A APLICAÇÃO DE SANÇÕES PECUNIÁRIAS
COMPULSÓRIAS À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA
O princípio da plena jurisdição dos tribunais administrativos vem plasmado no artigo 3.º do CPTA.
Os tribunais
administrativos exerceram durante muito tempo uma jurisdição de poderes
limitados, poderes esses que fundamentalmente se circunscreviam ao de anular ou
declarar a nulidade de actos administrativos e de condenar ao pagamento de
indemnizações. É com essa tradição que o CPTA procurou romper com a reforma de
2002, reforçando os poderes dos tribunais administrativos nos dois planos em
que esses poderes se manifestam, o plano declarativo e o plano executivo.
Os tribunais
administrativos não estão vocacionados, nem constitucionalmente ou legalmente
habilitados, a fazer a chamada dupla
administração, isto é, a (re)formular juízos que apenas à Administração
cumpre realizar, no exercício dos poderes de valoração que são inerentes à
função administrativa.
Os tribunais
administrativos devem ter, por isso, o maior cuidado para não ficarem aquém,
mas também para não irem além, no exercício dos poderes que o CPTA lhes confere.
Têm, assim, que encontrar o justo equilíbrio entre as exigências de tutela
efectiva de quem pretende a condenação da Administração e as exigências que
impedem o juiz de ultrapassar os limites que são próprios da função
jurisdicional, no confronto com a função administrativa.
O reforço
dos poderes dos tribunais administrativos concretiza-se, em primeiro lugar, no
plano dos poderes de pronúncia que
aos tribunais administrativos são conferidos no plano declarativo. E aqui, na
dupla dimensão em que esses poderes podem ser exercidos: no âmbito dos
processos principais, em que são proferidas as decisões sobre o mérito das
causas, e no âmbito dos processos cautelares, em que são decretadas
providências destinadas a acautelar a utilidade das decisões a proferir nos
processos principais.
Um dos
poderes, que em termos genéricos, o CPTA passou a conferir, após a reforma de
2002, aos tribunais administrativos, no seu artigo 3.º, n.º 2, é o de fixar
oficiosamente, quando chamados a condenar a Administração, o prazo dentro do
qual os deveres impostos devem ser cumpridos e de aplicarem, quando tal se
justifique, sanções pecuniárias compulsórias, nos termos do artigo 169.º,
destinadas a assegurar o cumprimento desses deveres.
Este poder
reveste-se da maior importância. Na verdade, há muito que se vinha sustentando
que a via mais eficaz para tentar coagir a Administração a cumprir as suas
obrigações passava pela introdução do poder de o tribunal impor medidas de execução indirecta, do tipo
da sanção pecuniária compulsória que
o Código Civil prevê no seu artigo 829.º-A e que, constrangendo o obrigado,
visa forçá-lo a cumprir as obrigações de carácter infungível que sobre ele
impendam.
A aplicação,
à Administração, de sanções compulsórias, permite superar dificuldades, de
outro modo virtualmente inultrapassáveis, que se colocam em domínios de
infungibilidade da actuação administrativa, pelo que, estamos perante um passo
muito positivo do sistema português de garantias contra as inexecuções ilícitas
de sentenças dos tribunais administrativos.
O poder de
impor sanções pecuniárias compulsórias, genericamente previsto, como já
referido, no artigo 3.º, n.º 2 do CPTA, surge reafirmado, ainda em termos
gerais, nos artigos 44.º (e 49.º), e é depois especificamente mencionado nos
artigos 66.º, n.º 3 (no domínio da condenação à prática de acto administrativo
devido), 84.º, n.º 4 (no caso do processo administrativo não ser
tempestivamente enviado a tribunal), 108.º, n.º 2 e 110.º, n.º 5 (no caso de
incumprimento de intimações), 127.º, n.º 2 (no domínio das providências
cautelares) e 168.º, nº 1 (no âmbito do processo de execução das sentenças de
anulação de actos administrativos).
Esta é uma solução
original e de aplaudir já que, para tornar mais eficaz o Contencioso
Administrativo, passou-se a permitir mesmo a antecipação das referidas sanções para
o processo declarativo, indo-se mais longe do que similares previsões
normativas noutros países europeus. Trata-se, no entanto, de uma excepção
parcial à regra do artigo 3.º, n.º 1 do CPTA, pois neste caso o tribunal não
está a penas a conhecer da questão da legalidade, mas está igualmente a
debruçar-se (ainda que de forma limitada) sobre de uma questão de oportunidade, que é a determinação do momento do
cumprimento da sentença (ainda em fase declarativa).
Bibliografia:
AMARAL, Diogo Freitas do/ALMEIDA, Mário Aroso de
- Grandes Linhas da Reforma
do Contencioso Administrativo, Lisboa, 2002
SILVA, Vasco Pereira da
- O Contencioso
Administrativo no Divã da Psicanálise, Lisboa, 2009
José Carlos Matos
Aluno n.º 18807
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