COMENTÁRIO
A SENTENÇAS DO TAF DE BRAGA – FACTURAS FALSAS
Ø Sentença
do TAF de Braga de 2009-04-30 – Processo n.º 171/08 BEBRG – relativa a IRC
Ø Sentença
do TAF de Braga de 2009-05-11 – Processo n.º 294/08 BEBRG – relativa a IVA
Proponho-me a dar
a conhecer duas sentenças do Tribunal Administrativo e Fiscal de
Braga que recaíram sobre o mesmo relatório inspectivo, embora uma delas se
debruce sobre as correcções aritméticas em sede de Imposto sobre o Rendimento
das Pessoas Colectivas (IRC) que resultaram daquele relatório e a outra sobre
as correcções aritméticas em sede de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA).
As correcções
aqui em causa, para além de outras que foram efectuadas, tiveram como base
indícios de facturas simuladas, que não correspondiam a verdadeiras prestações
de serviços.
As duas
Impugnações foram distribuídas a dois juízes diferentes e tiveram decisões
diferentes: a decisão relativamente às liquidações de IVA foi
desfavorável à Fazenda Pública; a decisão na Impugnação relativa às
liquidações de IRC foi favorável à Fazenda Pública.
Poderá,
eventualmente, questionar-se a justeza e a coerência, ou a falta delas, no
resultado obtido após estas duas decisões.
Em síntese, a
Administração Fiscal, no âmbito de acção de inspecção procedeu a correcções
aritméticas, as quais deram origem a liquidações adicionais de IRC e IVA.
- Para efeitos de IRC, a Administração Tributária (AT),
considerou que os custos relevados na contabilidade não satisfaziam o
estabelecido no nº 1 do art.º 23.º do Código do IRC, dado que «resultaram
de operação simulada pois, na realidade, não houve qualquer prestação de
serviços efectiva».
- Para efeitos de IVA, a AT, considerou que o IVA deduzido deveria ser corrigido, «nos termos dos nºs 2, 3, 4 e 6 do art.º 19.º do Código do IVA».
O sujeito passivo
interpôs duas Impugnações para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga –
uma relativamente às liquidações de IRC e outra relativa às liquidações de IVA.
A decisão foi desfavorável
à Fazenda Pública na Impugnação relativa às liquidações de IVA, mas favorável
relativamente às liquidações de IRC.
- No âmbito do IRC (Processo n.º 171/08 BEBRG)
«A questão a
decidir, é a de saber se as facturas emitidas pela tal firma fornecedora
correspondem a operações comerciais reais ou se são facturas não suportadas por
qualquer negócio económico real e efectivamente realizado entre a Impugnante e
aquele fornecedor e/ou seja, se essas transacções comerciais foram
efectivamente realizadas e não se trataram de negócios fictícios.
( … )
Determina o n.º 1
do art.º 23 do Código do IRC que para o apuramento do imposto devido,
consideram-se custos ou perdas os que comprovadamente forem indispensáveis para
a realização dos proveitos ou ganhos sujeitos a impostos ou para a manutenção
da fonte produtora.
Daí que seja
curial rejeitar como custos as quantias tituladas por facturas quando, após
averiguações sérias e credíveis, a AT concluiu haver sérios indícios de que
aquelas titulavam operações simuladas e consequentemente, que tais custos não
são reais. E considerando que o IRC visa a tributação do lucro real, não é
permitido a dedução de custos fictícios.
Perante os
indícios concretos e objectivos, à Impugnante competia provar que os custos
eram reais, por corresponderem a prestações de serviço, de mão-de-obra efectivamente
fornecidas que foram efectivamente pagas comprovando os custos contabilizados
nos termos do art.º 23.º do Código do IRC.
Assim, a
Impugnante não logrou, fazer prova de que as facturas emitidas em …
correspondiam a serviços prestados pela sociedade fornecedora, pelo que improcede o vício alegado
pela Impugnante.»
- No âmbito do IVA (Processo n.º 294/08 BEBRG)
«(…) A
primeira questão a decidir, é a de saber se são legais as correcções
aritméticas à matéria tributável efectuadas pela administração tributária e das
quais resultaram as liquidações aqui impugnadas.
(…)
Porque a
liquidação adicional de IVA tem por fundamento o não reconhecimento das
deduções declaradas pela Contribuinte, compete à AT fazer prova de que estão
verificados os pressupostos legais que legitimam a sua actuação, constantes do
art.º 82.º n.º 1 do CIVA, ou seja, tendo o juízo da AT assentado na
consideração de que as operações e o valor mencionado nas facturas em causa não
corresponde à realidade, haverá de demonstrar a existência de indícios sérios
de que as operações referidas nas facturas foram simuladas.
(…)
A este propósito,
convirá referir que a administração não se pode limitar a uma fundamentação
formal do juízo que formula quanto à dedução indevida por parte do sujeito passivo.
Exige-se-lhe, ademais, que demonstre o bem fundado desse juízo, provando os
indícios que o sustentam dessa forma possibilitando a conclusão de ser correcta
a sua fundamentação material.
(…)
No caso dos
autos, como resulta da matéria de facto provada, a AT considerou que as
facturas contabilizadas pela Impugnante, não correspondem a efectivas operações,
com base em certos factos indiciários.
A impugnante
alega que os factos recolhidos pela AT não constituem, na sua perspectiva,
indícios sérios e objectivos que, só por si, e com forte probabilidade suportem
a conclusão de que as operações tituladas pelas facturas são simuladas.
A doutrina,
unanimemente, aponta três elementos constitutivos da simulação:
- A
divergência entre a vontade real e a vontade declarada;
- O acordo
simulatório;
- A intenção
de enganar terceiros.
Os indícios
recolhidos relativamente à emitente das facturas respeitam apenas a aspectos
meramente formais e exclusivamente respeitantes ao referido emitente, dos quais
nada se pode extrair relativamente à existência de um acordo simulatório celebrado
entre o emitente das facturas e a impugnante.
(…)
Finalmente,
embora a AT invoque a norma do n.º 4 do art.º 19.º do CIVA para fundamentar as
correcções efectuadas, o certo é que o mesmo resulta inaplicável no caso
concreto.
Por duas razões:
- Em primeiro
lugar a administração tributária não alegou que o prestador de serviços não
entregou nos cofres do Estado o imposto liquidado;
- Em segundo
lugar, nenhum indício relevante foi apresentado no sentido de sustentar que a
Impugnante sabia ou devia saber que a emitente das facturas não dispunha de
adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade declarada (o
juízo conclusivo que a administração tributária formulou a este propósito é
insubsistente: da verificação, em alguns contratos celebrados entre a
Impugnante e a emitente das facturas, da exigência de apresentação de
documentos comprovativos da sua situação perante a segurança social não
decorre, como conclusão, que a firma … tinha conhecimento que a empresa
subcontratada não possuía adequada estrutura empresarial susceptível de exercer
a actividade em causa).
Concluindo: os
factos indiciários recolhidos pela administração tributária não permitem
concluir pela simulação das operações tituladas pelas facturas, nomeadamente
na perspectiva da existência de um acordo simulatório entre a Impugnante e o
emitente. Por isso, entendemos que é ilegal a desconsideração do
direito à dedução do IVA por parte da Impugnante o que necessariamente acarreta
a ilegalidade das liquidações impugnadas.»
ü
Comentário Final referente às duas
decisões diferente do TAF de Braga
Após o exposto, e
tendo em consideração as decisões diferentes do TAF de Braga que recaíram sobre
o mesmo relatório da Inspecção Tributária, importa referir que, talvez
encontremos, ou não, algum sentido nesta duplicidade de decisões se ponderarmos
que as exigências de prova decorrentes da lei de um e outro imposto são
diferentes. Enquanto no IRC basta haver sérios indícios de que
certas facturas titulam operações simuladas e consequentemente, que tais custos
não são reais e por isso não aceites, nos termos do art.º 23.º do Código do IRC
– dado que o IRC visa a tributação do lucro real, não é permitida a dedução de
custos fictícios, no IVA, se a Administração Tributária
invocar os nºs 3 e 4 do art.º 19.º do Código do IVA, como foi o caso, então
terá de juntar ao relatório factos concretos que provem o acordo simulatório
existente entre o emitente das facturas e o utilizador com a intenção de
enganar terceiros (neste caso, a Administração Tributária) e que a empresa
utilizadora das facturas sabia ou devia saber que a emitente das facturas não
dispunha de adequada estrutura empresarial susceptível de exercer a actividade
declarada.
Sem comentários:
Enviar um comentário