das alegações do recorrente, e sendo os tribunais administrativos os competentes para conhecer do objecto do recurso contencioso interposto pelo ora recorrido, nega-se provimento ao presente recurso jurisdicional, confirmando-se o acórdão recorrido.
Sem custas.
Lisboa, 24 de Maio de 2005. – Pires Esteves (relator) – António Samagaio – Azevedo Moreira — Santos Botelho — Rosendo José — Pais Borges — Adérito dos Santos — Maria Angelina Domingues — Costa Reis.



Resumo do acórdão, alteração da natureza jurídica , bem como aspectos do âmbito de jurisdição

     Antes da transformação da CGD em sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos, levada a cabo pelo DL nº 287/93 de 20-8, esta instituição era um instituto de crédito do Estado, mais propriamente uma pessoa colectiva de direito público dotada de autonomia administrativa e financeira e com património próprio, nos termos dos  artigos 2º e 3º da Lei Orgânica, aprovada pelo DL nº 48953, de 5/4/69.
      Nos termos deste diploma, o pessoal da CGD estava sujeito ao regime do funcionalismo público, com as modificações exigidas pela natureza específica da actividade da Caixa como instituição de crédito face ao disposto no artº  31º nº2.
      Como organismo público tinha competência para elaborar normas regulamentares, tanto no domínio das condições de trabalho, como em matéria disciplinar, devendo as normas disciplinares constar de regulamento interno aprovado pelo Conselho de Administração, atendendo às  condições especiais de prestação de trabalho na Instituição e ao regime aplicável à generalidade do sector bancário conforme dispõe os artigos 32º e 36º, respectivamente, do DL nº 48953, na redacção dada pelo DL nº 461/77 de 7-11.
      O regulamento disciplinar até aí aplicável a todos os funcionários da Caixa, aprovado pelo Decreto de 22/2/1913, que constituía o antigo Estatuto disciplinar do Funcionalismo Público há muito revogado pelo DL nº 24/84, mas que por força dum regulamento interno da Caixa, se mantinha em vigor para os funcionários daquela Instituição.
      No entanto, o supra citado artº 36º do DL nº 48 953, foi revogado pelo artº 9º nº1 do DL nº 287/93 de 20-8, que entrou em vigor em 1/9/93, deixando  a CGD de deter poder regulamentar no que à matéria disciplinar respeita, o que bem se compreende se atentarmos que tal poder é apanágio dos órgãos administrativos no desempenho da função administrativa, tendo a CGD deixado de o ser, precisamente por via do DL nº 287/93.
      Deste modo, todos os regulamentos em matéria disciplinar elaborados pela CGD e, nomeadamente, o aprovado pelo despacho de 17-8-93, caducaram.
      Assim, o estatuído no nº2 do artº 7º do DL nº 287/93, no sentido de que os trabalhadores que se encontravam ao serviço da Caixa na data da entrada em vigor deste diploma, continuavam sujeitos ao regime que lhes era, até aí, aplicável, ou seja, o regime do funcionalismo público, não significa que ao mesmo se aplicasse o regime do despacho nº 104/93 de 11-8-93, em matéria disciplinar, já que o mesmo não chegou a entrar em vigor em 31/8/93, uma vez que caducou em 1/9/93, data da entrada em vigor do DL nº 287/93.
      Significa que o despacho nº 104/93 nunca poderia abranger os funcionários da CGD que à data do início da vigência do DL nº 287/93 detinham o estatuto de funcionários públicos por força do artº 31 do DL nº 48953 e que, após essa vigência, não optaram pelo regime do contrato individual de trabalho, nos termos do seu art. 7º.
     E nem se alegue que tal regime de direito público teria de ser temperado com as modificações exigidas pela natureza da Caixa como instituição de crédito, uma vez que a matéria disciplinar além da matéria respeitante à Segurança Social, são os aspectos específicos em que tal regime continuou a ser aplicável, como a própria Caixa reconhece  no capítulo III das alegações de recurso jurisdicional.
Assim, ao considerar que todos os empregados da CGD ficavam abrangidos pelo regime disciplinar aplicável à generalidade dos trabalhadores bancários, ou seja, o constante do ACTV do sector Bancário e DL nº64-A/89 de 27-2, o citado despacho unificou o regime disciplinar desses funcionários anulando a sua opção (por omissão), legalmente permitida de se manterem em regime de direito público, precisamente num dos aspectos específicos em que tal aplicação se impõe, tratando de maneira igual o que é desigual.


Marco António C. André - Aluno 9327


Maria da Conceição V. Santos  - nº 2099

Sem comentários:

Enviar um comentário